sábado, 8 de maio de 2010

A Fortaleza de Castelo de Vide: A povoação encontrava-se no domínio do reino de Portugal em 1232

O castelo medieval
Cortesia da CMCastelo de Vide
À época da Reconquista cristã da Península Ibérica, algumas evidências, não comprovadas, apontam para uma suposta conquista por D. Afonso Henriques em 1148, bem como a outorga de foral em 1180. Sabe-se, com mais segurança, que a povoação encontrava-se no domínio do reino de Portugal em 1232, revestindo-se de importância e tendo organização municipal já em 1276.
A vila no interior do Castelo
O seu senhorio foi disputado entre dois dos filhos de Afonso III, o primogénito, o rei D. Dinis e seu irmão, o Infante D. Afonso Sanches, por motivos de direitos de sucessão quando o primeiro subiu ao trono. Tendo o infante D. Afonso recebido de seu pai o senhorio dos domínios de Arronches, Castelo de Vide, Marvão e Portalegre (1273), decidiu, em 1279, muralhar Castelo de Vide (o que indica a sua primazia sobre as vilas vizinhas, à época). Como alardeava direitos de sucessão pretensamente maiores que os do irmão D. Dinis, entendeu o soberano que essa atitude ocultava intenções bélicas, colocou-se em marcha à frente de suas tropas e veio a colocar cerco à vila (Abril de 1281).
A vila no interior do castelo
Na iminência do assalto, chegou ao acampamento real uma embaixada do reino de Aragão, com a proposta de casamento do soberano com D. Isabel, futura Rainha Santa Isabel. Com a interveniência desta embaixada, acordou-se a paz entre os irmãos, vindo D. Afonso a concordar com a demolição de todas as fortificações que havia empreendido (uma torre e vários troços de muros). Um novo incidente envolvendo Castelo de Vide teria lugar a partir de 1299, suscitado pelo matrimônio do infante D. Afonso com uma infanta de Castela. Devido à proximidade dos senhorios do infante com a raia lindeira com aquele reino, os seus domínios alentejanos foram permutados por Sintra, Ourém e outras vilas mais distantes da fronteira. Estes castelos alentejanos foram então entregues a Aires Pires Cabral, quarto avô do navegador Pedro Álvares Cabral, que deles prestou menagem, na função de Alcaide-mor. O soberano determinou, a partir de então, o reforço do castelo e a construção de uma nova cerca envolvendo a povoação. Estes trabalhos foram concluídos, conforme inscrição epigráfica sobre uma das portas do castelo, junto à Rua Direita, em 1327, sob o reinado de D. Afonso IV.
Parte do castelo
Sob o reinado de D. Fernando, a vila, o castelo e seus domínios foram entregues Ordem de Avis, por permuta com os de Castro Marim (1383). Com a morte deste soberano, aberta a crise de 1383-1385, a vila inicialmente declarou o seu apoio à herdeira D. Beatriz, passando, quando do cerco de Lisboa (1384), a apoiar o partido do Mestre de Avis. Nas lutas que se seguiram, é destacado o valor do Alcaide de Castelo de Vide, Gonçalo Anes, particularmente na batalha de Aljubarrota e na batalha de Valverde.

Livro das Fortalezas de Duarte D'Armas
Cortesia da CMCastelo de Vide
Sob a regência de D. Pedro, duque de Coimbra, durante a menoridade de D. Afonso V, foram reforçadas as defesas dos castelos da raia alentejana, entre os quais se incluía o Castelo de Vide. Seria esse o aspecto que teria sob o reinado de D. Manuel I, quando se encontra figurado por Duarte de Armas no seu Livro das Fortalezas (c. 1509): uma barbacã ameada precedendo uma muralha envolvente da praça de armas reforçada por torreões nos vértices, conjunto dominado por uma sólida torre de menagem.

