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Desacostumado de tomar decisões e impor autoridade, Philip Sanford começou mal.
Dos vinte livros iniciais publicados sob a sua direcção no primeiro ano, a
maioria foi um fracasso, e o resto apenas deu para cobrir as despesas ou render
um lucro irrisório. Nenhum podia alegar qualquer mérito nem figurar na lista
dos mais vendidos. Nenhum provocaria uma grande venda subsidiária capaz de atrair
os clubes literários ou as reedições de bolso. Finalmente, com a coragem
oriunda do puro desespero, Philip Sanford fez um esforço para fugir à sombra
paterna e tornar-se dono do próprio nariz. Resolveu publicar o que lhe agradava
e não o que julgava que o pai publicaria. Adquiriu os direitos de um romance
que lera e admirara durante uma travessia marítima entre Le Havre e Nova
Iorque, um livro que nunca tinha recebido licença para ser publicado
abertamente em qualquer nação de língua inglesa no mundo. Era uma obra chamada
Os Sete Minutos e da publicação e êxito desse romance dependia todo o futuro de
Philip Sanford.
Quando
Barrett jantara na sua companhia em Nova Iorque aquela última vez, Sanford
mostrara-se maníaco sobre as possibilidades do livro. Pela primeira vez na
história da literatura moderna, insistia, havia clima propício à aparição de
tal obra. Um mundo ocidental que finalmente aceitara O Amante de Lady
Chatterley e Fanny Hill estava suficientemente maduro para aceitar Os Sete
Minutos. O livro já se achava no prelo. o interesse das livrarias crescia cada
vez mais. Prometia ser um êxito louco. E então Sanford teria a sua casa
editora, o seu refúgio, o seu futuro e seria, enfim, dono do próprio nariz. A
maior parte da noitada fora consagrada a discutir a sobrevivência de Phil. Só
nos últimos dez minutos é que se interessou pela vida de Barrett. Queixara-se
da carreira rastejante que tinha com Thayer & Turner. E mencionara como
únicos paliativos a proposta de Abe Zelkin e a afeição que sentia pela filha de
Willard Osborn. E agora, de repente. Philip Sanford queria falar-lhe
urgentemente. Levando em conta o que sabia da vida de Sanford, que poderia
haver de urgente que lhe pudesse dizer respeito? O telefone a seu lado começou
a tocar. Tirou-o do descanso. Alô? Mike?, era a voz de Sanford. Nenhuma
secretária ocupara antes a linha, o que indicava urgência. É você. Mike? Quem
mais havia de ser? Como vai, Phil? Desculpe por não me ter encontrado. Cheguei
mesmo agora. Como vão as coisas? Se você se refere à família, tudo na mesma,
como sempre. Trata-se de algo diferente. É assunto de negócios. Mike. Não
imagina o meu alívio por ter ligado em seguida. Barrett notou logo o tom da voz
de Sanford: nervoso, aflito. Você dá-me a impressão de que aconteceu qualquer
coisa de grave. Se houver algo que eu possa... Pode, sim. Você pode ajudar-me.
Então,
fale. Mike, lembra-se quando esteve aqui a última vez e eu disse que me estava
a sair mal com a primeira lista de livros, os livros meus, não as sobras de stock
Wesley R.? Barrett lembrava-se de que Sanford sempre se referira ao pai, Wesley
R. Sanford, como Welsley R. Jamais conseguira chamá-lo pai. Sim, mas você
mostrou-se optimista... Exacto. Por causa de um livro que eu tinha no prelo. Os
Sete Minutos, de J J Jadway. Estava a arriscar tudo nele. Tudo ou nada.
Lembra-se? Barrett fez que sim ao telefone. Perfeitamente. O romance que ninguém
se atreveu a publicar durante trinta e cinco anos. Vi o anúncio de lançamento
no domingo passado. Tremendo. A voz de Sanford tornou-se ansiosa. Você viu o
livro, não foi? Mandei-lhe um dos primeiros exemplares por via aérea. Com ar
culpado, os olhos de Barrett percorreram rápido o quarto de dormir. Ele tinha
recebido o exemplar antecipado de cortesia há cerca de três semanas e o livro
continuava fechado em cima da mesa-de-cabeceira da cama de casal. Tencionava
lê-lo, a fim de poder escrever ao amigo um bilhete de agradecimento e estímulo,
mas tanta coisa se passara desde então que nunca chegou a fazê-lo. As eternas
boas intenções.
Recebi,
sim, Phil. Está do lado da minha cama. Cada dia que passa prometo-me escrever
para lhe agradecer, desejar felicidades, mas ando atolado num milhão de coisas.
Li tudo meio à pressa, e acho que o livro é exactamente o que você disse. O
assunto é brutal, vai ter um êxito doido. Vai mesmo, afirmou Sanford
entusiasmado. Está a preparar-se para ser o maior êxito do ano, talvez da
década inteira. Você não faz ideia, do que está a acontecer com os
distribuidores e as livrarias. Faltam ainda vários dias para a publicação
oficial e já estamos a tirar uma segunda edição. Temos duzentos mil exemplares
no prelo e já despachámos cento e trinta mil. Compreende o que isso significa.
Míke? Que diabo, você entende de sobra do comércio de livros de tanto me ouvir
falar no assunto. Veja, por exemplo, o romance comum. Se for livro de estreia,
e o de Jadway é-o, foi o único que ele escreveu, aliás, bem, talvez se imprimam
quatro mil exemplares para começar, e talvez os distribuidores consigam colocar
dois mil antes de a obra ser publicada, sendo despachados em consignação..., se
não forem vendidos, podem ser devolvidos..., e talvez dentro de seis meses ou
um ano a gente acabe por vender setecentos e cinquenta exemplares». In Irving
Wallace, Os Sete Minutos, Coleção Dois Mundos, Livros do Brasil, 1988, ISBN
978-972-380-948-0.
Cortesia
de CDMundos/LdoBrasil/JDACT