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de wikipedia e jdact
«O
jornal 57 surge num ano, 1957, que, no que à imprensa periódica diz respeito,
foi um ano historicamente importante. Hoje é até reconhecido pelos especialistas
como um ano de viragem, em grande medida protagonizada pelo Diário Ilustrado, que aparece em
finais de 1956. Se isto é verdade para a chamada imprensa de referência, para
os principais jornais diários portugueses, também o é para a imprensa
literária. Esta conhece nesta altura uma evolução não menos importante, quer
pela consolidação de muitas revistas e jornais, quer pela dinâmica provocada
pelo aparecimento de novas publicações periódicas, ao ponto de se detectar uma
efervescência cultural de certo modo atípica, num país sujeito a um regime
autoritário, autocrático, que fazia da censura à liberdade de expressão uma das
suas traves-mestras. Estas revistas, por sua vez, representavam movimentos
políticos, literários, estéticos ou mesmo filosóficos, sendo, portanto, da
maior importância conhecê-las para uma melhor contextualização da época que
aqui nos interessa, e que enquadra o nosso jornal, o 57.
A Vértice era o órgão por
excelência do Neo-Realismo. Representava a militância, a literatura de
compromisso, da arte empenhada. Protagonizou importantes tomadas de posição no
plano cívico e político, congregando, desde o início (Maio de 1942), uma parte
considerável da oposição democrática ao regime, atitude que manteve até 1974.
Mas além da Vértice tínhamos
a Serpente, de 1951, e
as Notícias do Bloqueio,
também criada em 1957, e que durou até 1961, ainda que estas duas publicações
já representassem a segunda vaga neo-realista. O Globo (1943-1959), o conjunto de cinco números Unicórnio, Bicórnio, Tricórnio,
Tetracórnio e Pentacórnio (1951-1956),
de José Augusto França, a Anteu
(1954) e a Pirâmide
(1959) veiculavam as propostas estético-literárias do Surrealismo,
movimento que tenta verter para a cultura portuguesa o compromisso com a
fealdade, como arma contra a cultura burguesa e as suas formas de censura
estética, moral, etc. A Panorama
(1941-1973), a Atlântico
(1942-1959), ambas editadas pelo Secretariado de Propaganda Nacional (SPN),
a Cidade Nova (1941-1961),
o Esmeraldo (1954-1956),
a Ocidente (1935-1971;
1977-1995) e a Cidadela
(1956-1957) defendiam o regime ou um sistema de valores condizente com os
do regime: patrióticos, nacionalistas, conservadores e católicos. Algumas
destas revistas, como vimos, são mesmo editadas por instituições do Estado
Novo. A Ocidente, com a
direcção de Manuel Múrias, foi uma apoiante incondicional do salazarismo (não agradável), defensora de
um nacionalismo activo, exacerbado, fortemente empenhado, a par da apologia
(supremacia) da cultura ocidental sobre todas as outras. A Tempo Presente, revista portuguesa de
cultura, que saiu de 1959 a 1961, representava o fascismo puro e
duro (maldito), situando-se
assim à direita do próprio regime. Segundo Eduardo Lourenço, era o texto
fascista em ambiguidade, traduzindo um fascismo nostálgico, duvidoso do
regime de Salazar, crítico da decadência das suas instituições e da decrepitude
ideológica e política dos dirigentes do Estado Novo. Nas suas páginas,
assumiam-se como (…) universalistas, hierarquizadores, totalitariamente
compreendentes, intolerantes para o erro, ultrapassantes e dinâmicos. À
esquerda do regime tínhamos, além da Vértice,
já aqui referida, a Seara Nova,
que surge em 1921, ligada à esquerda progressista, republicana, liberal, a Rumo, dos católicos, e a revista O Tempo e o Modo, publicada entre
1961 e 1977, adepta de uma democracia cristã e de um socialismo humanista, isto
até à saída de António Alçada Baptista, em Fevereiro de 1969. A partir daqui a
revista sofre uma profunda reorientação, no sentido maoísta, e que se traduz
também numa oposição mais tenaz ao regime. Depois, existia ainda um conjunto de
revistas que testemunhavam o incremento que os estudos filosóficos conheciam
nesta altura, tanto dentro como fora da universidade. São disso exemplo, a Revista Portuguesa de Filosofia,
da Faculdade de Filosofia de Braga, talvez a mais importante, a Revista Filosófica (1951-1958),
fundada e dirigida por Joaquim Carvalho, a Revista da Faculdade de Letras, de Lisboa, a Colectânea de Estudos, Itinerarium a partir de
1955, dos Franciscanos, e a revista Filosofia
(1954-1961), órgão do Centro de Estudos Escolásticos de Lisboa. O interesse
pelos temas filosóficos em geral, e especificamente portugueses, este ambiente
verdadeiramente filosófico, talvez explique o aparecimento do último jornal
deste breve inventário, o 57, órgão do Movimento 57, por sua vez inserido
no movimento mais amplo da Filosofia Portuguesa. É sobre este jornal que agora
nos vamos deter, ou melhor, sobre a sua história e memória». In Álvaro
Costa Matos, O Jornal 57. História e Memória, 2008, Coordenador da Hemeroteca
Municipal de Lisboa e Investigador do Centro de Investigação Média e Jornalismo,
Wikipedia.
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