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A
Mulher que Amou Jesus
«(…) Na realidade, parecia
bastante contente e a sua atitude mudou de desconfiança para alegria, à medida
que continuavam a caminhada à beira do lago. Vários barcos de pesca dirigiam-se
para um pequeno cais de águas quentes, que era chamado de Sete Fontes. Os
pescadores das cidades de Cafarnaum e Betsaida gostavam dali, pois a água
quente atraía certos tipos de peixe; devido a isso, o cais ficava repleto de
pequenos barcos, todos querendo descarregar o peixe ao mesmo tempo. O cais
estava alvoraçado, numa atmosfera de alegria. Os pescadores são pessoas
interessantes, disse Joel. Têm características tão contraditórias, uma reputação
de devoção, embora lidem com coisas bem materiais. Trabalham de noite, remendam
as redes... As suas vidas são exactamente o contrário da vida dos escribas
religiosos. Talvez por isso é que a sua religiosidade seja suspeita, disse
Maria, pelo menos para os rabinos de Jerusalém. Afinal, como poderia um pescador
manter a sua pureza ritual? Tem de lidar com peixe sujo todos os dias, quando
descarrega as redes. Entretanto, num caso de necessidade, você preferiria poder
contar com um pescador ou com um escriba de Jerusalém? Joel ria. Veja o caso de
Zebedeu, acenou para um homem forte, de rosto vermelho, que acenou de volta,
embora provavelmente nem tivesse reconhecido Joel àquela distância. Sozinho no
barco, ainda assim trouxe uma boa pescaria no meio de um temporal. Tem vários
barcos, um autêntico empreendimento. Seus filhos trabalham com ele e também contratou
pescadores. Aproximaram-se do cais, onde reinava a confusão com a chegada do peixe.
Atenção!, berrou uma voz forte. Fique
longe dessa cesta! Passavam ao lado de uma cesta enorme, de onde escorria uma água
suja. Os peixes faziam a cesta tremer. Desculpe, Simão, disse Joel, dando um
passo para trás. Trabalhei três horas para separar esse peixe, disse Simão, um gigante
que estava de pé, junto à cesta, de braços cruzados. Parecia ameaçador. Depois
deu uma gargalhada. Eu seria o último a prejudicar o seu trabalho, disse Joel.
Por um instante, hesitou. Maria sentia que estava pensando. Simão, você conhece
os filhos de Natã, Samuel e Eli. Esta é a irmã deles, Maria. Simão olhou-a
atentamente. Tinha olhos enormes, que pareciam perfurá-la. Sim, já a vi no
armazém. Acenou com a cabeça, energicamente. Maria concordou em ser minha
mulher, disse Joel. E olhou para ela, orgulhoso.
O rosto de Simão iluminou-se com
um sorriso enorme. Você é um homem abençoado! Os meus parabéns! Piscou o olho,
brincando: quer dizer que é você que eu terei de procurar no futuro? Joel ficou
sem jeito. Não, claro que não. Quem continua mandando é Natã. Ele não é velho. Isso
é o que meu pai diz dele mesmo, disse Simão. Mas o André e eu percebemos que
ele está querendo passar o trabalho pesado para nós. Apontou com o dedo outro
rapaz, sozinho, no cais. Tinha cabelo encaracolado, escuro, mas não se parecia
em nada com a exuberância de seu irmão. Era mais magro e mais baixo. E desde
que casei, continuou Simão, sinto-me cada vez mais respeitável. Você casou?,
disse Joel. Não sabia. Então você também merece parabéns. Simão sorriu. É,
levou algum tempo para me acostumar. Agora, tenho uma sogra, o que é bastante
diferente de uma mãe, é bom que lhe diga. Coçou a cabeça. Certa vez, uma pessoa
disse-me: se você quiser saber como vai ser uma moça em 20 anos, olhe para a mãe
dela. Bom, não é verdade. Ou, se for, Deus que me ajude! Aproximava-se o barco
de Zebedeu, seguido por outro, com dois rapazes, um de rosto largo e cabelo
claro e o outro mais magro, alourado. Ei, você aí!, gritou Zebedeu para ninguém
especificamente. Jogue a corda! Um garoto meio assustado, que estava no cais,
apressou-se em obedecer. Atrás de Zebedeu, o outro barco atracou. Antes que
desembarcassem e pudessem começar uma conversa, Joel olhou para o céu. Já passa
de meio-dia, disse. É hora de voltar. Acenou para os pescadores e dirigiu-se à
cidade.
Maria também queria voltar para
casa. Queria ficar sozinha e meditar sobre o que se passara. Tinha concordado
em casar com aquele homem. Tinham discutido o assunto, e concordado. Parecia tão
estranho, tão irreal. Queria ficar a sós e reflectir. Mas sentia-se bem,
caminhando ao lado dele, ouvindo as suas opiniões sobre os pescadores e os seus
desejos de viajar e de ajudar as pessoas. Eram coisas agradáveis, que a
reconfortavam. Deve ser a coisa certa, pensou. Tem de ser. Cresceremos juntos,
ao longo dos anos, pois já parecemos pensar da mesma maneira sobre o que
queremos». In Margaret George, A Paixão de Maria Madalena, 2002, Saída de Emergência,
Edições Fio de Navalha, 2005, ISBN 972-883-911-1.
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