domingo, 26 de novembro de 2023

Dan Brown. O Símbolo Perdido. «O meu software não é diferente de, digamos, um simulador de voo. Alguns vão usá-lo como treino para missões aéreas de primeiros socorros em países subdesenvolvidos»

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«É, eu sei que parece loucura. O que estou querendo dizer é que ele quantifica o estado emocional do país. Proporciona uma espécie de barómetro da consciência cósmica, se preferir. Trish explicou como, usando um campo de dados constituído pelas comunicações do país, era possível avaliar o humor da nação com base na densidade de ocorrência de determinadas palavras-chave e indicadores emocionais no campo de dados. Épocas mais felizes tinham uma linguagem mais feliz, e épocas de stress tinham uma linguagem mais stressada. Em caso de atentado terrorista, por exemplo, o governo poderia usar os campos de dados para estimar a mudança na psique dos Estados Unidos e informar melhor o presidente sobre o impacto emocional do acontecimento.

Fascinante, comentou Katherine acariciando o queixo. Então você está basicamente examinando uma população de indivíduos... como se eles fossem um organismo único. Exacto. Um metassistema. Uma entidade única definida pela soma de suas partes. O corpo humano, por exemplo, é constituído por milhões de células individuais, cada qual com atribuições e finalidades diferentes, mas funciona como uma entidade única. Katherine aquiesceu, animada. Como um bando de pássaros ou um cardume que se move como se fosse uma coisa só. Nós chamamos isso de convergência ou de entrelaçamento.

Trish sentiu que a sua convidada famosa estava começando a perceber o potencial da programação de metassistemas e sua aplicabilidade no campo da ciência noética. O meu software, explicou Trish, foi criado para ajudar as agências governamentais a avaliar melhor e reagir de maneira apropriada a crises em grande escala: pandemias, tragédias nacionais, terrorismo, esse tipo de coisa. Ela fez uma pausa. É claro que nada impede que ele possa ser usado para outras coisas... talvez para capturar o estado de espírito do país em um dado momento e prever o desfecho de uma eleição presidencial ou a direcção em que o mercado de acções vai oscilar quando o pregão abrir.

Parece uma ferramenta poderosa. Trish fez um gesto indicando sua casa. O governo, pelo menos, achou. Então, os olhos cinzentos de Katherine se fixaram em Trish. Você se importa que eu pergunte sobre o dilema ético gerado pelo seu trabalho? Como assim? Quer dizer, você criou um software que pode facilmente ser usado para fins escusos. Quem quer que o detenha possui acesso a informações poderosas que não estão disponíveis para todo o mundo. Você não ficou preocupada ao criá-lo? Trish nem sequer pestanejou.

De jeito nenhum. O meu software não é diferente de, digamos, um simulador de voo. Alguns vão usá-lo como treino para missões aéreas de primeiros socorros em países subdesenvolvidos. Outros, para aprender a jogar aviões de passageiros contra arranha-céus. O conhecimento é uma ferramenta e, como todas as ferramentas, seu impacto está nas mãos do usuário. Katherine se recostou na cadeira, parecendo impressionada. Então deixe-me lhe fazer uma pergunta hipotética. De repente, Trish percebeu que a conversa havia se transformado em uma entrevista de emprego.

Katherine estendeu o braço e recolheu um minúsculo grão de areia do piso da varanda, erguendo-o para Trish ver. O que me parece, disse ela, é que, basicamente, seu trabalho sobre metassistemas permite calcular o peso de toda a areia de uma praia, pesando um grão de cada vez. Basicamente, é isso mesmo. Como você sabe, este grãozinho de areia tem uma massa. Muito pequena, mas mesmo assim uma massa. Trish aquiesceu. E justamente pelo facto de este grão de areia ter uma massa, ele exerce uma força de gravidade. Ela também é pequena demais para ser sentida, mas existe. Certo. Então, disse Katherine, se nós pegarmos trilhões de grãos de areia como este e deixarmos que atraiam uns aos outros para formar, digamos, a lua, a força de gravidade combinada deles será suficiente para mover oceanos inteiros e fazer subir e descer as marés por todo o nosso planeta.

Trish não sabia aonde Katherine pretendia chegar, mas estava gostando do que ouvia. Então vamos elaborar uma hipótese, falou Katherine, descartando o grão de areia. E se eu dissesse a você que um pensamento, qualquer ideia minúscula que se forme na sua mente, possui uma massa? E se eu lhe dissesse que um pensamento é uma coisa de verdade, uma entidade mensurável, com uma massa mensurável? Minúscula, é claro, mas ainda assim uma massa. Quais seriam as implicações disso?

Hipoteticamente falando? Bem, as implicações óbvias seriam: se um pensamento tem massa, então ele exerce uma força de gravidade e pode atrair coisas para si. Katherine sorriu. Você é boa. Agora avance mais um passo. O que acontece se muitas pessoas começam a se concentrar no mesmo pensamento? Todas as ocorrências desse mesmo pensamento passam a se consolidar em uma só, e a massa acumulada dele começa a aumentar. Portanto, sua gravidade aumenta. Certo. O que significa que... se um número suficiente de pessoas começar a pensar a mesma coisa, então a força gravitacional dessa ideia se torna tangível e exerce uma força de verdade. Katherine deu uma piscadela. E ela pode ter um efeito mensurável no nosso mundo físico». In Dan Brown, O Símbolo Perdido, 2009, Bertrand Editora, 2009, ISBN 978-972-252-014-0.

Cortesia de BertrandE/JDACT

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