«(…) Rodrigo Lobo Silveira terá nascido nos últimos anos do
século XVI. Filho de Luís Lobo Silveira, 5 .° senhor de Sarzedas e dos direitos
reais de Sobreira Formosa, comendador de Santa Olalha, etc. e de sua mulher
dona Joana Lima. Feito conde de Sarzedas por carta de Filipe III de 31 de
Outubro de 1630, casou com dona Maria Antónia Vasconcelos, filha dos 4 .°s
condes de Linhares. Tomou parte na expedição de reconquista da Baía em 1625 e,
em 1637, foi nomeado governador de Tânger, cargo em que se manteve até 1643, ou
mesmo 1644. Como anotaria seu filho Manuel Lobo Silveira nos apontamentos que
precedem o diário, foi o unico sogeito portuguez que quando o aclamarão D.
João IV lhe não entregou o que governava, e depois de aclamado governou meo Pay
que Deos tem Tamgere quatro annos, por ordem dei Rey de Castella, the que o
prendeo a gente da cidade, e a entregou a el Rey Dom João, que lhe foi muito
affecto. Aliás, em resultado da residência que lhe foi tirada após o desempenho
em Tânger, o rei agradecer-lhe-á tudo quanto realizara ali, apontando-o como
hum dos melhores capitaens que entrarão naquela praça. Ao enaltecer o seu
procedimento, afirma que este bem poderia servir de regimento para os
capitaens futuros. E enumera o merecimento de alguns dos seus actos:
particular zelo pela honra das mulheres, dispêndio de recursos pessoais com
soldados e com a assistência às viúvas e meninas.
A
confiança que o monarca João IV nele depositava levá-lo-á a nomeá-lo Governador
do Reino quando, em Salvaterra de Magos, foi acometido de mal da dor da pedra.
Mas desempenharia ainda outros importantes cargos antes da sua partida para a
Índia. Membro do Conselho de Guerra, seria também presidente do Senado de
Lisboa, pelo menos desde 1653, funções que desempenhava quando foi nomeado vice-rei
do Estado da Índia, em 1655. Refere o filho nos apontamentos já citados que, a
quando da sua nomeação para a Índia, o rei lhe ordenara que pedisse o que quisesse
para acrescentamento de sua casa. Mas Rodrigo Silveira ter-lhe-á respondido
que o servia pella obrigação que tinha de vassallo, e não por interesse,
declinando qualquer recompensa.
Acompanhemos
a frota que largou de Lisboa em 1655 e, de um modo muito particular, a nau Bom
Jesus da Vidigueira que conduziu o conde de Sarzedas. Na manhã de 23 de
Março saía barra fora a armada destinada à Índia, acompanhada de mais de uma
dezena de embarcações que seguiam para as Ilhas, Angola e Brasil. A necessidade
de aguardar por despachos que o rei estava a ultimar obrigou-a a andar às
voltas, defronte de Cascais, durante todo o dia, aonde dera fundo o patacho Santa
Teresa que os iria receber. Mas também as instruções régias particulares para
cada um dos capitães da conserva, para que nunca se apartassem, as especiais
recomendações do vice-rei sobre procedimentos a ter no eventual encontro com
inimigos, juntamente com a informação sobre o nome dos santos, código
identificativo na aproximação, deveriam ser entregues aos capitães se o piloto
da barra as não deixasse cair ao mar quando se aproximou da almiranta. O vento
norte rijo que se fazia sentir, não só provocou este acidente, depois remediado
pelo vice-rei e impediu que o patacho se mantivesse no seu posto, como obrigou na
manhã seguinte a que toda a frota lentamente fosse navegando rumo à Madeira,
continuando a aguardar a correspondência que um navio aviso de Cascais lhe
faria chegar, o que parece não ter acontecido.
A
28, ao aproximar-se da Madeira, aproveitou a ocasião para remeter notícias ao
rei por um dos navios que para ali se destinava e que o governador madeirense
deveria fazer rapidamente chegar ao destino por urna caravela. Dois dias depois
passaram as Canárias e, a 2 e 5 de Abril, separaram-se da armada as charruas
destinadas a Cabo Verde e Angola, levando cada uma delas vias de nova
correspondência para o rei e secretário de estado Pedro Vieira da Silva.
Experimentaram alguma calmaria a 21 de Abril e, sobretudo, quando passaram o
Equador nos últimos dias do mês. A 7 de Maio, encontrando-se a 9,25°, dão conta
que haviam dobrado o cabo de Santo Agostinho (que fica a 8,5°), assegurando-se
que já não poderiam arribar a Portugal. Rumando ao Cabo, a 18 de Junho avistam
as mangas de veludo e outros pássaros, sinais da aproximação da Boa Esperança,
cabo que, no dia seguinte, pela altura da água e qualidade do fundo concluem
ter já vencido». In Artur Teodoro Matos, Diário do conde de Sarzedas, Vice-rei do
Estado da Índia (1655 -1656), Lisboa, colecção Outras Margens, CNCDPortugueses,
2001, ISBN 972-787-052-X.
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