quarta-feira, 4 de julho de 2012

Como é Bela a Poesia. Florbela Espanca. «A minha Dor é um convento ideal cheio de claustros, sombras, arcarias, aonde a pedra em convulsões sombrias tem linhas dum requinte escultural»


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Torre de névoa
Subi ao alto, à minha Torre esguia,
feita de fumo, névoas e luar,
e pus-me, comovida, a conversar
com os poetas mortos, todo o dia.

Contei-lhes os meus sonhos, a alegria
dos versos que são meus, do meu sonhar,
e todos os poetas, a chorar,
responderam-me então: ‘que fantasia,

criança doida e crente! Nós também
tivemos ilusões, como ninguém,
e tudo nos fugiu, tudo morreu!...’

Calaram-se os poetas, tristemente...
e é desde então que eu choro amargamente
Na minha Torre esguia junto ao céu!...

 
A minha Dor
A minha Dor é um convento ideal
cheio de claustros, sombras, arcarias,
aonde a pedra em convulsões sombrias
tem linhas dum requinte escultural.

Os sinos têm dobres de agonias
ao gemer, comovidos, o seu mal...
E todos têm sons de funeral
Ao bater horas, no correr dos dias...

A minha Dor é um convento. Há lírios
dum roxo macerado de martírios,
tão belos como nunca os viu alguém!

Nesse triste convento aonde eu moro,
noites e dias rezo e grito e choro,
e ninguém ouve... Ninguém vê... Ninguém...

Sonetos de Florbela Espanca, in ‘Sonetos’

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