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A
minha casa está assombrada
«(…)
Casa assombrada, é o aparatoso título que usualmente se atribui a um edifício
onde acontecem situações insólitas que, sem uma razão plausível, acabam por ser
atribuídas à manifestação de entidades sobrenaturais, vulgo fantasmas ou fenómenos
de poltergeist, de acordo com a terminologia alemã. O assunto é obviamente
controverso e susceptível de muitas crenças e descrenças. Já para não falar em acesas
discussões. Mas as histórias de fantasmas existem desde que o mundo é mundo,
longe ou aqui mesmo ao lado, e continuam a causar calafrios e interrogações, apesar
do estado de conhecimento e progresso que a civilização actual alcançou. Há casos
mundialmente famosos relatados pela parapsicologia, como o da célebre mansão de
Raynham Est, em Norfolk (Inglaterra), onde foi tirada a foto da silhueta
enevoada da badalada Dama de Marrom a descer as escadas. Apregoa-se que o fantasma
visto na fotografia é de Dorothy Townshed, trancafiada pelo marido numa ala da casa
por suspeitas de traição. Dorothy morreu oficialmente de varíola, porém, muitos
acreditam que o marido vingativo a empurrou escadaria abaixo, sítio onde ela
ainda procura o filho de cinco anos. Divulgada em centenas de livros, jornais e
revistas pelo mundo fora, esta fotografia passou a ser talvez a mais famosa
imagem de um fantasma, num mundo sequioso de provas materiais. Há também o caso
de Amityville, onde reza a história que em 1976 a família Lutz foi severamente atormentada
por espíritos durante os curtos 27 dias que viveu numa casa da pequena cidade norte-americana
e onde se ouvia constantemente o som de uma banda marcial a tocar. Esta narração,
muito popular em terras do tio Sam foi, aliás, passada para a tela com o nome de
Horror em Amityville, o que lhe valeu um estatuto mítico no ranking dos sítios mais
assombrados do mundo.
Mas
o que é afinal um fantasma? Para começar, é um conceito que a maioria teme,
alguns desprezam e outros tantos já tentaram explicar. Também denominado por espectro,
aparição ou alma penada, baseia-se na ideia de que o espírito existe separadamente
do corpo e, portanto, quando a matéria morre, o espírito perdura. Reside
precisamente nesta crença, comum a várias filosofias e religiões, o tradicional
hábito da cerimónia fúnebre, enquanto conjunto de rituais que concedem o eterno
descanso àquele que deixou o mundo dos vivos, assegurando-se assim que não volte
para assombrar os vivos. A mais usada frase dos obituários, descanse em paz,
comprova a crença. A morte, enquanto interrogação universal sobre o que acontece
depois da vida, parece ser o princípio deste fenómeno cultural universal, julga
a antropologia. Mas os fantasmas e, por conseguinte a existência ou não de casas
assombradas, são um tema que obviamente nada tem de consensual. O catolicismo
rejeita-os veementemente e a ciência encara-os com grande cepticismo. A parapsicologia,
que se dedica concretamente ao estudo e análise de tais fenómenos, atribui-os à
energia somática. Outras correntes filosóficas, como a doutrina espírita, admitem
não só a existência do espírito como a possibilidade de se poder com ele comunicar.
Um imbróglio para quem tentar procurar a verdade ao fundo do túnel.
O nosso
corpo tem energia, que se transforma segundo os efeitos que realiza. É energia motora
quando anda, energia sonora quando fala, etc. Mas em períodos particularmente
difíceis da vida, a energia emanada pelo ser humano pode produzir fenómenos de efeito
físico, como mexer pequenos objetos inconscientemente, aos quais a parapsicologia
dá o nome de telergia. À libertação dessa mesma energia chama-se psicorragia.
Esses fenómenos sobrenaturais nunca acontecem, todavia, a mais de cinquenta
metros da pessoa que o produz, sendo mais frequentes a cinco ou seis metros.
Quer isso dizer que não existem casas assombradas, apenas fenómenos energéticos
produzidos pelas pessoas que estão dentro delas. As assombrações são um produto
dos vivos e não dos mortos explica a parapsicóloga Luísa Albuquerque. Muito antes
do surgimento da parapsicologia, no século XVIII, já Franz Mesmer, médico, criador
da teoria do magnetismo animal e também estudioso dos fenómenos energéticos do
corpo, tinha distinguido vários subtipos de telergia passíveis de serem produzidos
pelo homem: fenómenos de luz (fotogénese), som (tiptologia), fogo (pirogénese) e
movimento (telecinesia). A negação da possibilidade do espírito se manifestar após
a morte afronta, porém, outras correntes de pensamento como, por exemplo, o
espiritismo». In Vanessa Fidalgo, Histórias de um Portugal Assombrado, 2012, A Esfera
dos Livros, Lisboa, 2012, ISBN 978-989-626-371-3.
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