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À
procura do Bem e do Mal
«[(…)] Já que farlei na expedição
às ilhas Canárias, devo dizer que não gosto de lembrá-la e Henrique ainda menos,
tanto mais que fica desajeitado só de ouvir pronunciar-lhe o nome. Deste
acontecimento, por ser frustrante, não me trouxe nenhuma alegria, ficando dele apenas
a lembrança aviltante da derrota de Henrique, do sumiço de homens, dinheiro e
equipamentos que tanta falta nos faziam. Mas não esqueço, não posso mesmo
esquecer-me. Só se não tivesse visto todo o entusiasmo da partida, o ar ufano dos
cavaleiros portugueses em véspera de uma conquista e depois o embaraço triste
da chegada. Mas vi. Presenciei como vinham acabrunhados, humilhados, uns destroços,
afectados na sua honra de cavaleiros valentes, vencidos por gentalha sem Deus, sem
religião, porque afinal nem mouros eram.
[…]
Claramente, o pensamento do rei não
era escorreito. Se as dúvidas sobre o infante Henrique eram assim tantas, por que
motivo iria privilegiar o conselho dele? Caminhando, o rei enchia os olhos de sugestões
motivadoras, imagens que lhe permitiam esquecer por algum tempo as suas
preocupações.
A Espera tem um Fim
O infante Henrique, embora sendo entre
todos os nobres o que dispunha de mais meios para gerar riqueza, não abria mão da
possibilidade de criar novas fontes de rendimento, continuando a procurar o tesouro
que suportasse tão desmedida ambição. Por sua vez, o rei Duarte I, uma peça fácil
de manusear para Henrique, nem lhe passa pela cabeça que o irmão tem um esquema
traçado para o submeter às suas utopias, nem supõe que Fernando e dona Leonor
fazem parte dos planos dele. O rei veio rapidamente de Almeirim para Lisboa procurar
ajuda junto do irmão, mas só dois dias depois da chegada é que Henrique compareceu
no Paço. A estratégia do infante Henrique estava traçada. O pequeno retiro na
acolhedora vila de Sintra, quase de improviso, entre caçadas, comidas e rezas, servia
para ajustar ideias, medir solidariedades ou impor vontades aos que ainda se mostravam
indecisos. Nesta perspectiva, convinha-lhe manter-se afastado do irmão por mais
algum tempo, no justo momento em que a conversa que iriam ter punha fim a anos de
espera. Fazer Duarte aguardar para lá do razoável fora ideia sua, pois sabia que
contaria com a cunhada para a primeira abordagem, o que tornava dona Leonor
numa aliada fundamental para os seus estimados projectos.
O infante tinha um espírito
desinquieto, mas também percebia que sozinho, ou só com a participação de Fernando,
não suportaria os custos que uma armada de muitos milhares de homens e
equipamentos representava. Mesmo tendo abundantes cedências da Coroa, através de
distinções, privilégios, benefícios ou isenções, que lhe enchiam os cofres e a importância,
não conseguia fazer-se ao mar para conquistar Tânger sem que o rei arcasse com as
maiores despesas». In Jorge Sousa Correia, O Mistério do Infante Santo, 2013, Clube do
Autor, 2013, ISBN 978-989-724-067-6.
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