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Este é um aspecto do comércio de livros, por trás do alarido dos críticos e dos
anúncios de que o público nem toma conhecimento. Mas de vez em quando, de
tantos em tantos anos, se a gente tem sorte, pega-se num negócio de arromba, um
romance de estreia que sai a chispar que nem avião a jacto. É o caso de Os Sete
Minutos. Claro que já vinha com toda a propulsão preparada. Aquela série de
proibições sem fim. Essa conversa de ser imoral, o que ele não é. Agora, pela
primeira vez em trinta e cinco anos, as pessoas poderão constatar por si
mesmas. Portanto, temos encomendas para cento e trinta mil exemplares e
esperamos receber para o resto dos duzentos mil, uma semana depois que o livro
tiver saído. E isto é apenas o começo, Mike. Quando estiver exposto em toda a
parte, e à venda, e as pessoas passarem a comentar, a discutir, a propaganda de
boca fará o negócio pegar fogo. Pode-se chegar a trezentos ou quatrocentos mil
exemplares em poucos meses. E isso ainda não é nada. Vamos abrir concorrência
para as reedições de bolso. Depois de o tornarmos respeitável, mostrando que
foi aceite, vão disputar os direitos de reimpressão como se fosse leilão. O que
talvez signifique um milhão de dólares para iniciar, sem contar as futuras
vendas e direitos autorais, e não esqueça que Sanford House, a editora, fica
com cinquenta por cento da renda das edições de bolso. Entende o que quero
dizer, Mike? Não há limite. Você sabe quanto já rendeu O Amante de Lady
Chatterley, segundo as últimas estimativas? Encadernado e em brochura, já se
venderam mais de seis milhões de exemplares, e decerto anda próximo dos sete
milhões nesta altura. Pois é o que temos nas mãos agora, talvez até mais, muito
mais, com Os Sete Minutos. E você conhece a minha situação, Mike. Isto fará com
que Wesley R. não se levante da cama, doente como está, e nunca mais interfira
nos meus negócios. Sabe o que isso significa para mim, Mike. Fora da minha
família não há ninguém que saiba disso melhor do que você.
A
torrente quase histérica de palavras parou abruptamente. Ouvia-se apenas a
respiração ofegante do outro lado do telefone transcontinental. Sei, sim, disse
Barrett. Depois ficou em dúvida. Parece que você está com um êxito certo nas
mãos. E estou mesmo, Mike..., se nada sair errado. Sem reflectir, quase
automaticamente, Barrett começou: mas o que poderia eu... A censura,
interrompeu Sanford. Perco tudo, se a Polícia não deixar as livrarias venderem
o livro, nem as pessoas comprarem. Se isso acontecer, não só não terei um êxito
como será um desastre completo. Wesley R. chutar-me-á daqui nessa mesma hora e
a minha querida Betty fará o mesmo. Perderei o negócio e os meus filhos. Não
ficarei com coisa alguma, salvo o fundo de garantia que minha mãe me deixou e
que não dá para manter um homem vivo, pode crer, Mike. Não dá. Barrett começou
a ficar levemente irritado com os presságios do amigo.
Phil,
você está com um óptimo negócio nas mãos, portanto para que antecipar desastre
quando não há a mínima possibilidade de haver nenhum? Censura? Duvido. Estamos a
viver numa época diferente. Tudo é feito às claras, em cima da mesa. Toda a
gente sabe que a Rainha tem pernas. Para dizer a verdade, eles sabem que ela
tem muito mais do que isso. Você pode comprar Fanny Hill em qualquer prateleira
de drogaria. Lembra-se quando alugávamos cópias mimeografadas no colégio? Lembra-se
daquele trecho que dizia essa deliciosa fenda de carne, onde se avolumavam agradáveis
tufos de cabelo, repartindo-se e apresentando a mais sedutora abertura? E Lady
Chatterley, lembra-se de Connie envolvendo as estreitas nádegas brancas do
amante com os braços e atraindo-o para ela, de modo que os seios salientes,
balouçantes, tocassem a ponta do falo excitado, erecto? E disso venderam-se,
quanto foi que você disse?, seis a sete milhões de exemplares. Hoje o negócio é
assim e assim será durante muito tempo, talvez para sempre, a não ser que as
pessoas se cansem da verdade e a gente retroceda à época do asterisco outra
vez. Mas não agora. As pessoas não se assustam tanto com o sexo, especialmente
quando é apresentado com talento... O
livro de Jadway não foi proibido só por causa de sexo, interrompeu Sanford. É
que certas passagens fortes são sacrílegas». In Irving
Wallace, Os Sete Minutos, Coleção Dois Mundos, Livros do Brasil, 1988, ISBN
978-972-380-948-0.
Cortesia
de CDMundos/LdoBrasil/JDACT