terça-feira, 30 de outubro de 2018

O Juiz do Egipto. A Pirâmide Assassinada. Christian Jacq. « Quem sabe se aquele subterrâneo não os desviaria do seu objectivo? Circulavam mapas falsos a fim de enganar eventuais ladrões, seria aquele que possuíam o correcto?

jdact e cortesia de wikipedia

«(…) Dobrados em dois, batendo muitas vezes com a cabeça no tecto de calcário, encetaram uma marcha forçada através da passagem estreita, em direcção à parte subterrânea da grande pirâmide. Iam calados, à memória vinha-lhes aquela fábula sinistra segundo a qual um espírito partia o pescoço a quem tentasse violar o túmulo de Quéops. Quem sabe se aquele subterrâneo não os desviaria do seu objectivo? Circulavam mapas falsos a fim de enganar eventuais ladrões, seria aquele que possuíam o correcto? Chocaram com uma parede de pedra que atacaram com cinzéis, por sorte, os blocos, pouco pesados, giraram sobre si mesmos. Os conjurados penetraram numa grande câmara de terra batida, com três metros e cinquenta de altura por catorze de comprimento e oito de largura. No centro, havia um poço. A câmara baixa... Estamos na grande pirâmide! Tinham conseguido.
O corredor, esquecido há tantas gerações, conduzia da esfinge ao gigantesco monumento de Quéops cuja primeira sala se situava trinta metros abaixo da base. Aqui, nesta matriz, evocação do seio da terra-mãe, tinham sido praticados os primeiros ritos de ressurreição. Agora, tinham de descer por um poço que conduzia ao interior da massa rochosa e desembocava no corredor que começava do outro lado das três buchas de granito. O mais ágil trepou agarrando-se às saliências da rocha e apoiando-se com os pés, quando chegou lá acima, atirou a corda que levava amarrada à cintura. Um dos conjurados quase desmaiou com falta de ar, os companheiros levaram-no até à grande galeria, onde se recompôs. A imponência do local deixou-os fascinados. Que mestre de obras teria sido tão louco a ponto de construir tal dispositivo constituído por sete socalcos de pedra? Com quarenta e sete metros de comprimento e oito e meio de altura, a grande galeria, obra única pelas suas dimensões e localização mesmo no coração da pirâmide, desafiava o tempo. Os mestres de obras de Ramsés haviam afirmado que jamais arquiteto algum realizaria proeza semelhante. Um dos conjurados, intimidado, pensou em desistir, o chefe da expedição obrigou-o a continuar empurrando-o violentamente para a frente. Desistir tão perto do fim teria sido estúpido, até agora, podiam felicitar-se pelo rigor do plano traçado. Contudo, uma dúvida permanecia: teriam as grades de pedra, colocadas entre a extremidade superior da grande galeria e o início do corredor de acesso à câmara do rei, sido baixadas? Se assim não fosse, não conseguiriam contornar o obstáculo e teriam de regressar derrotados. O caminho está livre.
Ameaçadoras, as cavidades destinadas aos enormes blocos estavam vazias. Os cinco conjurados tiveram de se curvar para conseguirem entrar na câmara do rei, cujo tecto era formado por nove blocos de granito de quatrocentas toneladas cada um. Com seis metros de altura, a sala protegia o coração do império. O sarcófago do faraó repousava num chão de prata que mantinha a pureza do local. Hesitaram. Até agora, haviam-se comportado como exploradores em busca de um país desconhecido. É certo que tinham cometido três crimes e teriam de responder por eles perante o tribunal do outro mundo, mas não tinham eles agido para o bem do país e do povo ao prepararem o destronamento de um tirano? Se abrissem o sarcófago, se o despojassem dos seus tesouros, estariam a violar a eternidade, não a de um homem mumificado, mas a de um deus presente no seu corpo de luz. Cortariam o último laço com uma civilização milenar com o objectivo de fazer surgir um novo mundo que Ramsés jamais aceitaria. Tinham vontade de fugir embora experimentassem uma sensação de bem-estar. O ar chegava-lhes por dois canais escavados nas paredes norte e sul da pirâmide. Uma estranha energia emanava do lajedo insuflando-lhes uma força desconhecida. Então era assim que o faraó se regenerava, absorvendo a força nascida da pedra e da forma do edifício! O tempo esgota-se». In Christian Jacq, O Juiz do Egipto, A Pirâmide Assassinada, 1993, Bertrand Editora, 1996, ISBN 978-972-250-835-3.

Cortesia de BertrandE/JDACT