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As profecias e os cartapácios dos
sebastianistas
As profecias não canónicas
«(…) Das inúmeras
profecias não canónicas ocorrentes nos cartapácios dos sebastianistas podemos
dar aqui apenas uma pequena selecção. Em primeiro lugar, são frequentemente
citados os oráculos sibilinos, geralmente em forma de coplas castelhanas. Esses
oráculos não têm nada a ver com os vaticínios gregos que o Baixo Império nos
transmitiu e parece que são de origem ibérica. Devem ter sido forjados no fim
da Idade Média, mas os pormenores da sua origem são-me desconhecidos. Existe
também um oráculo sibilino, redigido em linguagem solta e citado em Latim ou em
Português. Segundo ele, Cassandra, a filha de Príamo, rei de Tróia, teria
predito, juntamente com Santo Isidoro (bien étonnés de se trouver ensemble!), o seguinte:
Um rei novo, nos últimos tempos, na Espanha Maior, duas vezes dado por
piedade do Céu, nascendo póstumo, reinará por uma mulher, cujo nome começará em
I e acabará em L. E o dito rei virá das partes orientais. Reinará na sua
mocidade, e alimpará a Espanha dos vícios imundos, e o que não queimar o fogo,
devastará a espada. Reinará sobre a Casa de Agar [= Sarracenos], conquistará
Jerusalém, fixará a imagem do Crucificado sobre o Santo Sepulcro, e será o maior
de todos os monarcas.
Esta profecia, citada em diversas formas de acordo com as preferências
dos tratadistas, contém elementos que parecem talhados para a pessoa de Sebastião:
duas vezes dado, nascendo póstumo, reinando na sua mocidade, vindo das partes
orientais e destruidor dos Sarracenos. Mas António Vieira, que não reconhecia a
autenticidade das palavras nascendo póstumo, aplicou-a, em 1659, a João IV e,
mais tarde, a um filho de Pedro II. A Santo Isidoro, o famoso arcebispo de
Sevilha e grande organizador da Igreja visigótica, se atribuíam muitas profecias,
que, no fim do século XV, foram postas em verso pelo cartuxo castelhano Pedro
de Frias, uma fonte avidamente explorada pelos sebastianistas. Além de ter
profetizado que o Encoberto seria duas vezes dado, o arcebispo teria predito
também que ele traria em seu nome letra
de hierro. Segundo os sebastianistas, a letra de ferro era o S,
inicial do vocábulo latino servus,
que os Romanos costumavam imprimir com um cunho de ferro nos rostos dos escravos.
Obviamente, o profeta tinha em mente o nome de Sebastião. Santo Isidoro não foi
o único eclesiástico a fornecer profecias à causa sebástica. Do apóstolo São
Tomé se acharam em Meliapor profecias que resumiam, em estilo bíblico, a
derrota do rei Sebastião, o domínio filipino e o triunfo final da nação
lusitana. De São Metódio, bispo de Olimpo, que morreu mártir sob Diocleciano,
citava-se um texto profético, segundo o qual um Rei, tido por morto e inútil,
havia de despertar como de sono de vinho. A frase não é de São Metódio, mas
ocorre num tratado apocalíptico, redigido por um monge sírio no fim do século
VII. São Bernardo, que o patriotismo português promovera a parente de Afonso Henriques,
teria escrito a este que ao seu Reino nunca faltariam reis naturais, salvo se
pela gravidade de culpas Deus o castigasse por algum tempo. São Francisco de Assis,
numa visita (completamente fantasiada) a Portugal, teria prometido a dona
Urraca, esposa de Afonso II, que o Reino de Portugal nunca seria unido ao Reino
de Castela». In José Van den Besselaar, O Sebastianismo História Sumária, Instituto
Camões, Instituto de Cultura e Língua Portuguesa, Biblioteca Breve /Volume 110, Livraria Bertrand, 1987.
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