quinta-feira, 30 de novembro de 2023

Dan Brown. O Símbolo Perdido. «O prédio tinha até a sua própria virgem vestal: um funcionário público federal chamado guardião da cripta, que conseguiu manter a chama acesa por 50 anos, até a política, a religião e os danos causados pela fumaça apagarem a ideia»

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«Os olhos de Sato se estreitaram. Estamos na Rotunda do Capitólio dos Estados Unidos, professor, não em um altar sagrado dedicado a antigos segredos místicos.  Na verdade, minha senhora, disse Langdon, conheço um grande número de historiadores que iriam discordar.

Nesse mesmo instante, do outro lado da cidade, Trish Dunne estava sentada dentro do Cubo diante do brilho do telão de plasma. Terminou de preparar  seu spider de busca e digitou as cinco expressões-chave que Katherine havia lhe passado. Isso não vai dar em nada. Sentindo-se pouco optimista, ela accionou o spider, dando início por toda a rede. A uma velocidade estonteante, as expressões passaram a ser comparadas a textos espalhados pelo mundo todo... em busca de uma correspondência perfeita. Era inevitável que Trish se perguntasse qual era o sentido daquilo, mas ela já havia aprendido a aceitar que trabalhar para os Solomon significava nunca conhecer todos os factos.

Robert Langdon lançou um olhar ansioso para o seu relógio de pulso: 19h58. O rosto sorridente de Mickey Mouse não conseguiu alegrá-lo. Preciso encontrar Peter. Estamos perdendo tempo. Sato havia se afastado por alguns instantes para atender um telefonema, mas logo voltou para junto de Langdon. Professor, estou atrapalhando algum compromisso seu? Não, senhora, respondeu Langdon, tornando a cobrir o relógio com a manga do casaco. Só estou muito preocupado com Peter. Entendo, mas eu lhe garanto que o melhor que o senhor pode fazer por ele é me ajudar a entender a maneira de pensar do homem que o sequestrou.

Langdon não tinha tanta certeza disso, mas percebeu que não iria a lugar nenhum antes de a directora do ES conseguir a informação que desejava. Agora há pouco, disse Sato, o senhor sugeriu que a Rotunda é de certa forma sagrada segundo o conceito desses Antigos Mistérios. Isso mesmo, senhora. Explique para mim. Langdon sabia que teria de escolher com parcimónia as palavras. Havia passado semestres inteiros leccionando sobre o simbolismo místico de Washington e, só naquele prédio, a lista de referências místicas era quase interminável. Os Estados Unidos têm um passado oculto.

Sempre que Langdon dava alguma palestra sobre a simbologia dos Estados Unidos, seus alunos ficavam surpresos por descobrir que as verdadeiras intenções dos pais fundadores da nação não tinham absolutamente nada a ver com aquilo que tantos políticos agora afirmavam. O destino que se pretendia dar aos Estados Unidos se perdeu na história. O primeiro nome dado pelos pais fundadores à capital por eles edificada tinha sido Roma. Eles haviam baptizado seu rio de Tibre e construído uma capital clássica de panteões e templos, todos adornados com imagens de grandes deuses e deusas, Apolo, Minerva, Vênus, Hélios, Vulcano, Júpiter. No centro, como em muitas das grandes cidades clássicas, erigiram uma duradoura homenagem aos antigos, o obelisco egípcio. Esse obelisco, mais alto até do que os do Cairo ou de Alexandria, erguia-se 170 metros em direcção ao céu, maior que um prédio de 30 andares, proclamando gratidão e honra ao fundador semidivino ao qual aquela capital devia seu mais novo nome. Washington.

Agora, séculos mais tarde, apesar da separação entre Igreja e Estado no país, aquela Rotunda patrocinada pelo governo estava repleta de simbolismos religiosos antigos. Havia mais de uma dezena de deuses diferentes na Rotunda, mais do que no Panteão original de Roma. O Panteão romano, é claro, fora convertido ao cristianismo em 609... mas este panteão nunca havia sido convertido; vestígios de sua verdadeira história ainda permaneciam claramente visíveis.

Como a senhora deve saber, disse Langdon, esta Rotunda foi projectada como um tributo a um dos santuários místicos mais venerados de Roma. O Templo de Vesta. Das virgens vestais?, Sato parecia duvidar que as virginais guardiãs da chama de Roma tivessem algo a ver com o prédio do Capitólio norte-americano. O Templo de Vesta em Roma, disse Langdon, era circular e tinha um enorme buraco no chão, dentro do qual o fogo sagrado da iluminação era mantido por uma irmandade de virgens cuja tarefa era garantir que a chama jamais se apagasse. Sato deu de ombros. – Esta Rotunda é um círculo, mas não estou vendo nenhum buraco no chão. Não, agora não existe mais, porém durante anos o centro desta sala possuiu uma grande abertura justamente no lugar onde está a mão de Peter. Langdon gesticulou em direcção ao chão. Ainda é possível ver no piso as marcas deixadas pela grade que impedia as pessoas de caírem lá dentro. O quê?,  indagou Sato, examinando o chão. Eu nunca ouvi falar nisso. Parece que ele tem razão. Anderson apontou para o círculo de protuberâncias de ferro que marcava o local das antigas barras da grade. Eu já tinha visto esses negócios antes, mas não fazia a menor ideia do que eram ou para que serviam.

Você não é o único, pensou Langdon, imaginando os milhares de pessoas, incluindo famosos legisladores, que passavam pelo centro da Rotunda todos os dias sem saber que antigamente teriam caído dentro da Cripta do Capitólio, o nível logo abaixo da Rotunda. O buraco no chão, disse-lhes Langdon, acabou sendo coberto, mas, durante um bom tempo, os visitantes da Rotunda puderam ver através dele o fogo que ardia lá em baixo.

Sato se virou. Fogo? No Capitólio? Na verdade, era mais uma tocha grande, uma chama eterna que ardia na cripta logo abaixo de onde estamos. A ideia era que o fogo fosse visível pelo buraco, transformando esta sala em um moderno Templo de Vesta. O prédio tinha até a sua própria virgem vestal: um funcionário público federal chamado guardião da cripta, que conseguiu manter a chama acesa por 50 anos, até a política, a religião e os danos causados pela fumaça apagarem a ideia». In Dan Brown, O Símbolo Perdido, 2009, Bertrand Editora, 2009, ISBN 978-972-252-014-0.

Cortesia de BertrandE/JDACT

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