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A
Mulher que Amou Jesus
«(…) Saíram do prédio escuro e
ficaram em frente a um grande casebre, coberto e com pisos de mosaico. Era ali
que os barcos de pesca descarregavam o peixe, o que tornava o chão
escorregadio. Os peixes, prateados, listrados, coloridos, eram separados em
pilhas. À altura do nível da água, havia uma vasilha de pedra onde peixes ainda
vivos ficavam por algum tempo. Foram caminhando pelo passeio de pedra que
beirava o lago, na direcção norte, para longe de olhares curiosos. Era um
caminho largo, muito usado, fazendo uma curva que acompanhava o lago oval. Você
não é de uma família do lago, nem de pescadores, disse Maria, finalmente, como
se fosse uma pergunta. Não, disse ele, olhando em frente enquanto falava. Minha
família mora na Galileia há muitas gerações. Há, inclusive, quem diga que
ficamos nessas terras durante todas as guerras. Os assírios alegam ter evacuado
toda a população da região. Mas, obviamente, não o fizeram; se o tivessem feito,
haveria tantos israelitas quanto assírios na terra deles. Não creio que quisessem
repetir a experiência do faraó e ter sua população superada pela nossa! Sua voz
era agradável, pensou Maria, e reflectia sobre suas palavras. O seu rosto era
simpático e agradável para se olhar. Talvez..., talvez..., eu até venha a amar
esta pessoa. Talvez ele seja como eu. Também há uma lenda sobre isso na minha
família, disse Maria. Que pertencemos, ou pertencíamos, pois supõe-se que já
tenham desaparecido, à tribo de Naftali, desta região. Logo ali, na curva, é
onde fica a antiga cidade deles. De qualquer maneira, é uma história interessante.
Naftali é uma gazela solta, disse Joel. Não foi isso que disse Jacob na sua oração
quando morria?
Maria riu. É, e ninguém
compreendeu o que ele quis dizer! Jacob também disse que trazia palavras
bondosas. Joel diminuiu a passada. Espero pelas suas palavras, Maria. E espero
que sejam bondosas para nós dois. Deixe o seu coração falar. Era tão directo!
Será que não podiam caminhar um pouco mais, conversar um pouco mais? E como se
podia ter essa conversa de uma maneira natural? Ajustou o lenço de sua cabeça,
para ganhar tempo. Eu... Eu disse a meu pai que..., que aceitaria a sua oferta
de se juntar à nossa família. Não foi exactamente isso que ofereci, disse ele. Você
não pode dizer as palavras concretamente?
Não, não podia. As palavras não
saíam de sua garganta. Palavras como casar, esposa e casamento estavam para além
da sua força. Balançou a cabeça. Então, se você não consegue pronunciá-las, você
não deve assumi-las. Parecia frustrado, mas resignado. Você também não
pronunciou as palavras. Como ela, também ele as evitara. Pareceu desconcertado.
Mas para seu pai, eu... Mas, para mim, tudo que você disse foi espero por suas
palavras. Palavras sobre o quê? Ele sorriu. Você tem razão. Mas você não vai
escapar, pois não tenho medo de dizer: quero que seja minha mulher. Quero ser
seu marido e quero que sejamos uma família. Pronto. Falei. Um bando de crianças
barulhentas surgira na curva do lago, correndo atrás uns dos outros e gritando.
Por quê?, foi tudo que Maria conseguiu dizer. Porque, desde criança, sabia que
não queria ser agricultor, como meu pai. Queria procurar o meu ofício, ter
minha casa e minha família. Quando vi você, tive a certeza de que era a pessoa
com quem queria partilhar a minha vida. Mas porquê? Ele praticamente nunca
falara com ela. Como podia ter a certeza?» In Margaret George, A Paixão de
Maria Madalena, 2002, Saída de Emergência, Edições Fio de Navalha, 2005, ISBN
972-883-911-1.
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