domingo, 15 de setembro de 2019

Os Arquivos Secretos do Vaticano. Sérgio P. Couto. «No século XVII os arquivos foram retirados da biblioteca do Vaticano, até então seu local sede, e permaneceram fechados para pessoas não autorizadas até ao fim do século XIX, quando passaram a ser abertos parcialmente pelo papa Leão XIII»

Cortesia de wikipedia e jdact

«(…)
Indexação das informações
Entre 1781 e 1782, a história dos Arquivos foi dominada por Giuseppe Garampi, o principal criador, entre outras coisas, do famoso sistema de índice que leva o seu nome. Ele manteve muitas aquisições, depósitos e conseguiu muitas transferências de material, inclusive cerca de 1.300 livros da câmara. Em 1783, tudo o que ainda restava em Avignon foi levado para o Vaticano, incluindo uma série de registos chamados de Regista Avenionensia. Em 1798, os registos que estavam no Castelo Sant’Ângelo também foram transferidos para lá, e Garampi já havia assumido como arquivista do Vaticano e do castelo. Assim, o acervo foi acrescido de 81 documentos com selos de ouro, entre os quais constava um diploma de Friedrich Barbarossa ou Frederico I, sacro imperador romano-germânico (1122-1190), que datava de 1164. Em 1810, por ordem de Napoleão Bonaparte, quando da sua invasão à Itália, os arquivos foram levados para Paris e apenas voltaram para o seu local original entre 1815 e 1817, o que causou a perda de vários documentos. Quando as tropas italianas conquistaram Roma, em 1870, os arquivos encontrados fora dos muros vaticanos foram confiscados pelo então recém-nascido estado italiano, que assim formou o núcleo dos arquivos de estados de Roma.
No século XVII os arquivos foram retirados da biblioteca do Vaticano, até então seu local sede, e permaneceram fechados para pessoas não autorizadas até ao fim do século XIX, quando passaram a ser abertos parcialmente pelo papa Leão XIII. Desde então, o acervo tornou-se um dos mais importantes do mundo. Em 1892, uma parte enorme da Dataria Apostolica, um dos cinco Ufficii di Curia, órgão da cúria romana anexo à chancelaria apostólica, foi criada no século XII e extinta no século XX durante o pontificado de Pio X. Durante o século passado, bem como em partes modernas dos arquivos da Secretaria de Estado, apareceram também arquivos da secretaria de comunicados da rota romana, tribunal com lei própria, também chamado de tribunal da rota romana ou tribunal rotae romanae, que funciona como instância superior no grau de apelo junto à sé apostólica para tutelar os direitos na Igreja de várias congregações, do palácio apostólico, do primeiro Concílio do Vaticano e até de famílias ligadas à história da cúria, incluindo Borghese, Boncompagni, Rospigliosi, Ruspoli, Marescotti, Montoro, entre outras.
No ano 2000, o arquivo completo sobre o Concílio do Vaticano II foi transferido pelo papa Paulo VI (1897-1978), que abriu o acesso a cientistas e investigadores num limite além do normalmente imposto para consultas. Hoje em dia, a documentação mantida nos Arquivos Secretos está em constante crescimento e cobre cerca de 800 anos de história, de 1198 em diante, com alguns documentos isolados pertencentes aos séculos X e XI. O item mais antigo conservado pelo arquivo é o Liber Diurnus Romanorum Pontificum, um antigo livro com as declarações da chancelaria papal que remontam ao século VIII.

A abertura dos Arquivos
Talvez não haja um anúncio de maior expectativa, principalmente para o mundo dos cientistas, que a abertura total ou parcial dos Arquivos Secretos do Vaticano ao público. Imagine-se ter acesso a milhares de documentos históricos, num acervo que é comparável ao de grandes museus do mundo, como o Museu Britânico ou o Louvre, mas composto apenas e tão-somente por papéis inéditos, que não veem a luz do dia há séculos. Não é à toa que, a cada anúncio de abertura de uma parte dos Arquivos Secretos do Vaticano, o mundo noticia esse facto com destaque. O Vaticano conhece o fascínio que os seus arquivos exercem nas pessoas. Os últimos períodos de abertura foram:

Em 1966: textos do período do pontificado de Pio XI, de 1846 a 1878;
Em 1978: textos do período do pontificado de Leão XIII, de 1878 a 1903;
Em 1985: textos do período dos pontificados de Pio X, de 1903 a 1914, e de Bento XV, de 1914 a 1922.

Em 2003, o papa João Paulo II abriu a documentação referente ao arquivo histórico da Secretaria de Estado (segunda seção), que possui textos que narram as perigosas interacções do Vaticano com a Alemanha durante o nazismo. O meio académico sempre se interessou, motivo pelo qual Pio XI se manteve de certa maneira inerte à perseguição realizada contra os judeus, o que levou à especulação de que o papa teria alguma espécie de acordo secreto com Hitler. A abertura total dos Arquivos Secretos do Vaticano seria um acontecimento ímpar. Primeiro, por ter um dos acervos mais antigos e em excelente estado de conservação, graças aos esforços dos especialistas que lá trabalham, em geral ligados à Igreja ou ao próprio clero». In Sérgio P. Couto, Os Arquivos Secretos do Vaticano, Da Inquisição à renúncia de Bento XVI, Editora Gutenberg, 2013, ISBN 978-856-538-385-1.

Cortesia de EGutenberg/JDACT