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Beja,
Paço Ducal, 16 de Agosto de 1472
«(…) João era, talvez, o filho que
mais se parecia com ela. Entre os dois existia um carinho e uma empatia que não
existia com a restante prole. Não estou a querer dizer que minha mãe gostava
mais do João do que dos outros filhos mal certamente por ter sido o seu filho primogénito
e por ter um feitio tão semelhante ao seu, o entendimento entre ambos era perfeito.
O mesmo não acontecia com Diogo e ele, ressentido desse facto, tornava sempre as
coisas mais difíceis. João era determinado sem ser ambicioso, ao contrário de Diogo
que já sofria naquela altura de uma ambição desmedida. Era justo e generoso sem
ser influenciável. Sempre conciliador tanto no seio da sua família como com os
seus servidores e cavaleiros.
Depois da morte de João, talvez Manuel
tenha saído beneficiado, porque a preferência materna pendeu sobre ele, dado que
o meu irmão mais novo, à semelhança do mais velho, era determinado, teimoso, voluntarioso,
jovial, alegre, mas nunca prejudicou ninguém. Dos nove filhos que meus pais colocaram
neste mundo, apenas estavam vivos quatro, chorei durante várias horas e sei que
foi somente devido ao carinho de Catarina Rodrigues que superei esta dor.
Catarina fora, durante vários anos, ama do príncipe João II, mas agora vivia no
nosso paço e ao ver-me tao frágil não me abandonou nem por um momento. Minha querida
menina, tendes de ser forte. Mas, Catarina, como e possível o João ter morrido assim
tão repentinamente?
O vosso irmão foi chamado para junto
de vosso paizinho e de vossos irmãos. Agora encontra-se em paz. Mas era o meu irmão
mais velho. E agora o que vai ser da mãe? Ela adorava o João. Sei que é difícil
nesta hora encontrar uma explicação para os desígnios de Deus, mas a Senhora
Duquesa vai superar mais uma vez esta perda. A Senhora Duquesa é uma mulher
muito forte e com a ajuda de Deus vai ultrapassar esta provação. Mas perdemos o
nosso pai ainda há tão pouco tempo! Minha querida, a Senhora Duquesa vai
precisar da vossa ajuda e também da ajuda de sua irmã. Agora vou colocar-vos
uns pachos de água na testa durante algum tempo e depois vamo-nos levantar, lavar
essa carita e mimar a senhora vossa mãe. É necessário alguém dar apoio a dona Beatriz
e certamente não será o menino Diogo a fazê-lo.
O Diogo só pensa nele e no facto de
herdar agora todos os títulos do João. Por isso mesmo, temos de ajudar a vossa mãe
nesta hora tão difícil. Catarina, e agora o que vai ser do casamento da Bé? Não
vos preocupeis com isso agora, menina. Tudo se arranja, a vossa irmã não vai deixar
de casar. Mas o João ia ser o padrinho! Será então o Diogo o designado ou um outro
nobre. Descansai que ela não fica por casar por falta de padrinho.
Beja, Paço Ducal, 19 de Setembro de 1472
A cerimónia do casamento de dona
Isabel de Viseu com o duque de Bragança foi um acontecimento muito discreto, embora
toda a alta nobreza estivesse presente na cerimónia. Isabel casava aos treze anos
de idade com Fernando II que, após a morte do velho duque, lhe sucederia no título
como terceiro duque de Bragança. Embora ainda fosse muito nova, lá alcançara a maioridade
para uma mulher contrair matrimónio por palavras de presente, uma vez que completara
os doze anos, a idade mínima para o fazer. Dona Isabel tinha-se tornado mulher
quatro meses antes com o aparecimento das regras e a partir deste momento
o vínculo matrimonial poderia ser consumado». In Paula Veiga, A Rainha
Perfeitíssima, 2017, Edições Saída de Emergência, 2016/2017, ISBN
978-989-773-014-6.
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