quarta-feira, 20 de setembro de 2023

Pedro IV. Paulo Rezzutti. «A cripta sob o monumento foi construída no início da década de 1950, com as paredes revestidas em granito verde e o tecto, não mais existente, em mármore amarelo»

jdact

Um morto e quatro e quatro funerais

«A sua paixão por velocidade levava-o a conduzir, ele próprio, os cavalos do seu veículo, e a cavalgar a toda a carga pelos arredores do Rio de Janeiro. Isso causou diversos acidentes, como o de 1823 que o prendeu ao leito partido e sujo, semelhante ao estado em que se mostrava a meus olhos naquela manhã de Abril.

Quanto a ser aventureiro, então, esse é um capítulo à parte. Pedro não pensou duas vezes antes de se declarar brasileiro e lutar contra Portugal, terra natal da qual era herdeiro, pela independência do Brasil. Também não temeu largar tudo neste último país para reunir, após penhorar joías e prataria, um exército que invadisse Portugal e destronasse o irmão a favor da filha.

Se é na morte, como dizem, que encontramos a paz e o descanso que a vida nos tirou, Pedro não teve essa sorte. Aquela era a quarta vez que o tinham sepultado. A anterior havia ocorrido em meados de 1987, em virtude das obras no monumento e de uma das inúmeras inundações ocorridas na cripta. Os sarcófagos por pouco não acabaram submersos. Os seus imperiais ocupantes viram-se, como diversos outros brasileiros, com a casa inundada e tiveram de se abrigar num vizinho ou parente, no caso o Museu Paulista, mais conhecido como Museu do Ipiranga.

Os caixões de Pedro e de dona Leopoldina ficaram expostos ao grande público no salão Nobre do Museu, aos pés do quadro Independência ou Morte, de Pedro Américo; para arrepio de alguns professores que conduziam excursões escolares e sussurros de rápidas ave-marias entre funcionários. Voltaram a cripta no final dos anos de 1980, em cima de um veículo militar escoltado por oficiais de diversas armas, em mais uma comemoração do 7 de Setembro.

A cripta sob o monumento foi construída no início da década de 1950, com as paredes revestidas em granito verde e o tecto, não mais existente, em mármore amarelo. O controverso Monumento à Independência, que fica acima, conhecido como bolo de noiva, é de 1922. Inicialmente, a cripta seria um cenotáfio, espécie de memorial fúnebre em homenagem a Pedro e dona Leopoldina, representados pelos sarcófagos vazios. O corpo da imperatriz permaneceu de 1826 a 1911 no convento da Ajuda. Devido às obras de remodelação da área central do Rio de Janeiro, o convento foi demolido e os sarcófagos de membros da família imperial, transportados para o Convento de Santo António. Pedro esteve em Portugal desde o falecimento, em Setembro de 1834.

O cenário mudou em 1954, durante a preparação para os festejos do quarto centenário da cidade de São Paulo. O instituto histórico local resolveu coroar a festa levando o corpo de dona Leopoldina do Rio de Janeiro para a capital paulista, a fim de o depositar na cripta. Um longo braço de ferro entre a ordem Franciscana, responsável pela guarda do corpo da imperatriz, e a comissão dos festejos teve início com o presidente Getúlio Vargas e o ministro da Educação e Cultura de um lado, querendo fazer a vontade dos paulistas, e os franciscanos, protegidos pelo arcebispo do Rio de Janeiro, dom Jaime Câmara, do outro». In Paulo Rezzutti, Pedro IV, A história não contada, 2015, Casa das Letras, 2016, ISBN 978-989-741-495-4.

Cortesia da CdasLetras/JDACT

 JDACT, Paulo Rezzutti, Brasil, História, Conhecimento,