Castelo de Vide, o contraste entre o medieval e o seiscentista.
Uma nova etapa arquitectónica teve lugar no final do século XVII, contexto da Guerra da Restauração da independência portuguesa, quando lhe foram introduzidas modernizações visando adaptá-la aos modernos tidos da artilharia. Os trabalhos iniciaram-se já em 1641, ampliados a partir de 1644 sob projeto e direção do engenheiro-militar e arquitecto francês, Nicolau de Langres. Anos mais tarde, em 1660, no auge desse processo de fortificação, a praça encontrava-se constituída por dois núcleos principais: o do castelo, a oeste, e o Forte de São Roque, a leste, interligados por extensa linha de muralhas abaluartadas. A guarnição, à época era de 600 homens e três companhias de cavalaria, indicativa da sua importância estratégica.

Forte de São Roque
Cortesia da CMCastelo de Vide
Posteriormente, a praça foi cercada e conquistada durante a Guerra da Sucessão Espanhola (1704), ocupada sem resistência durante a chamada Guerra das Laranjas (1801) e, por tropas francesas sob o comando de André Massena, durante a Guerra Peninsular. (1811). A destruição sofrida desde então levou à sua desativação a partir de 1823, quando se acentuou o seu processo de degradação.

O conjunto encontra-se classificado como Monumento Nacional por Decreto publicado em 23 de Junho de 1910.

O castelo medieval apresenta planta quadrangular, orgânica (adaptada ao terreno), com os panos de muralha reforçados por cinco torres quadrangulares e cubelos circulares, precedida por uma barbacã ameada. A Porta da Vila rasga-se no troço a leste, constituída por um amplo portal duplo que acede uma pequena praça de armas, ligando com a porta interna oeste. No troço norte subsistem vestígios das mísulas de um antigo balcão e ainda duas janelas. Entre duas das torres podem ser identificados traços da primitiva alcáçova. No interior da praça de armas dispõem-se as edificações de serviço, como os armazéns.A torre de menagem dionisina, adossada ao portão principal, foi parcialmente destruída por uma explosão de pólvora em 1705, a qual danificou a abóbada ogival de nervuras. A cerca externa envolvia a vila, onde bem conservada, destacam-se a Rua Direita, os antigos aquartelamentos na Rua de Santo António, a Casa da Câmara e Cadeia, entre outras edificações. Era rasgada por quatro portas, das quais subsistem a Porta Nova e a Porta de Santa Catarina. Com o crescimento da povoação perderam-se partes dessa cerca, a Porta de São João e a Porta da Aramenha.

