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«(…) O PS acabaria por ser,
acidentalmente, aquele que mais responsabilidades teria na construção das
actuais estruturas económicas, sociais e políticas do País. Opôs-se à opressão
salazarista e sairia desiludido da chamada primavera marcelista. Acabaria por resistir
à aventura comunista e, depois, à tentação militarista, acabando por impor o
seu modelo de sociedade, a partir de 1976. Nesse percurso e nos momentos
decisivos, teria sempre o apoio internacional dos Estados Unidos e da Europa.
Daí que a perspectiva internacional, em redor da qual têm girado o país e os
principais partidos políticos, seja uma peça essencial para a análise dos
actuais fenómenos da nossa sociedade. Sem esses apoios, que para o PS estariam
como o oxigénio está para a vida, provavelmente o regime democrático teria
sucumbido. Do mesmo modo que, em 1945, a sua ausência viabilizaria a
continuação de Salazar. Mas, por outro lado, se sem eles tudo estaria em jogo,
também a relação de dependência criada e a institucionalização do tráfico de
influências iriam provocar algumas distorções e vícios que o País hoje sente. Tentar
explicar esses fenómenos de um passado recente, para compreender o presente, é
um dos objectivos deste livro. Mas, como não poderia deixar de ser, escrever sobre
o PS durante este período sem falar dos seus principais protagonistas tomaria impossível
alcançar essa meta. Entre eles destacam-se duas personalidades distintas e a relação
de amor e ódio que, em grande parte, determinaria o actual PS: MS e FSZ (o bom Chico - JDACT). O primeiro
deixaria marcas profundas que continuarão a caracterizar o PS por muito tempo.
De SZ este partido herdaria a consciência moral que ainda lhe resta. MS seria
eleito Presidente da República e SZ abandonaria o partido, incompatibilizado
com o seu velho amigo. Durante algum tempo, o PS iria ser um barco à deriva.
Recuperaria eleitoralmente, contudo, com o seu actual líder, AG. Mas,
curiosamente, essa recuperação só aconteceria quando este fiel discípulo de Z
se converteu ao soarismo. Por isso mesmo, esta interessante simbiose das
personalidades daqueles dois principais personagens será agora examinada à lupa
no novo PS, para ver se ele segue o caminho da consciência moral do seu velho
protector, ou o caminho do absolutismo monárquico e das facilidades do seu
favorito ex-inimigo.
Para já, é evidente que o actual
secretário-geral do PS, já em 1976, responsável com EP, SL e SF (SF sucederia MA,
em 1986, no lugar de tesoureiro do PS e seria depois convidado por CM (o meu bom amigo –
JDACT)
para presidente da Companhia do Aeroporto de Macau, pela campanha eleitoral do
PS, conhece bem as dependências internacionais do seu partido e até, à
semelhança do seu antecessor, trata-se por tu com pelo menos seis
primeiros-ministros europeus (esta declaração de AG, em 1995, é copiada de uma
declaração idêntica de MS, de 1979, quando dizia que era amigo pessoal do
Schmidt, do Willy Brandt, do Callaghan, do Olof Palme..., etc., para afirmar
que posso pegar em qualquer momento no telefone e falar com eles). Vamos ver para
crer, como diz o
ditado, mas, pelos primeiros indícios, temo que, do mesmo modo que S meteria o
socialismo na gaveta, G venha a meter a consciência moral do PS no congelador.
O que é um mau sinal para a democracia. Que não terá futuro se o passado não
estiver esclarecido e o futuro continuar a depender de bodes expiatórios.
O meu livro, assim o espero,
ajudará a compreender como o triunfo de alguns se faria à custa do sacrifício
de outros. O estado dos juízes está atento ao passado dos actuais políticos e
não hesitará, no momento oportuno, em colaborar para a sua decomposição. Eu
entrei para a política quase por acaso. Aderi nos anos 60 à minúscula Acção Socialista
Portuguesa por acreditar que, pela via do socialismo democrático e através de
um sistema pluripartidário, Portugal viria a ser um país igualou melhor que
aquele onde vivia exilado, a Suécia, e que era então considerado,
acertadamente, a sociedade mais justa e mais evoluída do planeta. Não o
socialismo utópico, igualitário, de partido único que transforma os cidadãos em
funcionários do estado. O socialismo onde os partidos se combatem no campo das
ideias e onde os interesses e bem-estar dos cidadãos estão sempre em primeiro
lugar. Onde os partidos políticos são a espinha dorsal do sistema e os
instrumentos para a sua modificação democrática e não o instrumento de promoção
pessoal dos seus dirigentes. Mas, infelizmente, e daí a outra razão de ser deste
meu livro, Portugal parece estar a perder essa importante batalha da
democracia. Isso atestam o crescente branqueamento da História e falta de
transparência das instituições. A Europa, berço da amálgama de culturas e
conflitos que deram origem ao que é hoje vulgarmente apelidado de civilização
ocidental, nunca produziu um modelo perfeito de democracia que garanta aos seus
cidadãos a igualdade de acesso à educação, ao trabalho, à saúde e à justiça.
Entretanto, alguns países, sobretudo a norte, conseguiram ao longo dos anos
conquistas importantes naquelas áreas, com base numa considerável evolução do
conceito de respeito pelos direitos humanos, dos direitos dos animais e da
natureza». In Rui Mateus, Contos Proibidos, 1996, Publicações Dom Quixote, 1996,
ISBN 972-201-316-5.
Cortesia de PdomQuixote/JDACT