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de Maio de 1291, Terra Santa: Acre, cidade portuária do reino Cruzado, jazia em
ruínas. Apenas a grande torre costeira dos cavaleiros templários continuava de
pé. Durante sete semanas o exército árabe de Khalil al-Ashraf, o jovem sultão
do Egipto, cercou e, depois, atacou a cidade. A última capital do reino cristão
estava arrasada. Nas ruas, antes abarrotadas de guerreiros e nobres, mercadores
e pedintes, viam-se agora prédios desmoronados e cadáveres. Naquela época
violenta, não havia qualquer constrangimento quanto aos prejuízos indiretos:
quando uma cidade era tomada, a carnificina e o roubo eram livremente
admitidos. Os árabes estavam determinados a varrer quaisquer vestígios dos cruzados
para o mar; os cruzados, por sua vez, também nutriam a firme determinação de
sobreviver, com a esperança, embora remota, de serem capazes de ressuscitar o seu
reino. Esta esperança, porém, se desvaneceu com a queda de Acre. Para além da
fumaça e das ruínas ensanguentadas da cidade, apenas a enorme torre dos
templários se erguia intocada. Amontoados no seu interior se encontravam os que
haviam sobrevivido até ali, juntamente com cinquenta ou sessenta cavaleiros, os
remanescentes do que já fora um dia uma portentosa força guerreira, um exército
de peso, no reino cristão de Jerusalém. Eles aguardavam. Nada mais havia a
fazer. Ninguém viria salvá-los. Um punhado de navios desistiu de aportar na
cidade, um punhado mais de cavaleiros e civis fugiu. Os sobreviventes esperavam
a chegada do fim, e durante a semana seguinte conseguiram rechaçar contínuos
ataques. Tamanha havia sido a intensidade da luta que mesmo os templários se
desesperaram. Quando o sultão acenou com a possibilidade de deixar partir
incólumes todos os cavaleiros e civis caso abandonassem o castelo, o marechal
templário, que organizava a resistência, concordou. Permitiu a entrada no
castelo de um grupo de guerreiros árabes liderados por um emir e hasteou o
estandarte do sultão. Os indisciplinados soldados árabes, contudo, começaram a
molestar mulheres e crianças. Furiosos, os templários mataram todos eles e
derrubaram o estandarte do sultão. O sultão encarou o facto como traição e
preparou a sua brutal retaliação: no dia seguinte, reapresentou a sua oferta de
salvo-conduto. Mais uma vez, o oferecimento foi aceito. O marechal dos
templários, acompanhado de vários cavaleiros, partiu ao encontro do sultão, sob
a promessa de uma trégua, a fim de negociar os termos do acordo. Antes, porém,
que a comitiva chegasse até ao monarca, sob os olhos dos defensores que
guarneciam as muralhas do castelo templário, seus integrantes foram presos e
executados. Não houve por parte do sultão nenhuma outra oferta de rendição
pacífica, e ainda que tivesse havido, os templários não cogitariam aceitá-la: a
luta iria até ao fim. Naquele malfadado dia, os muros do castelo dos
templários, solapados pelos árabes, começaram a ruir: os árabes iniciaram o seu
ataque. Dois mil guerreiros mamelucos vestidos de branco invadiram a torre dos
templários através de uma brecha na muralha. A estrutura, abalada por semanas
de investidas, cedeu. Com um estrondo repentino, as pedras rolaram, umas sobre
as outras, esmagando e sepultando tanto atacantes quanto defensores. Cessado o
movimento e assentada a poeira, o silêncio anunciou que estava tudo acabado.
Após quase duzentos anos, o sonho de um reino cristão na Terra Santa virará
cinzas. Até mesmo os templários abandonaram então os seus poucos castelos
remanescentes e se retiraram da terra que lhes havia roubado cerca de vinte mil
confrades ao longo de 173 anos de luta quase sempre acirrada.
Os
templários há muito me fascinavam. E não apenas seu papel como exército
profissional e sua grande, embora amplamente ignorada, contribuição para o
esboço do nosso mundo moderno, eles inauguraram o poder do dinheiro sobre a
espada, por meio de cheques e transferências financeiras seguras de cidade para
cidade e de país para país; amenizaram o fosso entre a aristocracia dominante e
os camponeses explorados, o que ajudou a abrir espaço para uma classe média.
Uma aura de mistério sempre os envolveu. Como peculiaridade, ao menos alguns
deles aparentemente seguiam um tipo de religião que ia de encontro à de Roma.
