Assassinato nas Ordens Sagradas
«(…) No andar de baixo, as luzes
ainda estavam acesas no Banco do Vaticano, onde o seu chefe, o bispo Paul
Marcinkus, recebera recentemente um relatório sobre o papa, o Banco do Vaticano
e os métodos de administração, incluindo a recente aquisição da Banca
Cattolica. As informações estavam nas mãos de várias dioceses, mas a maior
parte ficou com o Banco do Vaticano. Naquela noite, o cardeal Jean Villot,
secretário de Estado do Vaticano, também estava trabalhando até aquela hora,
estudando as mudanças que o papa lhe transmitira uma hora antes. Villot
defendeu e argumentou, mas o papa se manteve inflexível. As mudanças deveriam
ser feitas. Em Buenos Aires, o banqueiro Roberto Calvi e dois sócios, Licio
Gelli e Umberto Ortolani, sabiam que o Banco da Itália vinha investigando
secretamente o banco de Calvi em Milão desde Abril, levado por uma campanha
pública contra Calvi, iniciada em 1977, dando detalhes de actividades
criminosas. (…) Em Nova Iorque, o banqueiro siciliano Michele Sindona vinha
lutando contra os esforços do governo italiano para extraditá-lo para Milão
para que enfrentasse as acusações envolvendo um desvio fraudulento de 225
milhões de dólares. Um juiz federal decidira pela extradição em Maio. Em
liberdade depois de pagar uma fiança de 3 milhões de dólares, Sindona exigira
que o governo dos Estados Unidos provasse a existência de evidências fundamentadas
que justificassem a extradição. A audiência estava marcada para Novembro. Em
Chicago, o cardeal John Cody, chefe de uma arquidiocese de 2,5 milhões, quase 3
mil padres, 450 paróquias e uma receita anual que ele se recusava a revelar,
sabia que numerosas organizações haviam solicitado a Roma a sua remoção.
O papa foi para a cama. A noite
encobriu o Vaticano.Na madrugada do dia 29 de Setembro de 1978, a governanta do
papa bateu na porta do quarto, como sempre fazia, exactamente às 4h30. Como não
ouviu resposta, afastou-se. Voltou quinze minutos depois e percebeu que não
havia movimento. Ao entrar no quarto, encontrou-o sentado na cama, ainda
segurando os papéis da noite anterior. Morto.
Na mesinha de cabeceira, um vidro
aberto de Effortil, seu remédio para pressão baixa. A camareira, abalada e aos
prantos, informou imediatamente o camareiro papal, o cardeal Villot. Villot
chegou ao quarto do papa às 5 horas e pegou os papéis importantes, o vidro de Effortil
e vários objectos pessoais que estavam sujos de vómito. Nenhum desses objectos
foi visto novamente. O Vaticano afirmou que o médico da casa havia apontado um
enfarto do miocárdio como causa da morte. Embora a lei italiana determine um
período de vinte e quatro horas até que o corpo possa ser embalsamado, o
cardeal Villot tomou providências para que o corpo de Albino Luciani estivesse
preparado para o funeral doze horas após a sua morte. Ainda que o Vaticano
tenha se recusado a permitir uma autópsia com base na (…) lei canónica, a
imprensa italiana verificou que uma autópsia havia sido feita no papa Pio VIII
em 1830. A primeira informação pública dizia que o Santo Padre foi encontrado
morto pela irmã Vincenzia e não pelo seu secretário. (…) Um relato informava
que estava morto no banheiro, outro dizia que estava junto à sua escrivaninha
no quarto. Havia discrepâncias também sobre a hora da morte, embora a
estimativa oficial fosse a de que ele havia morrido às 23 horas do dia 28 de Setembro.
Outro relatório dizia que João
Paulo havia-se queixado durante o dia de um mal-estar, mas não chamou um
médico. Dizia que ele sentira uma dor e tossira bastante naquela tarde. Foi
relatado que após o jantar ele correu pelo corredor para atender uma chamada
telefónica às 21h15. Isso teria provocado um ataque cardíaco fatal? Ou teria
sido envenenado? Alguns dos que acreditavam que ele havia sido assassinado
afirmaram que o motivo era o medo de que o líder espiritual dos católicos
romanos estivesse iniciando uma revolução. Ele queria dar à Igreja uma nova
direcção, considerada indesejável e perigosa por muitos dos membros do alto
escalão.
Em 1984, no livro intitulado Em
nome de Deus, uma investigação em torno do assassinato de João Paulo I, o autor
britânico David Yallop sustentou que o assassinato do pontífice foi ordenado
por um ou mais de seus suspeitos; todos eles tinham muito a temer caso o papado
de João Paulo I continuasse. Entre os que tinham razões para preocupar-se estavam
vários membros de uma loja maçónica italiana clandestina chamada Propaganda
Due, ou P2. Fundada em 1877, em Turim, como Propaganda Massónica, tinha entre
seus membros políticos e funcionários de governo de toda a Itália. O nome foi
mudado para Propaganda Due após a II Guerra Mundial, quando o Grande Oriente
numerou as suas lojas Embora a Igreja tenha proibido os católicos de se
filiarem à Maçonaria, a P2 estendeu seu alcance na Santa Sé com a Grande Loja
do Vaticano. Em Setembro de 1978, havia entre os seus membros cardeais, bispos,
muitos prelados do alto escalão e leigos.
O grão-mestre era Licio Gelli.
Financista, foi o oficial de ligação de Mussolini com os nazis e organizador de
uma rota de fuga para a Argentina evitando que fossem presos como criminosos de
guerra; aliado do ditador argentino Juan Perón, no pós-II Guerra Mundial foi
informante da inteligência norte-americana e dos comunistas italianos; também actuou
para o estabelecimento de um governo de direita na Itália. Segundo Yallop, o assassinato
de João Paulo foi decidido devido à sua determinação de purgar o problemático
Banco do Vaticano e limpar a Igreja de seus laços com a P2. O homem que foi
rapidamente rotulado de Papa Sorriso, escreveu Yallop, pretendia arrancar o
sorriso de muitos rostos no dia seguinte. Yallop citou Villot, que havia
descoberto que seria substituído no cargo de secretário de Estado do Vaticano e
que estava consternado porque João Paulo pensava em afrouxar a proibição da
Igreja sobre o controle artificial da natalidade; Marcinkus, chefe do Banco do Vaticano,
que teria marcada a sua remoção imediata; Roberto Calvi, presidente do Banco Ambrosiano,
que enfrentaria a ruína se as suas trapaças com os fundos do Vaticano fossem descobertas;
Sindona, que sabia de suposta lavagem de dinheiro da máfia feita pelo Banco do Vaticano;
Gelli; e o cardeal John Cody, de Chicago, que teria sido avisado de que seria convidado
a demitir-se». In Paul Jeffers, Mistérios Sombrios do Vaticano, 2012, Editora Jardim
dos Livros, 2013, ISBN 978-856-342-018(7)-3(6).
Cortesia de EJdosLivros/JDACT
JDACT, Paul Jeffers, Vaticano, Religião, Literatura,