A Civilização Islâmica e o Gharb al-Ândalus
«(…) No século XI, Ibn Hazm escreve a Epístola sobre a excelência de Al-Andalus. Nesse escrito passa em revista a história literária do Islão peninsular e conclui afirmando a sua superioridade cultural sobre a Pérsia, o Iémen, a Síria e outros países orientais. Na primeira metade do século XII, o santareno Ibn Bassam na sua Daquira ou Tesouro exalta a superioridade dos poetas e literatos de Hespanha sobre os poetas do Oriente. Por sua vez, Al-Saqundi, já durante o domínio almóada, escreve o Elogio do Islão Espanhol onde reivindica, pela excelência das suas cidades e sábios, a superioridade do Andaluz sobre os povos berberes. Há que dar algum desconto ao elogio em boca própria. Com o triunfo da Reconquista, o Andaluz surge depois aos olhos dos exilados como o paraíso perdido. Ibn Said fala nas cidades, nos campos cultivados, nas casas, entre as árvores verdes, continuamente caiadas de branco, por dentro e por fora. No decurso das minhas viagens, não vi país que se possa comparar ao Andaluz quer na beleza, fertilidade, abundância de água, quer na exuberância da vegetação, com excepção dos arredores de Fez ou de Damasco, na Síria. E prossegue: O Andaluz tem sido comparado por muitos autores ao paraíso terreal. Portugal nasce como entidade política quando no Islão peninsular as ciências medievais e a filosofia atingiam um brilho assinalável. Muitos quadros fugiram mas as cidades e os campos com boa parte da sua população ficaram. A sua história, antes e depois, é também a nossa história.
Orgulhamo-nos quando da terra salta um esqueleto de criança datável de 27 a 30 000 anos e integramo-lo no nosso património. O mesmo deve acontecer com os homens e mulheres que habitaram e adubaram com os corpos o nosso solo, muçulmanos, cristãos e judeus, e que enriqueceram o nosso património e o da Humanidade.
A Formação da Sociedade de
al-Ândaluz
A construção da civilização islâmica na península conheceu um percurso lento e contraditório. Como em todas as conquistas, vencedor e vencidos influenciaram-se mutuamente. Por outro lado, não podemos perder de vista que o espaço dos ibéricos e dos invasores fora profundamente marcado pela matriz das civilizações mediterrânicas. Segundo Ibn Mozain de Silves, que viveu no século XI, em texto conservado por historiadores posteriores, conquistada a Espanha, Musa ibn Nusayr dividiu o território entre os militares que vieram à conquista, isto é, entre as tribos que nela participaram tal como distribuira os cativos e os bens móveis. Das terras conquistadas deduziu o quinto para o Tesouro Público e dos cativos escolheu cem mil dos melhores e mais jovens para os enviar ao califa al-Wualid Abd al-Malik. Nas terras do norte deixou os cristãos com a sua religião e os seus usos mediante o pagamento de um tributo. A conquista significou, pois, um corte. O poder estabelecido foi derrubado e em parte destruído, milhares de prisioneiros foram arrastados até ao Oriente e uma parte substancial da terra mudou de mãos. Mesmo os filhos do rei godo Vitiza, que, segundo parece, se bandearam pelos invasores, tiveram de partilhar as terras. Alguns autores menosprezaram o número dos recém-chegados. No entanto, os relatos muçulmanos falam em 30 mil árabes e principalmente berberes. A estes há que juntar os 400 árabes de Ifriqiya que acompanharam al-Hurr ibn Abd al-Rahman, os árabes do governador al-Samh ibn Malik al-Khawlani, os 7 000 sírios das tropas de Baly e os militares da hoste do governador Abu l-Khatar al-Husam ibn Dirar al-Kalbi». In António Borges Coelho, Instituto Camões, Colecção Lazúli, 1999, IAG-Artes Gráficas, ISBN 972-566-205-9.
Cortesia de Instituto Camões/JDACT
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