«(…) Na saída, a tripulação dirigiu-lhe os obrigatórios cumprimentos de despedida quando ela passou pela porta de desembarque. Cotten inclinou a cabeça educadamente e exibiu o que sabia tratar-se de um sorriso falso. Mas, no momento, era o máximo que conseguia fazer. Abrindo caminho para o terminal de bagagem, Cotten tirou o telemóvel do bolso. Abriu-o e correu os olhos pela lista de contactos em busca do nome de Paul Davis. Assim que ligou o aparelho, viu o sinal de uma chamada não atendida. Pressionou o botão para consultar a relação de ligações recentes. John Tyler. Só de ver o nome dele seu coração acelerou. Fechou momentaneamente os olhos e, naquele mesmo instante, pôde ver mentalmente aqueles olhos intensamente azuis. Deus, sentia tanto a falta dele! Se ele não fosse padre, com certeza a vida deles seria diferente. Cotten pressionou o botão para responder à ligação de John, mas antes que a chamada se completasse, cancelou-a. Queria conversar com ele só quando pudesse pensar com calma e sem pressa. No aeroporto, caminhando no meio daquela agitação, não era o momento nem o lugar. Voltando à lista de contactos armazenados na memória do telefone, encontrou o número de Paul Davis. Ele era o cinegrafista com quem havia trabalhado na última reportagem, uma mixaria de artigo discutindo se a detecção de fluoreto numa relíquia supostamente antiga deve ser considerada no processo de autenticação. O argumento era que o fluoreto é um complemento actualmente acrescentado à água dos reservatórios e, caso fosse detectado num artefacto, isso deveria provar que se tratava de uma fraude. O oposto a essa teoria era que, quando alguém encontra um artefacto, o que normalmente faz? Lava-o com a água da torneira, portanto, voilà, o fluoreto. O resultado final era que ninguém realmente se preocupava com isso, a não ser um grupinho selecto na comunidade arqueológica que adorava discutir e ironizar sobre picuinhas, um se esforçando para provar que era mais brilhante do que os outros. Simplesmente, era um assunto sem muito interesse para o público em geral. Ela e Paul deram boas risadas ao cobrir a história. Assim, quando surgiu essa nova oportunidade, ela o convidou para ser seu cinegrafista de novo, e ele, por sua vez, convocou Nick Michaels, um amigo e profissional de áudio em tomadas externas, para encontrar-se com eles em Lima. Cotten estava prestes a apertar o botão do telefone para completar a ligação quando ouviu uma voz familiar. Cotten! Ela ergueu a cabeça e viu Paul Davis acenando enquanto atravessava a aglomeração próximo ao portão de desembarque. Cumprimentou-o com um abraço. Paul era alto e magro, de cabelos castanho-escuros. Ele trazia consigo o equipamento de vídeo numa caixa prateada que Cotten reconheceu como sendo a mesma do trabalho anterior, e tinha ao lado um tipo interessante.
Este é o Nick Michaels de quem
lhe falei, disse Paul, apresentando o companheiro. O melhor profissional de som
ao sul de Auburn, no Alabama. Ele faz um delicioso feijão com chili também. Mais baixo e
atarracado que Paul, Nick tinha cabelo castanho e fortemente untado com gel,
para lhe dar uma aparência desalinhada e espetada. Ele exibia um brilho
intrigante e misterioso no olhar. Um Tigre, comentou Cotten, apertando a mão de
Nick. Eu mesma sou uma Lince, nascida e criada no Estado dos Campos Relvados. Eu
não usaria isso contra você, Cotten, retrucou Nick com um sorriso. É justo,
admitiu ela. Quanto tempo temos até o nosso vôo para Cusco? O suficiente para
encarar alguns dos famosos aperitivos pisco
sours de Lima, esclareceu Paul, acenando na direcção de um bar e
restaurante no saguão do aeroporto.
Depois de um vôo rápido para Cusco, o trio embarcou num comboio para o começo de uma viagem de quarenta quilómetros até Machu Picchu, a cidade-fortaleza dos antigos incas, construída no século XV. A subida íngreme e ziguezagueante levou-os primeiro a Aguas Calientes. Cotten desejou que tivessem gastado um pouco e tomado o comboio de luxo, o Hiram Bingham. Mas as paisagens eram de tirar o fôlego, mesmo não conseguindo parar de bater os dentes de frio. Em Aguas Calientes, eles tomaram um autocarro que seguiu por uma estradinha que acompanhava o leito do rio Urubamba antes de subir a montanha por uma série de curvas fechadas até ao destino final a 2.400 metros de altitude entre as nuvens. E aí? Vamos apreciar a paisagem enquanto estivermos por aqui?, perguntou Paul quando desceram do autocarro próximo a Machu Picchu. Acho que não teremos, disse Cotten, enquanto seguiam pelos degraus íngremes até há área de recepção aos turistas. Um guia estará nos esperando no Pavilhão do Templo por volta das duas e meia. E dali até o nosso destino deve dar umas duas horas de caminhada árdua». In Lynn Sholes e Joe Moore, O Último Mistério, 2006, Publicações Europa-América, 2007, ISBN 978-972-105-782-1.
Cortesia de PEuropaAmérica/JDACT
JDACT, Lynn Sholes, Joe Moore, Literatura, Mistério,