quinta-feira, 29 de maio de 2014

Povos e Culturas Reflexos do Maio de 68 na Sociedade Portuguesa Artur Matos e Mário Lages. «… certos que da leitura destes artigos, entrevistas e depoimentos nascerá uma opinião mais enriquecida e firme sobre o ‘Maio de 68’ e das suas repercussões na sociedade portuguesa»

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Reflexos do Maio de’68 na Sociedade Portuguesa
Nota Prévia. «Quem viveu os acontecimentos ocorridos em Maio de 68 certamente não esqueceu as notícias que até nós chegavam desses factos, apesar de nem tudo ser convenientemente divulgado. Mas a época era de emigração e de grande procura de França, sobretudo de Paris, à busca de melhores condições de vida, ou para continuar estudos e adquirir as especializações que tardavam em chegar a Portugal, ou tão-somente à cata de algum espaço de maior liberdade de expressão. Também quem por esses ou outros motivos presenciou os episódios de conturbação estudantil, certamente não esqueceu as vivências desses tempos. E, quiçá persuadido da extensão da controvérsia, procurou razões, reteve imagens, guardou documentos, observou consequências que, decorridas algumas décadas será certamente de interesse recordar. Reflectir em todos esses episódios e observar o seu eco na sociedade portuguesa, foram motivos que levaram o CEPCEP, a consagrar-lhe um número da sua revista Povos e Culturas. Mas também, porque atento aos fenómenos de mutação social, com esta reflexão pretendeu assinalar o quarto de século da sua existência, trazendo à lembrança ou ao conhecimento das gerações presentes, acontecimentos que se terão repercutido na sociedade portuguesa do tempo. Temos a noção da complexidade da análise e da controvérsia do tema. Por isso tivemos a preocupação de o trazer ao público, decorridos 40 anos, analisando-o em diversas perspectivas e por autores de diferentes formações académicas e de desiguais universos políticos. Os autores que tiveram a generosidade de colaborar connosco, enriqueceram-nos com perspectivas teóricas, informação sobre comportamentos insurrectos, análises históricas, vivências revolucionárias, quer em França quer depois em Portugal. Muitos deles foram testemunhas oculares do ocorrido durante e após a revolução que marcou a segunda metade do século XX. Estamos certos que da leitura destes artigos, entrevistas e depoimentos nascerá uma opinião mais enriquecida e firme sobre o Maio de 68 e das suas repercussões na sociedade portuguesa». In Mário Lages Artur Teodoro de Matos

Para uma revisitação de one-dimensional man’ de Herbert Marcuse
Um mentor inspirativo?
«Desde muito cedo, praticamente, numa coetaneidade com o desenrolar dos acontecimentos e a sua expressão mediatizada, Herbert Marcuse foi sendo associado à figura tutelar de mentor inspirativo, inspirational mentor, dos movimentos estudantis de protesto dos anos sessenta do século passado. Uma ronda pelas publicações da época poderá sem dificuldade encontrar atestações para o facto, que a memória dos contemporâneos, como impressão, regista. A título anedótico, recordo ainda o entusiasmo com que de Marcuse me falava, confessando embora não o ter lido, um antigo colega de liceu, de naturalidade francesa, recém-chegado de Paris, numa conversa ocasional no Verão de 1968, em plena praia do Estoril. Compete à investigação histórica e ao inquérito sociológico debruçar-se em concreto, e com maior rigor, sobre as vicissitudes e os termos determinados, culturais, ideológicos e, inclusivamente, biográficos, em que essa influência espiritual, reconhecidamente difusa, se terá verificado.
No entanto, é facto que, entre 1964, data da primeira edição, e 1969, One-Dimensional Man conheceu, só nos Estados Unidos da América e na mesma editorial, mais de uma dezena de reimpressões. O êxito do empreendimento teve certamente a ver, não apenas com a real valia intrínseca da obra, mas também com a sua estreita consonância percebida com todo um conjunto de realidades que estavam em gestação e desenvolvimento. Por sua vez, o próprio Marcuse, no prefácio de An Essay on Liberation (1969), depois de assinalar a continuidade temática deste escrito, designadamente, com Eros and Civilization, One-Dimensional Man, e Repressive Tolerance, afirma: Este ensaio foi escrito antes dos acontecimentos de Maio e Junho de 1968 em França. Acrescentei meramente algumas notas de rodapé em jeito de documentação. A coincidência entre algumas das ideias sugeridas no meu ensaio e as formuladas pelos jovens militantes foi para mim surpreendente [striking]. O radical carácter utópico das exigências [demands] deles ultrapassa de longe as hipóteses do meu ensaio; e, todavia, essas exigências foram desenvolvidas e formuladas no decurso da própria acção; são expressões de uma prática política concreta. Para além dos aspectos testemunhais de admiração e de espanto que acompanham todo este pronunciamento, desde logo, dois traços teoréticos me parecem desenhar-se aqui, e ser de reter: a vinculação da produção de pensamento (ou a consciencialização dos actores) à imersão num processo activo (a prática de uma luta em desenvolvimento) e o equacionamento da dimensão utópica». In José Barata Moura, Artur Matos e Mário Lages, Centro de Estudos dos Povos e Culturas de Expressão Portuguesa, Povos e Culturas n.º 12, Reflexos do Maio de ’68 na Sociedade Portuguesa (CEPCEP), Universidade Católica Portuguesa, Lisboa, 2008, ISSN 0873-5921.

Cortesia de CEPCEP/JDACT