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Cortesia de galeon
Com a devida vénia, da edição crítica de Joseph M. Piel, Lisboa, 1944
Livro de Ensinança de Bem Cavalgar Toda Sela
(Extracto)
«Em nome de nosso senhor Jesu Cristo, com sua graça e da virgem Maria, sua. muy sancta madre, nossa senhora: Coméçasse o livro da enssynança de bem cavalgar toda sela, que fez Elrrey dom Eduarte de Portugal e do Algarve, e senhor de Cepta, o qual começou em seendo Iffante.
Em nome de nosso senhor Jesu Cristo: Segundo he mandado que todallas cousas façamos, ajudando aquel dito que de fazer livros nom he fim, por algüa meu spaço e folgança, conhecendo que a manha de seer boo cavalgador he hüa das principaaes que os senhores cavalleiros e scudeiros devem aver, screvo algüas cousas per que seran ajudados pera a melhor percalçar os que as leerem com boa voontade e quiserem fazer o que per mym em esto lhes for declarado. E ssaybham primeiramente que esta manha mais se acalça per naçom, acertamento de aver boas bestas e aazo contynuado dandar em ellas, morando em casa e terra que haja boos cavalgadores e prezem os que o ssom, que por saberem todo o que sobr’esto aquy screvo nem poderem screver os que em ello mais que eu entendem, nom avendo deilo boa, contynuada husança, com as outras ajudas suso scriptas. Mas esto faço por ensynar os que tanto nom souberem, e trazer em renembrança aos que mais sabem as cousas que lhes bem parecerem, e nas fallecidas enmendando no que screvo a outros podeerem avysar. E os que esta manha quiserem aver, helhes necessario que ajom as tres cousas principaaes per que todallas outras manhas se acalçom, as quaaes som estas: grande voontade, poder abastante, e muyto saber.
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De cada hüa direi apartadamente o que me parece, [e] ainda que o poder e querer nom sejam verdadeiramente pera ensynar, por que se gaançom per natureza e graça special em cada hüa cousa mais que por ensynança, screvo sobr’elo por espertar o desejo e mostrar o poder que geeralmente avemos, se voontade e saber ouvermos.
Screvendo esto, algtíiis disserom que nom deveria filhar tal cuidado quem outros tantos e tam grandes sempre tem; e desy que esta manha cada htiii per sy a deprende, e porem era scusado sobr’ello screver. A esto respondo por me scusar e dar a outros que taaes obras quiserem fazer regra per a maneira e proposito que sobr’ello tenho, conssiirando o que lii do coraçom do homem, que he semelhante aa moo do moynho, a qual botada per força das auguas nunca cessa de seu andar, e tal farinha dá como a ssemente que mooe. E o coraçom que assy faz obrar como lhe conssentem que mais pensse, e falecendo de hoos cuydados no que he forte de o sempre teer, nom podendo estar que nom cuyde, torna ligeiramente aos maaos, que som nacimento de toda maldade, se algüas vezes lhe nom dam outros em que possa, avendo spaço e folgança, sem mal penssar seer embargado. E ssentyndo esto o vailente emperador Jullyo Cesar, por guardar e reteer seu cuydado, por. muyto que ouvesse de fazer, sempre quando avya spaço seguya o estudo, e algüas obras de novo screvya.
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E veendo que meu coraçom nom pode sempre cuidar no que segundo meu estado seria melhor e mais proveitoso, algüus dias, por andar a monte, caça e camynhos, ou desembargadores nom chegarem a mym tam cedo, estou oucioso, ainda que o corpo trabalhe, por nom filhar em tal tempo algüu cuidado que empeecymento me possa trazer, e por tirar outros de que me nom praz, achey por boo e proveitoso remedio algüas vezes penssar e de mynha niaao screver em esto por requirymento da voontade e folgança que em ello sento; ca doutra guisa nunca o faria, por que bem sey quanto pera mym presta fazello ou leixallo de fazer. Ao[s] que dizem que esta manha sem livro se deprende, digo que he verdade. Mas entendó que a moor parte de todos acharám grande vantagem em leerem bem todo esto que screvo. E por que nom sey outro que sobr’ello geeralmente screvesse, me praz de poer esta scyencya primeiro em scripto, e antremety algüas cousas que perteecem a nossos custumes, ainda que tam aproposito nom venham, por fazer a algüus proveito, posto que a outros pareça sobejo.
E conhecendo que o ssaber dos senhores segundo razom em hüa soo manha nom pode seer muyto avantejado, por certo he que a virtude espalhada he mais fraca que se for ajuntada, mas por averem converssaçom com muytas pessoas de stados e saberes desvairados, de mais cousas que outros, avendo entender natural, razoadamente devem saber: porem a voontade me requere – que algüas ouvy e per mym entendo – que screva, por sse dellas a meu juizo poderem filhar boos avysamentos sem nem hüa perda. E os que esto quiserem bem aprender, leamno de começo pouco, passo, e bem apontado, tornando algüas vezes ao que ja leerom pera o saberem melhor.
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Ca se o leerem ryjo e muyto juntamente como livro destorias, logo desprazerá e se enfadaróm del, por o nom poderem tam bem entender nem renembrar ; por que regra geeral he que desta guisa se devem leer todolios livros dalgüa sciencia ou enssynança». In edição crítica de Joseph M. Piel, Lisboa, 1944.
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