Metida no Mosteiro de Santa
Domingo de Toledo
«(…) A delicada mas decidida intervenção da rainha de Aragão conseguiu
desbloquear, em parte, a situação, uma vez que logo desde 21 de Junho começariam
a chegar a Valência alguns dos servidores da falecida rainha, que o regente
Pedro não desejava de maneira nenhuma que regressassem a Portugal com a infanta.
Através de uma carta da rainha datada desse dia sabe-se que a infanta de
Portugal recebera das mãos de um mercador os quinhentos florins das rendas de Alcolea
de Cinca que o tio lhe prometera entregar. É possível que esse mercador fosse
o judeu português Abraão Amigo, antigo administrador dos bens de D.
Leonor, pelo qual a rainha aragonesa se interessaria alguns dias mais tarde, tal
como se demonstra na missiva que escreve ao sobrinho, o príncipe Enrique para
lhe pedir que intervenha por causa dos
muitos serviços por ele prestados à rainha de Portugal, de boa memória, nossa
cara e muito amada irmã [política].
Enquanto esperava resposta às suas pesquisas castelhanas pela sobrinha
Joana, antes do final da primeira semana de Outubro de 1445 a rainha María
de Aragão escreveu ao seu embaixador em Inglaterra para o informar do
matrimónio acordado pelo rei de Castela com uma filha do infante João, donzela muito sábia e de grande fama.
Esta carta provava que Álvaro Luna e o regente tinham chegado a um princípio de
acordo sobre tal união dinástica. Embora o noivo ainda não estivesse totalmente
convencido, isso permitiria à tia de Joana ter a confirmação sobre o paradeiro
da infanta. Cinco dias depois, a 11 de Outubro de 1445, em Valência, María
de Aragão mandou redigir um extenso memorando, destinado ao embaixador
aragonês em Castela, no qual lhe dava instruções para que comunicasse ao seu
irmão, o monarca castelhano, que constatara que a infanta de Portugal fora metida no mosteiro de Santo Domingo el Real
de Toledo (...), destituída de todos os seus servidores e só, com grande
miséria e sem lhe dar coisa alguma para viver. Por tudo isso, Dona María pedia
ao embaixador que suplicasse ao rei de Castela para que se ocupasse de
satisfazer as necessidades da infanta, como satisfizera as da sua mãe, porque deixando-a em tanta miséria, não seria honra
do dito rei.
Nesse documento, D. María de Aragão também pedia ao seu representante
diplomático que ponderasse perante o rei a situação dos cavaleiros, gentis-homens
e damas que tinham feito parte da corte da falecida rainha D. Leonor antes que
fossem privados das possessões que lhes tinham sido atribuídas em Toledo,
encontrando-se em tal pobreza que carecem de meios inclusivamente para deixar a
cidade. A rainha de Aragão
manifestava-se muito admirada, de se
tratarem assim cortesãos por se manterem fiéis a uma rainha que mulher era do seu rei que foi e mãe do
seu rei e senhor que é. E parecia-lhe uma
grande desumanidade expor e desterrar damas e donzelas que não podem ir
deambulando pelo mundo sem ir provocando a infâmia de quem as fizera ir. Portanto,
dado que ela desejava o repouso de Espanha
e não queria que tantas vozes suplicassem perante o rei seu marido, pedia
ao irmão que interviesse perante o regente de Portugal, com a maior afeição, para que os acolhesse a todos. Entretanto,
solicitava ao rei de Castela que não permitisse que esses servidores passassem
necessidades e que lhes fossem devolvidas as suas pousadas, porque, encontrando-se no seu reino, mesmo
que fossem infiéis, encontrando-se em tal pobreza, seria obrigado a socorrê-los.
Por fim, D. María encarregava o seu embaixador de falar com a prioresa do
mosteiro de Santo Domingo, onde está,
presentemente, a infanta dona Joana, e lhe pedisse que, da sua parte,
tratasse a dita infanta com a honra e a reverência
que lhe pertence». In A Rainha Adúltera, Joana de Portugal e o
Enigma da Excelente Senhora, Crónica de uma difamação anunciada, Marsilio
Cassotti, A Esfera dos Livros, Lisboa, 2012, ISBN 978-989-626-405-5.
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