«É, eu sei que parece loucura. O que estou querendo dizer é que ele quantifica o estado emocional do país. Proporciona uma espécie de barómetro da consciência cósmica, se preferir. Trish explicou como, usando um campo de dados constituído pelas comunicações do país, era possível avaliar o humor da nação com base na densidade de ocorrência de determinadas palavras-chave e indicadores emocionais no campo de dados. Épocas mais felizes tinham uma linguagem mais feliz, e épocas de stress tinham uma linguagem mais stressada. Em caso de atentado terrorista, por exemplo, o governo poderia usar os campos de dados para estimar a mudança na psique dos Estados Unidos e informar melhor o presidente sobre o impacto emocional do acontecimento.
Fascinante, comentou Katherine
acariciando o queixo. Então você está basicamente examinando uma população de
indivíduos... como se eles fossem um organismo único. Exacto. Um metassistema.
Uma entidade única definida pela soma de suas partes. O corpo humano, por
exemplo, é constituído por milhões de células individuais, cada qual com
atribuições e finalidades diferentes, mas funciona como uma entidade única. Katherine
aquiesceu, animada. Como um bando de pássaros ou um cardume que se move como se
fosse uma coisa só. Nós chamamos isso de convergência ou de entrelaçamento.
Trish sentiu que a sua convidada
famosa estava começando a perceber o potencial da programação de metassistemas
e sua aplicabilidade no campo da ciência noética. O meu software, explicou
Trish, foi criado para ajudar as agências governamentais a avaliar melhor e
reagir de maneira apropriada a crises em grande escala: pandemias, tragédias
nacionais, terrorismo, esse tipo de coisa. Ela fez uma pausa. É claro que nada
impede que ele possa ser usado para outras coisas... talvez para capturar o
estado de espírito do país em um dado momento e prever o desfecho de uma
eleição presidencial ou a direcção em que o mercado
de acções vai oscilar quando o pregão abrir.
Parece
uma ferramenta poderosa. Trish fez um gesto indicando sua casa. O governo, pelo menos, achou. Então, os
olhos cinzentos de Katherine se fixaram em Trish. Você se importa que eu
pergunte sobre o dilema ético gerado
pelo seu trabalho? Como assim? Quer dizer, você criou um software que pode
facilmente ser usado para fins escusos. Quem quer que o detenha possui acesso a
informações poderosas que não estão disponíveis para todo o mundo. Você não
ficou preocupada ao criá-lo? Trish nem sequer pestanejou.
De
jeito nenhum. O meu software não é diferente de, digamos, um simulador de voo.
Alguns vão usá-lo como treino para missões aéreas de primeiros socorros em países
subdesenvolvidos. Outros, para aprender a jogar aviões de passageiros contra
arranha-céus. O conhecimento é uma ferramenta e, como todas as ferramentas, seu
impacto está nas mãos do usuário. Katherine se recostou na cadeira, parecendo
impressionada. Então deixe-me lhe fazer uma pergunta hipotética. De repente,
Trish percebeu que a conversa havia se transformado em uma entrevista de
emprego.
Katherine
estendeu o braço e recolheu um minúsculo grão de areia do piso da varanda,
erguendo-o para Trish ver. O que me parece, disse ela, é que, basicamente, seu
trabalho sobre metassistemas permite calcular o peso de toda a areia de uma
praia, pesando um grão de cada vez. Basicamente, é isso mesmo. Como você sabe,
este grãozinho de areia tem uma massa.
Muito pequena, mas mesmo assim uma massa. Trish aquiesceu. E justamente pelo facto de
este grão de areia ter uma massa, ele exerce uma força de gravidade. Ela também é pequena demais para ser
sentida, mas existe. Certo. Então, disse Katherine, se nós pegarmos trilhões de
grãos de areia como este e deixarmos que atraiam uns aos outros para formar,
digamos, a lua, a força de
gravidade combinada deles será suficiente para mover oceanos inteiros e fazer
subir e descer as marés por todo o nosso planeta.
Trish
não sabia aonde Katherine pretendia chegar, mas estava gostando do que ouvia. Então
vamos elaborar uma hipótese, falou Katherine, descartando o grão de areia. E se
eu dissesse a você que um pensamento,
qualquer ideia minúscula que se forme na sua mente, possui uma massa? E se eu lhe dissesse que
um pensamento é uma coisa de
verdade, uma entidade mensurável, com uma massa mensurável? Minúscula, é claro,
mas ainda assim uma
massa. Quais seriam as implicações disso?
Hipoteticamente
falando? Bem, as implicações óbvias seriam: se um pensamento tem massa, então
ele exerce uma força de gravidade e pode atrair coisas para si. Katherine
sorriu. Você é boa. Agora avance mais um passo. O que acontece se muitas
pessoas começam a se concentrar no mesmo
pensamento? Todas as ocorrências desse mesmo pensamento passam a se
consolidar em uma só, e a massa acumulada dele começa a aumentar. Portanto, sua
gravidade aumenta. Certo. O que significa que... se um número suficiente de
pessoas começar a pensar a mesma coisa, então a força gravitacional dessa ideia
se torna tangível e exerce uma força de verdade. Katherine deu uma piscadela. E
ela pode ter um efeito mensurável no nosso mundo físico». In
Dan
Brown, O Símbolo Perdido, 2009, Bertrand Editora, 2009, ISBN 978-972-252-014-0.
Cortesia de BertrandE/JDACT