«(…) Weistaler parou o seu Audi
mesmo atrás de uma carrinha preta e saiu agilmente do automóvel. Enquanto
passava ao lado do carro e abria a porta do passageiro, pareceu-lhe ver o que
estava a acontecer dentro da catedral, a poucos metros dele: um jovem
sacerdote, com um bocado de ferro do tamanho de uma moeda entre os dedos,
tentava abrir a vitrina que continha o Santo Sudário. Se tudo corresse segundo
os planos, a maleta já devia estar nas mãos de Henkel. Ao volante da carrinha
estava um gigante de origem grega que disse chamar-se Flavio Osios. Ninguém,
vendo os dois lado a lado, poderia imaginar que o Grego, apenas quatro meses
depois, o iria assassinar com um disparo de pistola na têmpora. Weistaler
sacudiu a neve da gabardina azul e fechou a porta. Está tudo bem? Osios sorriu,
mas o seu sorriso não era nada tranquilo. Não voltou a sair de casa, murmurou. Melhor
assim, não? Vamos então, respondeu Weistaler.
O Grego não se considerava um homem
mau, nem mesmo um terrorista. Gostava de se imaginar como um profissional
freelancer que é contratado por quem precisa dos seus serviços. Pouco importava
quem é o mandante do trabalho e quais os seus fins. Trabalhava pelo dinheiro. Aquilo
que lhe tinha faltado durante toda a sua infância. E não o dinheiro para
comprar, como os seus coetâneos, roupa ou sapatos da moda, mas sim para pôr o pão
na boca. Era filho de um ex-marinheiro grego e de uma doméstica italiana. Dois esfomeados
que passaram a vida colados ao sofá daquele casebre ao qual chamavam casa. Recordava-os
como dois parasitas e tinha-os abandonado assim que teve oportunidade. Não os via
desde os dezassete anos nem nunca mais soube deles. Quem sabe se ainda estavam
vivos.
Tudo o que era devia-o apenas a si
mesmo: ainda adolescente, no final dos anos setenta, tinha-se autofinanciado
com pequenos furtos na sua Trieste natal e, a seguir, depois de um ano na prisão
para menores, tinha passado à caça grossa, diversificando os seus negócios;
atrás das grades, apercebeu-se de que tinha uma grande sorte, ou seja, de viver
numa zona que conhecia na perfeição, muito próxima da fronteira com a Jugoslávia.
Certamente que também ajudaram os
denominados anos de chumbo e as excelentes pistolas de fabrico jugoslavo. A sua
contribuição pessoal, porém, já vinha de longe: tinha estado em todos os teatros
de guerra do Médio Oriente nos anos oitenta. Vendia pistolas e espingardas
adquiridas pelos seus vizinhos comunistas e, quando podia, também era mercenário.
Com o tempo tinha finalmente ganho, no seu meio, a fama de homem de confiança e
de boa liderança. Osios e Weistaler atravessaram a Piazza de San Giovani a pé e
velozmente. Pararam em frente à porta do edifício fronteiro à catedral, mesmo ao
lado das montras tapadas da Real Farmácia XX Setembro. Era a mesma porta onde trabalhava
o jovem de cabelo ruivo que tinha fornecido os códigos numéricos a Weistaler. Sem
se preocuparem em não fazer barulho, subiram a escadaria interior e, chegados ao
segundo andar, tocaram à campainha.
O presidente da Comissão para a
Conservação do Santo Sudário tinha ouvido um grande alarido pelas escadas e
agora estava imóvel à entrada do seu apartamento. Era um homem baixo, careca e de
meia-idade. A campainha tocou, e tocou novamente. Foram necessários diversos toques
antes de se decidir. Aproximou-se do visor e tentou observar os dois desconhecidos.
Não os conseguia ver bem pois o vão da escada estava escuro. Podia ser alguém
que precisava dele? Por precaução, colocou a corrente na porta e abriu uma pequena
fresta para poder ver melhor. Nem sequer teve tempo para abrir a boca, pois um empurrão
fê-lo cambalear para trás. A pequena corrente foi arrancada da parede, e a porta
ficou escancarada». In GL Barone, Conspiração no Vaticano, 2013, Casa das Letras, 2013,
ISBN 978-972-462-197-5.