«Temos ainda de salientar a tendência para um afastamento progressivo
entre os interesses de galegos e de portugueses, que o conde Henrique desde
cedo compreendeu. De facto, quer a oposição entre os barões portucalenses e a
nobreza da Galiza, quer o confronto entre Braga e Santiago de Compostela foram
cavando um fosso entre as duas realidades. Ao longo da biografia que agora se
apresenta, assistimos, pois, a uma muito circunstanciada análise de
acontecimentos que demonstram a permanente afirmação de D. Teresa como uma
personalidade marcante com evidente ambição no seio do Reino de Leão e Castela,
em especial perante sua irmã D.Urraca. A jovem Rainha tem bem presente que a
posição de Afonso Raimundes poderia vir a ser ocupada por seu filho Afonso
Henriques. Daí a persistente defesa de um lugar proeminente na linha de
sucessão de seu pai Afonso VI.
D. Teresa e D. Urraca, ambas eram inteligentes, orgulhosas, empreendedoras,
valentes e astutas, são duas irmãs separadas, que os interesses políticos
afastam, e é muito estimulante a análise psicológica de um permanente jogo de
aproximação e afastamento que acompanha o desenho biográfico que iremos ler. Por
um lado, temos a afirmação do projecto defendido pelo conde Henrique, de
progressiva autonomização dos condados de Portucale e de Coimbra, por outro, D.
Teresa deseja salvaguardar a sua própria posição em concorrência directa com
sua irmã, a Rainha de Leão e Castela. E o certo é que estes dois projectos se
revelam contraditórios, a médio prazo, uma vez que a independência de Portugal
era incompatível com a preservação de um lugar relevante no seio do Reino de
Leão e Castela.
No entanto, D. Teresa alcança algo de único no concerto ibérico,
conseguindo superar desde a morte do marido grandes desafios, graças à sua
capacidade, apenas com a ajuda de nobres, ricos e poderosos, influentes no Condado Portucalense mas com escasso peso
na corte régia de Leão. E só essa determinação é que permite bater o pé ao
prelado de Santiago de Compostela, Diego Gelmírez, apostado em fazer reduzir a
importância de Braga em benefício da sede compostelana. Por outro lado, a Rainha Teresa consegue enfrentar, com
sucesso, os ataques mouros nas terras fronteiriças do Sul e nas proximidades da
linha do Tejo. Apesar de tudo, há vicissitudes como a designação de Paio Mendes
como arcebispo de Braga em 1119, que parecem evidenciar o crescimento do
poder de Urraca nos assuntos portugueses e da prática debilidade da sua irmã
Teresa, na expressão de Torquato Sousa Soares». In Marsilio Cassotti, D. Teresa,
A Primeira Rainha de Portugal, Prefácio de G. Oliveira Martins, Attilio
Locatelli, A Esfera dos Livros, 2008, ISBN 978-989-626-119-1.
Cortesia da Esfera dos Livros/JDACT