Pitágoras nos jardins da Babilónia
«Tenta-se o filósofo ao jogo,
no terraço de begónias:
como as palavras serão deuses?
Sofia amigo razão fábula erro música luz
amigo razão fábula erro música luz
amigo razão erro música luz
amigo razão música luz.
A tarde fecha-se num eclipse sem surpresa.
O filósofo está exausto.
Jamais o jogo terá fim,
jamais as palavras sairão do caos
para a harmonia. Das Palavras
apenas fará palavras
com duplos triplos sentidos
infinitos sentidos. Assim:
amigo 1 amigo 2 amigo 3 amigo 4
razão 1 razão 2 razão 3 razão 4
música 1 música 2 música 3 música 4
luz 1 luz 2 luz 3 luz 4.
De súbito, o deserto incendeia-se:
palavras, palavras, campos fechados
expostos à radiação apenas do número
10.
Eis o acorde perfeito, a harmonia,
o princípio de todas as coisas,
a chave do Universo.
Finalmente, as palavras
caminham em busca do equilíbrio:
energia, inteligência, amor.
Pitágoras invoca os céus de Babilónia.
Ó número divino que engendraste
os deuses e os homens, bendito sejas!»
Schopenhauer. Invectiva Platão
«Ei-lo, o tempo, ó velho sonhador,
o círculo, a roda eterna do suplício sem termo.
Opaco como um falso sol,
ele gira, perpetuamente, em torno de si mesmo.
Ixíon é o homem condenado
à repetição infinita da vida.
Ei-lo, o tempo, ó velho grego,
a água que as Danaides
despejam no tonel sem fundo,
circuito perene.
Ei-lo: pedra de Sísifo, sede de Tântalo,
movimento oco, gesto vazio.
Eis o tempo nu, sem artifício, senhor do tédio.
Ó velho sábio ingénuo,
porque lhe chamaste
entrega insaciável a paixões insatisfeitas?
O tempo é o eco,
o nenhum futuro,
apenas monotonia sem fim.
Nada é novo, tudo recomeça igual,
eadem sed aliter».
Poemas de Orlando Neves, in ‘As Máscaras’
In Orlando Neves, Máscaras, edições Sol XXI, Tipografia Voz de Lamego,
1997, ISBN 972-8183-52-6.
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