Como complemento, um texto da Associação Portuguesa dos Amigos dos Castelos:
«Castelo de Vide é composto pelo conjunto do castelo e da cerca urbana. Estes são complementares entre si, funcional e arquitectonicamente. O Castelo ocupa o canto sul da vila fortificada, com os seus muros na rigorosa continuidade da cerca urbana. Terá sido o primeiro elemento a ser construído na campanha de obras do séc. XIV, sendo as muralhas completadas até 1327. Apresenta uma planta não totalmente ortogonal, como aparenta o desenho de Duarte d’Armas de 1509.O acesso era feito pelo interior da vila e não directamente do exterior. Para aqui abria-se a porta da traição, bastante ampla e semelhante às restantes portas. As portas ocorrem em lados contrários no castelo, como se verifica na maioria dos castelos da Idade Média. A porta de entrada no castelo terá mudado de posição possivelmente no final do reinado de D. Manuel ou imediatamente a seguir. Todo o castelo é rodeado por uma barbacã.
A torre de menagem ergue-se na esquina menos protegida, no único canto da alcáçova que não confina com a povoação fortificada. Era uma torre imponente com cerca de 20 m de altura, distribuídos por uma planta quadrada de 16 m de lado. No tempo de D. Manuel terá sido acrescentado um piso, mais leve, com um pé-direito mais reduzido mas onde se previu janelas genuínas e dois fogões de sala com chaminé e é assinalado por Duarte d’Armas como “my bom apousentamento em cyma”. Não tem ameias. A ligeira torsão que apresenta relativamente à esquina do castelo não está ainda bem esclarecida: pode resultar de condicionamentos militares concretos ou então estar alinhada com um pano de muralha desenterrado no meio do pátio de armas, o que significaria uma construção anterior ao séc. XIV. Todo o castelo de Castelo de Vide caracteriza-se pela qualidade do material e das técnicas construtivas. A utilização de alvenarias de pedra e cal aliam-se à pedra, em que as segundas são reservadas para sítios específicos como os cunhais, a base da torre de menagem e certas molduras de portas. Foram utilizados o granito e o grauvaque, ambos materiais abundantes na região. As fundações eram directas sobre o afloramento rochoso que foi cortado para esse efeito.
A cerca urbana apresenta a forma de um polígono irregular, de planta pentagonal. A sua edificação terá sido condicionada pelo relevo e também por existências anteriores ao séc. XIV. Os muros rectilíneos proporcionam uma envolvente angular ao conjunto. As torres que compõe este conjunto ocorrem nos cantos do recinto, em pouco número e pouco salientes relativamente à muralha, e apresentam uma forma cilíndrica. São torres discretas, maciças e poderiam estar munidas de ameias, tal como a muralha. Não há torres ou dispositivos para tiro vertical nas entradas da vila. Escadas de acesso à muralha estavam estrategicamente articuladas com as ruas e não há interrupção do adarve possibilitando uma rápida movimentação pelo alto dos muros. A desaparecida Torre do Relógio estava associada às defesas externas: barbacã e couraças.
A barbacã do castelo de Castelo de Vide foi absorvida ou perdida em grande parte pelas obras abaluartadas do séc. XVII, restando o troço sul-nascente. Estaria já instalada e operacional em 1327 tal como indicado na lápide que encima a porta sudeste e também contemporânea da muralha (visível na mesma tipologia de aparelho e desenho de portais). Abrangia sectores inteiros do contorno defensivo, os mais vulneráveis ou os de maior estatuto e que deveriam corresponder a metade do comprimento fortificado total (que tem 500 m). A barbacã ajudava a interligar a imagem da vila e do castelo estendendo-se em redor de ambos sem diferença ou descontinuidade arquitectónica.

Cortesia dos Amigos dos Castelos
Existiam em Castelo de Vide duas couraças, que se apresentavam como um pano de muralha, com uma altura equivalente à barbacã. Possuíam uma disposição em L, isentas de torres ou corpo de remate à ponta. Uma destas couraças já havia sido apanhada pelo casario no princípio do século XVI.
As portas consolidavam um alinhamento noroeste-sudeste de todo a povoação, retomando o princípio romano do cardum e decumanum, em que se salienta a Rua Direita. A vila fortificada definiu-se em redor desta artéria que apresentava as portas nas suas duas extremidades, abertas a sudeste (que ligava aos arrabaldes que para aqui se desenvolveram) e a noroeste (donde saiam as estradas para Nisa e o resto do reino). Estas portas apresentavam uma grande robustez de construção, assim como os dois postigos instalados em panos contrários da muralha, exactamente face a face, muito utilizadas no quotidiano pelos habitantes.
Resistem dúvidas quanto à fundação original dos elementos militares do castelo de Castelo de Vide. Pedro Cid aponta como hipótese de trabalho a correspondência de alguns elementos a fases cronológicas distintas. Assim dos séculos XII ou XIII ou até islâmico pode ser a torre cilíndrica e os muros que delimitam o núcleo interno mais pequeno; do séc. XIV a torre de menagem e os panos da barbacã dando para a vila. A fortificação abaluartada abraça tanto o castelo como a cerca medieval. Apresenta um traçado muito pouco de acordo com os tratadistas em que as muralhas têm que envolver dois morros à cota 600, descendo abruptamente para uma zona central à cota de 550 m. É constituído por cortinas, baluartes e meio baluartes e também redentes que pretendem colmatar a difícil situação de defensibilidade desta localidade. O traçado abaluartado que hoje existe em Castelo de Vide demonstra bem como foi possível, com base na fortificação irregular minimizar as condicionantes que o terreno impunha ao sistema defensivo».
História de Portugal/Associação Portuguesa dos Amigos dos Castelos/wikipédia/JDACT

Sem comentários:

Enviar um comentário