«(…) Como nenhuma das irmãs Noirot fez nada tão óbvio quanto gritar ou tropeçar, ou mesmo erguer uma sobrancelha, ninguém que estivesse observando poderia ter imaginado que elas consideravam aquela notícia de extrema importância. Elas continuaram com suas tarefas, servindo às duas damas e a outras pessoas que adentrassem seu estabelecimento. Naquela noite, mandaram a costureira para casa e fecharam a loja. Subiram as escadas para seus humildes aposentos e fizeram uma leve refeição, como de costume. Marcelline contou uma história para a filha de 6 anos, Lucie Cordelia, antes de colocá-la na cama. Lucie dormia o sono dos inocentes, ou o mais inocente possível para uma criança nascida numa família em ruínas, quando as três irmãs desceram as escadas que levavam até o atelier da loja. Todos os dias, um menino de roupas imundas levava para elas o jornal que trazia os mais recentes escândalos tão logo era impresso, em geral, antes que a tinta estivesse seca, e o entregava na porta dos fundos da loja. Leonie pegou o lote do dia e espalhou as folhas pela mesa de trabalho. As irmãs começaram a vasculhar as colunas. Está aqui, disse Marcelline depois de alguns instantes. O conde de L. voltou de Paris ontem à noite… Fomos informados de que certo duque, que actualmente reside na capital francesa, foi avisado, em termos inequívocos, que lady C. estava cansada de esperar pelo prazer… Sua Graça deve voltar a Londres antes das celebrações do aniversário do rei… Noivado a ser anunciado durante um baile na Residência Warford, no fim da estação… Casamento antes do fim do verão. Ela passou a página para Leonie, que prosseguiu a leitura: Se o tal cavalheiro não cumprir seu compromisso, a dama considerará o entendimento como um mal-entendido. Ela riu. Seguem algumas conjecturas interessantes sobre qual cavalheiro será favorecido em seu lugar. Empurrou o jornal na direcção de Sophia, que balançava a cabeça.
Ela seria uma tola em abrir mão
dele. Um ducado, pelo amor de Deus. E um duque solteiro, jovem, bonito e saudável?
Posso contar, num único dedo, quantos desses há por aí. Ela enfiou o dedo
indicador na coluna do jornal. Ele. Fico-me perguntando qual o motivo da pressa,
disse Marcelline. Ela só tem 21 anos. E o que ela tem para fazer, além de ir a
festas, óperas, bailes, jantares, passeios etc.?, comentou Leonie. Uma moça da
aristocracia que tem beleza, nível e um dote respeitável não devia se preocupar
em atrair candidatos. Essa moça… Nem precisou completar a frase. Elas já tinham
visto lady Clara Fairfax em várias ocasiões. Sua beleza era impressionante:
cabelos louros, olhos azuis, pele clara. Suas numerosas qualidades incluíam
alta classe, uma linhagem impecável e um dote esplêndido; os homens se jogavam
a seus pés por onde quer que ela passasse. Nunca mais na vida aquela moça será
capaz de exercer tanto poder sobre os homens como agora, comentou Marcelline. Ela
devia esperar chegar mais perto dos 30 anos para se casar. Imagino que lorde
Warford jamais pudesse esperar que o duque ficasse longe por tanto tempo,
afirmou Sophia. Dizem que ele sempre obedeceu ao marquês, respondeu Leonie. Desde
que o pai dele morreu de tanto beber. Não se pode culpar Sua Graça por fugir.
Talvez lady Clara tenha ficado
ansiosa, argumentou Sophia. Ninguém parecia preocupado com a ausência de
Clevedon, mesmo quando lorde Longmore voltou para casa sem ele. Porque se
preocupariam?, perguntou Marcelline. Todos os consideram noivos. Quebrar o
compromisso com lady Clara seria o mesmo que romper com toda a família. Talvez
exista outro pretendente… Um que lorde Longmore não aprovaria, arriscou Leonie.
Lady Warford não deixaria um ducado lhe escapar, disse Sophia. Que ameaça lorde
Longmore teria usado?, indagou Sophia. Ambos têm fama de serem desvairados e
violentos. Ele não poderia tê-lo ameaçado com um duelo. Matar o duque iria
contra todos os seus objectivos. Talvez tenha ameaçado apenas espancá-lo até ele
perder os sentidos. Isso eu gostaria de ver, disse Marcelline. Eu também,
concordou Sophia. E eu, acrescentou Leonie. Dois homens aristocráticos e
bonitos lutando, disse Marcelline, com um sorriso nos lábios. Como Clevedon
havia partido de Londres várias semanas antes de ela e as irmãs voltarem de
Paris, até aquele momento elas ainda não o haviam conhecido». In Loretta
Chase, Sedução da Seda, 2011, Edições Chá das Cinco, 2016, ISBN 978-989-710-184-7.
Cortesia de ECdasCinco/JDACT
JDACT, Loretta Chase, Literatura,