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Sob as asas da águia (1798-1806)
«(…) A arquiduquesa Leopoldina
herdou também as características físicas tradicionais dos Habsburgo do ramo
austríaco. Era loura, de pele muito branca, e tinha os olhos azuis, de uma
beleza que jamais perderia. Durante a infância se parecia muito com a
arquiduquesa Maria Clementina, que nasceu pouco depois de ela completar um ano,
e que em família seria chamada simplesmente de Maria. Segundo os diários de uma
condessa dinamarquesa que visitou Viena no ano do nascimento dessa
arquiduquesa, a imperatriz estava tão apaixonada por seu esposo que tentava
evitar que ele se relacionasse com outras mulheres da corte. O estilo de vida
da família imperial imposto por ela, que alguns chamariam equivocadamente de burguês,
por conta de sua aparente simplicidade, teria sido, segundo a condessa, uma
forma de garantir que o marido não se encontrasse muito com algumas belíssimas mulheres
da aristocracia vienense. Os burgueses de Viena, por sua vez, consideravam
Maria Teresa uma mulher de virtude inatacável, que realizava as obras de
caridade que se esperava que uma imperatriz realizasse, tarefa na qual se fazia
acompanhar por suas filhas à medida que cresciam. Nos citados diários narra-se
uma cena que teria acontecido nos jardins do palácio de Laxenburgo, onde a
família imperial costumava passar parte da Primavera e o Verão.
Um
estrangeiro viu o
imperador sentado sozinho num banco, absorto em seus pensamentos. De súbito, a
imperatriz se aproximou para abraçá-lo e ele exclamou: porque nunca me deixa
sozinho, para que eu possa respirar um instante? Pelo amor de Deus, não me siga
o tempo todo. Maria Teresa também era criticada por passar muitas tardes
cantando e actuando em comédias que eram representadas no círculo familiar mais
íntimo dos Habsburgo. A bem da verdade, a imperatriz não parecia muito preocupada
quando, em 1799, seus pais foram destronados pela chamada Revolução Napolitana,
herdeira da francesa. A avó materna de Leopoldina acabou refugiada na ilha da
Sicília.
A irmã preferida da rainha Maria
Antonieta não foi a única parente próxima da futura imperatriz do Brasil que perdeu
o trono naquele ano. As tropas revolucionárias francesas derrubaram também o grão-duque
da Toscana, tio paterno de Leopoldina. O papa, que estava sob a protecção do grão-duque
desde que os franceses haviam entrado em Roma e ajudado a declarar a República
Romana, foi levado à França. Contam que Maria Teresa ficou muito comovida ao
saber que o pontífice tinha morrido na prisão e que o seu funeral havia sido
humilhante. Colocado num simples ataúde de madeira como o que então usavam os pobres,
ele foi enterrado, no fim de Janeiro de 1800, num cemitério local com uma lápide
que dizia: cidadão Gianangelo Braschi, de profissão, papa.
Durante séculos, a Casa de
Habsburgo havia sido um dos grandes pilares do pontificado romano, e, de certo
modo, era lógico que a imperatriz se sentisse afectada pela sorte de um de seus
representantes. Mas também é possível que isso se devesse ao facto de que os
seguidos nascimentos de seus filhos a teriam tornado mais sensível diante de
certas coisas. Depois de dar à luz Maria Clementina, a imperatriz havia trazido
ao mundo um segundo menino e, em 1801, a arquiduquesa Maria Carolina, futura
princesa da Saxónia. No ano seguinte nasceria o arquiduque Francisco Carlos.
Desse modo, ao completar cinco anos Leopoldina fazia parte de uma unida família
de vários irmãos com quem passava grande parte do dia, pois os meninos e as
meninas tiveram inicialmente uma aia em comum, além dos camareiros e porteiros;
e ainda, cada criança possuía uma camareira e criadas de câmara próprias». In
Marsilio Cassotti, Imperatriz D. Leopoldina, tradução de Sandra Dolinsky,
Manuscrito Editora, 2015, ISBN 978-989-881-803-4.
Cortesia de ManuscritoE/JDACT