sábado, 19 de março de 2016

Amantes dos Reis de Portugal. Paula Lourenço (coord), Ana C. Pereira e Joana Troni. «Uma das questões que mais tem apaixonado historiadores e leigos é a Batalha de S. Mamede em Junho de 1128 e a revolta de Afonso Henriques contra sua mãe»

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«(…) Esta situação de convivência e intimidade sexual com Bermudo Peres antes de casar com o irmão dele era, à luz do direito canónico, um grave crime de incesto, agravado mais tarde quando Bermudo Peres Trava casou, cerca de 1121, com a infanta dona Urraca Henriques, filha de dona Teresa e irmã de Afonso Henriques. Tanto o temperamento como a acção política da filha de Afonso VI tornam-se difíceis de avaliar na medida em que a sua figura foi detractada nas fontes e na historiografia. Certo é que almejava algum protagonismo de poder, intitulando-se rainha desde 1117 e reclamando a sua herança paternal. Ambição que, tudo leva a crer terá moldado o carácter do próprio filho.

Afonso Henriques, um rei entre a guerra e o amor
Afonso de nome, tal como seu avô, o Imperador, o primogénito, que cedo ficou sem pai, foi educado com a bem conhecida família de Egas Moniz. O caminho que dona Teresa trilhava acompanhada, sobretudo, por Fernão Peres Trava conduziu, a partir de 1121-1122, ao afastamento de alguns nobres que, desde o tempo do conde Henrique, eram índice de autoridade e de respeito não só na corte, como também em todo o condado. Com efeito, eram homens de carisma militar, governadores de terra e dignitários da corte, e será esta hostilização da nobreza portuguesa a causa da oposição e revolta contra dona Teresa. O episódio do cerco de Guimarães, em 1127, marcou o início do protagonismo do infante, que fora armado cavaleiro em Zamora dois anos antes, na cena política do condado, alicerçando o acordo entre Afonso Henriques e os nobres da corte de seu pai, do Norte de Portugal. Afonso Henriques assumia a autoridade do comando político-militar a norte do Douro e sua mãe, dona Teresa, as terras de Entre Douro e Minho. Uma das questões que mais tem apaixonado historiadores e leigos é a Batalha de S. Mamede em Junho de 1128 e a revolta de Afonso Henriques contra sua mãe. Por muitos considerado como o início da história do futuro reino de Portugal, este episódio ditou o afastamento de dona Teresa e do conde Fernão Peres Trava, que se viram obrigados a abandonar o condado. Diz a tradição que Afonso Henriques prendeu sua mãe, colocando-a em ferros, mas sabe-se que partiram para a Galiza acompanhados das suas duas filhas, Sancha e Teresa Fernandes, acabando dona Teresa por vir a falecer pouco tempo depois, a 1 de Novembro de 1130.
A partir da Batalha de S. Mamede e até ao momento em que foi aclamado rei, Afonso Henriques governou o condado portucalense na dignidade de príncipe. Por ser uma personagem tão carregada de sentido e envolta em narrativas míticas, recorrendo aqui às palavras da mais recente obra sobre este monarca, o nosso primeiro rei encontra-se envolto em lendas e histórias que o relacionam com a fundação da monarquia e do reino. De facto, a tradição cronística e histórica, de Rui de Pina e Duarte Galvão, entre outros, atribui a estes acontecimentos uma forte carga sagrada, com relatos frequentes de aparições de Jesus Cristo e de Maria a alguns dos principais protagonistas destes anos. Desde a cura milagrosa de uma deformação física com que o infante nascera ao milagre de Ourique, vários são os exemplos que poderíamos elencar. Um dos aspectos mais marcantes do reinado de Afonso Henriques, como o será ainda para alguns dos seus sucessores, foi a guerra contra os mouros. Tratou-se de uma importante época para a definição territorial do reino, e de que a Batalha de Ourique será o ex-líbris. A este episódio, cujos pormenores ainda estão por precisar, tal como o local onde se deu a batalha, está associada a aclamação de Afonso Henriques como rei de Portugal.
Uma vez aclamado rei, impunha-se garantir a sucessão. Neste contexto, João Peculiar, arcebispo eleito de Braga e principal conselheiro de Afonso Henriques, desempenhou um papel relevante. Não só participou em negociações e acordos fundamentais para o governo, dos quais se destaca a viagem até Roma, em 1144, para persuadir o papa a reconhecer o título de rei, como parece ter sido o responsável pelo pedido da mão de dona Mafalda, ou dona Matilde, ao conde de Maurienne para casar com o monarca português. Tomou parte, de igual modo, nos acordos com o rei Fernando II de Leão para o matrimónio com a infanta dona Urraca em 1165». In Paula Lourenço (coord), Ana Cristina Pereira, Joana Troni, Amantes dos Reis de Portugal, 2008, Esfera dos Livros, Lisboa, 2011, ISBN 978-989-626-136-8.

Cortesia ELivros/JDACT