Cortesia
de wikipedia e jdact
Sancho
II de Portugal. Um Conspecto Historiográfico
Com
a devida vénia ao Doutor José Varandas
Fr.
António Brandão (1632). Quarta
parte da Monarchia Lusitana que conthem a Historia do reyno de Portugal, desde
o tempo delRey D. Sancho I, até o reynado delRey D. Affonso III. Lisboa,
ed. por Pedro Crasbeek, 1632
«(…)
Um dos problemas que o conde de Bolonha teria de enfrentar ao desembarcar em
Portugal,
além da hoste de guerra do seu irmão, seria o da aceitação da sua autoridade no
reino. Fr. António Brandão acompanha algumas das narrativas e delas retira a
ideia de que um conjunto apreciável de terras e lugares do reino se opôs à
entrada de dom Afonso, como curador da terra portuguesa. Desses exemplos de
lealdade põe em destaque a resistência de vilas como Óbidos, Celorico e
Coimbra, respeitando desta forma o quadro da tradição cronística que refere
para esses locais, em especial para os dois últimos, momentos épicos de
resistência ao vitorioso exército de Afonso, conde de Bolonha. Não deixa, no
entanto, de referir, por comparação aqueles que muito cedo traíram o rei
legítimo, como as acções vis dos familiares de Soeiro Bezerra ou a traição do
alcaide de Leiria, e cuja descrição encontrou no Nobiliário do conde Pedro Barcelos. Outro aspecto, a
que recorrentemente, a historiografia portuguesa volta, quando aborda o reinado
de Sancho II, é o que diz respeito às notícias de agravos e desmandos que o rei
de Portugal, por intermédio dos seus oficiais e validos, fazia às liberdades eclesiásticas.
Como muitas outras, também estas informações já encontram lugar na narrativa de
António Brandão. Contudo, a sua perspectiva volta-se para o facto de os desmandos
de que a Igreja se queixava serem perpetrados por elementos ligados à coroa, mas
sem conhecimento ou autorização do rei. As reacções da hierarquia eclesiástica
são abordadas e indicadas as várias bulas papais com que o clero admoestava o
rei português, procurando com isso levá-lo a tomar uma atitude mais firme sobre
os seus homens.
Responde o monge de Cister com o
relato de obras pias, fundações de casas religiosas e generosas dotações
fundiárias a ordens militares, bispados e abadias, um pouco por todo o país, o
que contrastava abundantemente com as informações suspiradas pelas crónicas do
passado, que davam conta apenas da incapacidade e insensibilidade do rei para
com as coisas do clero. Por exemplo, podemos citar: mando se dê para as obras
dos frades pregadores de Santarém trezentos maravedis e se reparta com eles da minha
madeira de Lisboa e de outros lugares meus, a que lhes for necessária. Aliás, Franciscanos
e Dominicanos foram largamente apoiados e financiados por dom Sancho, e Brandão
não se cansa de dar exemplos dessa intensa ligação entre o soberano e aquelas ordens.
Vastas páginas tratam da questão da deposição do rei em 1245, e como a ela recorreremos
incessantemente, aqui deixamos o que nos parecem ser as principais opiniões de
fr. António Brandão:
Não há dúvida que foram mui
urgentes as causas que obrigaram ao Sumo Pontífice privar a el-rei dom Sancho
do governo do reino, e a mandar em seu lugar o infante Afonso. Mal se pode
desculpar el-rei dom Sancho, nem nós o queremos livrar, nem ainda podemos, pois
anda incerta no corpo do direito canónico a bula de sua deposição em que vêem
apontadas as cousas que moveram ao papa a fazer um extremo tão grande, como foi
excluir a um rei do governo e administração de seu reino.
Resume, desta forma, o facto
incontestável de que o rei foi deposto. Cita as diversas queixas formuladas
junto da Santa Sé e a inevitabilidade política dessa mesma deposição.
Curiosamente cita dois governantes de grande poder na Europa daquele tempo, e
que estarão para sempre ligados, de maneiras diferentes, à deposição do seu congénere
português. São eles, Frederico II, o imperador deposto no Concílio de Lyon, uma
semana antes de Sancho e Luís IX, rei de França, patrono de Afonso de Bolonha e
protector do papado. Voltaremos a falar deles.
Lá estão, em Lyon, em plena
actividade conciliar, os prelados portugueses mais envolvidos do que nunca na
conjura para deporem o seu rei. Nomeia-os a todos: João, o arcebispo de Braga,
Pedro, o bispo do Porto, Tibúrcio, bispo de Coimbra e junta-lhes laicos. Estes
são nobres e vêem de Portugal, supostamente como embaixadores nomeados pelo
rei, atitude que Brandão considera cínica. São eles Rui Gomes Briteiros,
infanção e mais tarde rico-homem do rei Afonso III e Gomes Viegas [Portocarreiro].
Importante é para Brandão o entendimento que o Bolonhês estabelece com aqueles
prelados portugueses no coração do reino francês. Em Paris, e sob os auspícios do
rei de França, Afonso de Bolonha, jura perante diversas testemunhas e pelos Evangelhos,
o seguinte, que Brandão não resistiu em transcrever:
Eu, dom Afonso, conde de Bolonha,
filho de dom Afonso de ilustre memória, rei de Portugal, prometo e juro sobre
estes Santos Evangelhos de Deus, que por qualquer título que alcançar o reino
de Portugal, guardarei e farei guardar a todas as comunidades, conselhos…
[…]
In
José Varandas, Bonus Rex ou Rex Inutilis, As Periferias e o Centro. Redes de
poder no reinado de Sancho II (1223-1248),Ude Lisboa, FdeLetras, DdeHistória,
Tese de Doutoramento em História, História Medieval, 2003, Wikipedia.
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