«Cristóvão Colombo entra na tradição e história do arquipélago da Madeira
por uma hipotética residência que se tornou lendária, defendida sem base
histórica por cronistas e demais escritores, portugueses e estrangeiros, como Bartolome
de las Casas na sua Historia das Índias, e corroborada
presumivelmente por Diogo Colombo, o filho do descobridor. Hoje, muitos
visitantes deliciam-se ao ver na Madeira a rua ou o sítio da chamada casa do Esmeraldo onde Colombo supostamente
residiu. E a coisa mais venerada de tudo é o marco de uma janela que foi
originalmente a janela principal daquela casa quatrocentista, que foi
cuidadosamente apartada e conservada antes que a casa fosse demolida no século
passado, devido as exigências da viação urbana moderna. Talvez esses mesmos
visitantes ou turistas tenham a boa ou má sorte, depende do ponto de vista, de
ver a igreja na ilha de Porto Santo onde se diz que o filho mais velho de
Colombo foi baptizado, ou quem sabe que outras coisas inventadas através dos
anos. Houve também propostas para construir um museu colombino, mas não posso
imaginar qual será o conteúdo de um tal museu, aparte a chamada janela de Colombo que é talvez o único
padrão que fica a atestar a suposta permanência de Cristóvão Colombo na Ilha da
Madeira.
Antes de mais nada, cumpre-me esclarecer que nada de novo ou sensacional se
vai revelar aqui. Trata-se somente de estabelecer que nunca se encontrou
nenhuma documentação no arquipélago da Madeira que prove que Colombo alguma vez
residisse lá, só, ou com a sua esposa e filho. Isso não quer dizer que Colombo
nunca tivesse estado na Madeira ou que nunca tivesse tido contacto com o
arquipélago. Ao contrário, quero constatar enfaticamente que Colombo sim esteve na Madeira e que sim teve contactos com as ilhas, mas
que a documentação sobre a qual nos baseamos, provem de fontes estrangeiras, e
que a sua estada na Madeira foi só de passagem. A pouca documentação referente
ao período de 1451 a 1492 quer dizer, os anos de sua vida que antecedem o
descobrimento da América, abriu as portas à imaginação criadora de todos os que
se dedicaram ao estudo da temática colombina, sendo as lacunas documentais
preenchidas pela pena e imaginação criadora dos eruditos portugueses. Todavia
existe a romântica lenda que
diz que em noites de lua cheia a
sombra de Colombo vagueia pelas praias de Madeira e desliza sobre as ondas,
curvando-se para colher e examinar despojos que lhe traz o mar.
Como síntese das minhas investigações, entendo poder resumir a três as
épocas em que Colombo esteve em contacto com a Madeira. A primeira vez,
em 1478 ou 79, quando foi à Madeira, incumbido pela Casa Centurione de
Génova de comprar um carregamento de 2400 arrobas de açúcar. A segunda,
desde 1480 ou 81 foi quando casou, talvez a fins de 1479, com a aristocrática D. Felipa Moniz, filha de Bartolomeu
Perestrelo, o primeiro capitão e donatário da ilha de Porto Santo; e a
terceira e a mais curta é aquela em que Cristóvão Colombo é elevado à
categoria de Almirante e vice-rei, e mais uma vez e pela última, transita pela
ilha em 1498.
Quanto aos demais anos que passou em Portugal, não existe documentação credível
em Portugal que possa dizer-nos algo sobre a vida do navegador antes da sua
saída para Espanha em 1485. Colombo
não deixou rasto de si durante os oito ou nove anos que viveu em Portugal.
Talvez o mistério dos seus movimentos durante esses anos em Portugal nunca seja
esclarecido, talvez por causa do grande terramoto
de Lisboa de 1755 que destruísse os documentos notariais ou reais onde
se pudesse encontrar algum vestígio de suas actividades em Portugal antes da
sua saída do país. O que sim e bem documentado é que Colombo se acha ligado à
Madeira por primeira vez, em 1478-79, por comércio de açúcar.
Estes anos são referidos essencialmente como o seu período comercial. Em 1478, Paolo di Negro, um genovês
domiciliado em Lisboa, incumbe o futuro descobridor de ir a Madeira adquirir
para um tal Ludovico Centurione, de Génova, 2400 arrobas de açúcar, como
disse antes. Ludovido Centurione de Génova, expediu a Paolo di Negro,
residente em Lisboa, 1290 ducados com ordem de comprar por sua conta, as 2400
arrobas de açúcar e remetê-las para Génova. Paolo di Negro encarregou esta
operação mercantil a Cristóvão Colombo, domiciliado também em Lisboa. Este
fretou uma embarcação portuguesa e saiu a barra, em Julho de 1478, com rumo à Madeira, mas sem levar
consigo o dinheiro necessário que Paolo di Negro prometera remeter-lhe
para ali. Uma vez na Madeira, adquiriu Colombo uma partida de açúcar a um certo
Erogio Catalao, esperando receber de Lisboa com que paga-la. Mas sucedeu
só ter recebido de di Negro 103 ducados, em várias remessas, o que deu
lugar a não poder carregar a nau senão com uma pequena porção do açúcar por ele
negociada, e que Ludovico Centurione ansiosamente esperava em Génova. Chegando Colombo
àquela cidade com este mísero e insignificante carregamento, era natural que
surgissem protestos; protestos do capitão do navio que pretendia o preço
inteiro do frete como se tivesse carregado toda a mercadoria estipulada, e
protesto vigoroso do nobre Centurione, por ter Colombo trazido diminuta fracção
da mercadoria por ele encomendada e previamente paga». In Rebecca Katz, Christopher Columbus and the Portuguese, 1476-1498, Greenwood Press, USA, 1993, ISBN 0313288674, Cristóvão Colombo na Madeira, Paulo Campos, Arquivo Histórico, Madeira, 2009.
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