domingo, 1 de outubro de 2017

A Pedra da Luz. Christian Jacq. « O que fazes tu aqui, amigo? Méhi voltou-se sem pressa e descobriu um polícia núbio armado com um cacete e um punhal. Eu..., eu perdi-me»

Cortesia de wikipedia e jdact

Néfer. O Silencioso
«(…) À força de se ocultar nas colinas que dominavam a aldeia interdita, Méhi esperara surpreender os rituais de que ninguém falava; a decepção tinha sido à medida dos esforços realizados. Mas naquela noite, finalmente, o tão esperado acontecimento! Os dez homens, um atrás do outro, subiram ao topo da colina de oeste e avançaram lentamente ao longo da falésia até à garganta onde tinham sido construídas as cabanas de pedra que ocupavam em certas épocas do ano. Dali, bastava-lhes seguir por um caminho que descia para o Vale dos Reis. No auge da excitação, o tenente de transportes teve o cuidado de não fazer rolar cascalho, traindo assim a sua presença. Embora conhecesse a localização dos postos de observação ocupados por polícias encarregados de garantir a segurança do vale interdito, Méhi arriscava a vida. Armados com um arco, os cérberos tinham ordem para atirar à vista e sem intimação. À entrada daquele lugar, entre todos sagrado, onde, desde o início do Novo Império, repousavam as múmias dos faraós, os guardas afastaram-se para deixar passar os dez Servidores do Lugar de Verdade. Com o coração a bater, Méhi trepou uma encosta íngreme de onde podia ver sem ser visto. Deitado sobre uma rocha lisa, não perdeu migalha do incrível espectáculo. O chefe de equipa separou-se do grupo e poisou no chão, em frente da entrada do túmulo de Ramsés, o Grande, o fardo que transportara desde a saída da aldeia e depois retirou o véu branco que o cobria. Uma pedra.
Uma simples pedra talhada em forma de cubo. Dela brotou uma luz tão forte que iluminou o pórtico monumental da Morada de Eternidade do faraó reinante. O Sol brilhou na noite, as trevas foram abolidas. Os dez artesãos veneraram longamente a pedra e depois o chefe de equipa levantou-a, enquanto dois dos seus subordinados abriam a porta do túmulo. Entrou primeiro, seguido pelos outros artesãos e o cortejo mergulhou nas profundezas, iluminado pela pedra. Méhi permaneceu tetanizado vários minutos. Não, não tinha sonhado! A confraria possuía realmente tesouros fabulosos, conhecia o segredo da luz, ele vira a pedra de onde ela provinha, uma pedra que não era ilusão nem lenda! Seres humanos e não deuses tinham sido capazes de a talhar e sabiam utilizá-la... E que era feito dos montões de ouro que produziam nos seus laboratórios, segundo os rumores que corriam com persistência? Abriam-se diante do tenente de transportes horizontes insuspeitados. Agora sabia que a origem da prodigiosa fortuna de Ramsés o Grande se encontrava ali, no Lugar de Verdade. Por isso a confraria vivia isolada do mundo, oculta por trás dos muros da sua aldeia.
O que fazes tu aqui, amigo? Méhi voltou-se sem pressa e descobriu um polícia núbio armado com um cacete e um punhal. Eu..., eu perdi-me. Esta zona é interdita, declarou o polícia negro. Qual é o teu nome? Pertenço à guarda pessoal do rei e estou em missão especial, afirmou Méhi com convicção. Não fui prevenido. É normal... Ninguém devia ser informado. Porquê? Porque devo verificar se as normas de segurança são aplicadas com o rigor necessário e se nenhum intruso se pode introduzir no Vale dos Reis. As minhas felicitações, polícia. Acabas de provar-me que o dispositivo montado é eficaz. O núbio estava perplexo. Mesmo assim, o chefe devia ter-me prevenido. Não compreendes que era impossível? Vamos juntos ter com o chefe. Não tenho o direito de te deixar ir embora assim. Fazes o teu trabalho na perfeição. Sob a Luz da lua cheia, o sorriso conciliador de Méhi deu confiança ao núbio, que enfiou o cacete no cinto. Rápido como uma víbora da areia, o tenente de transportes mergulhou com a cabeça para a frente e embateu no polícia em pleno peito. O infeliz oscilou para trás e caiu pela encosta até uma plataforma sobre o Vale. Com risco de quebrar o pescoço, Méhi juntou-se-lhe e constatou que, apesar de uma ferida profunda na têmpora, o polícia ainda estava vivo. Sem prestar atenção ao olhar suplicante da sua vítima, acabou com ele com uma pedra pontiaguda, esmagando-lhe o crânio.
Com o coração frio, o assassino esperou um longo momento. Quando teve a certeza de não ter sido detectado, Méhi tornou a subir ao cimo da colina, tendo o cuidado de se segurar bem. Redobrando de precauções, afastou-se do local interdito. Graças àquela noite maravilhosa, só tinha uma ideia na cabeça: decifrar o mistério do Lugar de Verdade. Mas, como o conseguir? Visto que não podia entrar na aldeia, precisava de descobrir o meio de obter informações fiáveis. E o assassino entreviu um esplêndido futuro: os segredos e as riquezas da confraria pertencer-lhe-iam, a ele e só a ele!» In Christian Jacq, A Pedra da Luz, Néfer. O Silencioso, Bertrand Editora, 2000, ISBN 978-972-251-135-3.
                                     
Cortesia de BertrandE/JDACT