A Piazza Pizzo di Merlo
«(…) As criadas não podiam deixar de abraçá-la, dar palmadinhas
no seu rosto ou acariciar os belos cabelos. Querida madonazinha, murmuravam
elas, e sussurravam juntas sobre os encantadores occhi bianchi que iriam
fazer de sua pequenina madona uma mulher sedutora. Ela sentia-se feliz com a
afeição delas; aconchegava-se nelas, dando amor em troca de amor; e ansiava por
uma carreira de sedutora com o máximo de prazer. A pequena Lucrécia, até então,
acreditava que o mundo tinha sido feito para o seu prazer, os irmãos sentiam a
mesma coisa com relação a eles, mas, porque Lucrécia era, por natureza, serena,
estava sempre contente e só podia sentir-se agradada quando agradava a outros, seu carácter era
inteiramente diferente do de seus irmãos. A vida jovem de César e de Giovanni
era obscurecida pela inveja que cada um tinha do outro; Lucrécia não sabia o
que era aquele tipo de sentimento. Era a rainha da ala infantil, com a certeza
do amor de todos. E assim, até o quarto aniversário, a garotinha ficou fechada
no seu mundo de contentamento que a envolveu como um confortável casulo.
Mas
com o quarto aniversário veio o primeiro indício de que a vida era menos
simples do que ela acreditava que fosse, e que não continuava para sempre no
mesmo padrão agradável. A princípio, ela percebeu a agitação nas ruas. Havia
muitas idas e vindas pela ponte. Todos os dias, grandes cardeais, acompanhados
de suas comitivas, chegavam a Roma nas suas mulas. As pessoas ficavam por ali
em pequenos grupos; algumas conversavam calmamente, outras gesticulavam,
iradas. O dia todo ela esperara uma visita do tio Roderigo, mas ele não viera. Quando
César entrou na ala infantil, ela correu para ele e segurou-lhe as mãos, mas
até César havia mudado; não parecia tão interessado nela quanto antes. Foi até a
loggia e, paciente, se pôs ao lado dele, como um pequeno pajem, humilde, esperando suas
ordens, como ele gostava que ela fizesse; no entanto, ele nada disse: ficou
quieto, observando as multidões nas ruas.
Tio
Roderigo não nos veio visitar, disse ela, tristonha. César abanou a cabeça. Ele
não virá, irmãzinha. Hoje, não. Ele está doente? César abriu um sorriso lento.
Ela viu que as mãos dele estavam fechadas e que sua fisionomia estava tensa,
como tantas vezes ficava quando estava zangado ou decidido quanto a alguma
coisa. Ela ficou no degrau que lhe permitia ficar com altura suficiente para
chegar ao ombro dele e colocou o rosto perto do dele, para que pudesse estudar a
sua expressão. César, disse ela, está zangado com o tio Roderigo? César agarrou
o pescoço dela com as suas mãos fortes; aquele golpe dele doía um pouco, mas
ela gostava porque sabia o que significava: veja como eu sou forte. Veja como
eu poderia machucá-la, pequena Lucrécia, se quisesse; mas não quero, porque
você é minha irmãzinha e eu a amo porque você me ama..., mais do que qualquer
outra pessoa no mundo..., mais do que a nossa
mãe, mais do que o tio Roderigo, melhor, sem dúvida de que melhor, do que
Giovanni. E quando ela gritou e mostrou pela expressão do rosto que ele a
estava machucando, só um pouquinho, aquilo queria dizer: sim, César, meu irmão.
Eu te amo mais do que a qualquer outra pessoa no mundo. E ele compreendeu e
seus dedos tornaram-se delicados. Não se fica zangado com o tio Roderigo, disse
César a ela. Isso seria uma tolice, e eu não sou tolo. Não, César, não é tolo.
Mas está zangado com alguém? Ele abanou a cabeça. Não. Eu estou contente,
irmãzinha. Diga porquê. Você ainda é uma criança. O que poderia saber sobre o
que se passa em Roma?» In Jean Plaidy, Lucrécia Borgia, Edição Record, 1996, ISBN 978-850-104-410-5.
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Jean Plaidy, Itália, Literatura,