Tudo indicava que suas fileiras abrigavam a heresia, mas pouco se sabia a esse
respeito. Eu estava curioso e decidido a buscar respostas. Comecei a pesquisar
o lado misterioso dos cavaleiros templários. Um dia, eu visitava uma livraria
em Londres quando um amigo, que por acaso era o dono da loja, me abordou e
disse que havia alguém que eu precisava conhecer, alguém que dispunha de
informações que talvez me interessassem sobre os templários. E foi assim que
conheci meu colega Richard Leigh. Acabamos escrevendo juntos sete livros nos
vinte anos seguintes. Sem dúvida, Richard estava de posse de informações
interessantes, dados que lhe haviam sido passados por Henry Lincoln. Richard e
eu logo nos demos conta de que devíamos unir forças. Poucos meses depois, Henry
chegou à mesma conclusão. Formamos um time e, como dizem por aí, arregaçamos as
mangas. O resultado, seis anos depois, foi o best-seller O Santo Graal e a
linhagem sagrada. Nossa hipótese central juntava os cruzados e as lendas do
Graal, dois temas raramente associados pelos historiadores. Descobrimos que por
trás de ambos havia uma linhagem importante, uma dinastia: a linhagem dos reis
judeus, a Casa de David. As lendas do Graal combinam elementos da antiga
tradição pagã celta com elementos de misticismo cristão. O símbolo de um vaso
ou cálice de abundância que assegura a fertilidade perene da terra derivou dos
primeiros, enquanto dos últimos vieram as descrições do Graal em termos de
experiência mística. No entanto, o significativo para nós era o facto de as
lendas enfatizarem que o cavaleiro do Graal, Perceval ou Parsifal, pertencia à
linhagem mais sagrada, uma linhagem que recuava na história até Jerusalém e a
cruz. Logicamente, tratava-se de uma referência à Casa de David. Esse dado
escapara a todos que antes de nós haviam estudado o Graal.
Argumentamos
que o termo para Graal, Sangraal ou Sangreal, que se tornou San Graal ou San
Greal, Santo Graal,, formava um jogo de palavras. O enigma se resolvia com uma
divisão ligeiramente diferente, Sang Real, ou seja, sangue real, que alude, em
nossa opinião, à Casa de David. Realmente, para a época medieval, esta era uma linhagem
altamente sagrada. Não resta dúvida de que a Casa de David existia no sul da
França no início do período medieval. Trata-se de um facto histórico. No
processo de fundação de seu reino, Carlos Magno nomeou um de seus companheiros
próximos, Guillem (William), conde de Toulouse, Barcelona e Narbonne, para
governar um principado espremido entre dois reinos inimigos, o reino cristão de
Carlos Magno e o emirado islâmico de Al Andalus; noutras palavras, Espanha
islâmica. Guillem, o novo príncipe, era judeu. Pertencia, também, à Casa de
David. O viajante judeu do século XII Benjamin de Tudela, no relato de sua
jornada da Espanha ao Oriente Médio, revelou que o príncipe à testa da nobreza
regente de Narbonne era um descendente da Casa de David conforme consta na sua
árvore genealógica. Até mesmo a Encyclopaedia Judaica menciona esses reis
judeus de Narbonne, mas ignora a sua linhagem. Naturalmente, a ninguém aprazia
perguntar de onde teria surgido essa linhagem mencionada por Benjamin de
Tudela. Com efeito, como viríamos a descobrir, a situação era bastante
complicada. Ao examinar as genealogias desses príncipes da Casa de David no sul
da França, concluímos se tratar dos mesmos ancestrais de um dos líderes da
Primeira Cruzada, Godfroi de Bouillon, que se tornou rei de Jerusalém. Essa Cruzada
contou com quatro grandes líderes nobres. Porque apenas a Godfroi de Bouillon
foi oferecido o trono, e por que essa oferta teria partido de um misterioso e
ainda desconhecido conclave de eleitores que se reuniram em Jerusalém para
decidir o assunto? A quem se sujeitariam esses orgulhosos senhores, e por que
razão? Em nossa opinião, o sangue prevaleceu sobre os títulos de nobreza;
Godfroi reivindicou seu direito hereditário como membro da Casa de David. E
qual a origem desta linhagem? Ora, Jerusalém, Jesus e o produto, como
defendemos em O Santo Graal e a linhagem sagrada, de um casamento entre Jesus e
Maria Madalena. Na verdade, ponderamos, não seriam as bodas de Caná o casamento
de Jesus e Maria Madalena? Isso, no mínimo, explicaria por que ele foi chamado
ao casamento e lhe coube a responsabilidade sobre o vinho! É evidente que a
publicação do nosso livro detonou uma controvérsia mundial» In Michael
Baigent, Os Manuscritos de Jesus, Editora Nova Fronteira, 2006, ISBN
978-852-091-898-2.
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