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E foi assim que o infante Henrique, intrépido e ávido de ganhar naquele dia as
suas esporas de cavaleiro, avançou em direcção ao castelo. Baixou a viseira do
seu bacinete, embraçou o escudo que trazia e pôs em fuga um grupo de mouros que
perseguia as centenas de cristãos que tinham logrado forçar a entrada pela
Almira. Na rua Direita, encontrou uma porta reforçada por uma barbacã, o que
lhe deu um bom pretexto para testar a fortaleza dos seus membros grossos e
viris, no auge das suas vinte e uma primaveras. A investida foi tal que os
inimigos se tiveram de abrigar na junção de três muros, desencadeando a partir
daí um contra-ataque apoiado. Nessa altura, Henrique já só podia contar com a
ajuda de 17 homens da sua coluna de ataque, pois a sede, o cansaço e a ganância
do saque tinham deixado os restantes para trás. Ainda assim, aguentou ali,
estoicamente, durante duas horas e meia.
Isso
não foi, porém, suficiente para saciar o desejo de glória do infante: repelidos
os adversários, decidiu avançar com apenas quatro companheiros, Álvaro
Fernandes Mascarenhas, Vasco Esteves Godinho, Gomes Dias Góis, todos eles
servidores da sua Casa, e Fernão Álvares, um escudeiro do rei que queria muito
bem a Henrique e que tinha vontade de se colocar ao seu serviço. Mas ai onde
eles se foram meter! Entre uma porta colocada junto à robusta muralha coroada
por duas filas de ameias e uma torre de estrutura abobadada munida de aberturas
para o despejo de pedregulhos e de líquidos incendiários pelos sitiados, saía
um caminho estreito que partia de uma segunda entrada e que conduzia os
assaltantes entre o muro e a barbacã, até se chegar a uma terceira porta. A concentração
de guerreiros era ali de tal ordem que os de dentro receavam lançar pedras
sobre os cristãos, com medo de acertarem nos seus próprios homens…
Juntos
à terceira porta, o combate tornou-se especialmente rijo, com os mouros a
meterem as suas azagaias, lanças curtas, rente ao solo, de maneira a ferirem as
pernas dos nossos combatentes. A situação tornou-se desesperada e quem se
apercebeu do perigo deu logo o infante morto. A notícia correu célere e chegou
aos ouvidos de João I, que reagiu de coração apertado à ideia da perda, sem
contudo deixar de salientar que o mais importante era que ele tinha morrido
honradamente, no cumprimento do seu ofício de homem de armas…» In
João Gouveia Monteiro e António Martins Costa, 1415, A Conquista de Ceuta,
Manuscrito, 2015, ISBN 978-989-881-804-1.
Cortesia
de Manuscrito/JDACT