História e Património
«A
Igreja de São Domingos de Vale de Figueira, concelho de Santarém, oferece aos
seus visitantes a presença de um património artístico de grande interesse. Para
além da arquitectura do seu templo, inclui numerosíssimas peças de vários
géneros artísticos, desde imaginária em madeira, terracota, e marfim, pintura a
óleo e a fresco, retabulística, azulejaria, paramentaria, mobiliário, pratas e
alfaias litúrgicas, entre outras. Significativamente, parte deste património é
oriundo do antigo Convento de Santa Maria de Jesus de Vale de Figueira, da
Província da Arrábida, fundado no século XVII por Henrique de Portugal, e sua
mulher, dona Ana Ataíde, e extinto em 1834, na sequência da revolução liberal.
O património religioso de que
aqui falamos tem vindo a ser beneficiado na última década com intervenções de
conservação e restauro, quase sempre realizadas por profissionais qualificados
e respeitadores das boas práticas, que lhe têm vindo a devolver valor e
autenticidade. Estes trabalhos de beneficiação não seriam possíveis sem a
sensibilidade da comunidade local, e da sua enorme generosidade, que fazem de
Vale de Figueira um caso singular no que respeita à salvaguarda patrimonial. Entendemos
que a recém-valorização deste conjunto de obras de arte impõe agora a
necessidade de um estudo sistemático e da sua divulgação. Este livro visa cumprir
esse objectivo, analisando o património artístico da Igreja de Vale de Figueira
sob o ponto de vista da História da Arte, sensibilizando as pessoas para a sua fruição,
não apenas enquanto peças ligadas ao culto, mas como autênticas obras de arte
que se devem estimar e apreciar. A análise empreendida segue, naturalmente, a
metodologia própria da História da Arte, integrando a investigação dos arquivos
(em muitos casos, trazendo à luz documentos inéditos), os dados resultantes das
intervenções de conservação e restauro, e o estudo estilístico, iconográfico e
comparativo das obras de arte.
Importa referir que embora
praticamente desconhecido no contexto da historiografia da arte portuguesa, o
património de arte sacra da paróquia de São Domingos de Vale de Figueira
mereceu referências pontuais em publicações científicas que devemos mencionar.
Em primeiro lugar, encontram-se as notícias de Gustavo Matos Sequeira no tomo
do Inventário Artístico de Portugal
da Academia Nacional de Belas Artes dedicado ao Distrito de Santarém, de
1949, com um recenseamento superficial das existências. Os demais estudos
dignos de registo são sobretudo análises sectoriais, referentes ao património
azulejar e retabulístico da igreja. No que se refere ao primeiro destacam-se as
palavras de João Miguel Santos Simões, na obra pioneira Azulejaria em Portugal no século XVIII,
publicada em 1979, sem esquecer o recente contributo de Maria Rosário Salema Carvalho,
na sua tese de doutoramento, ainda inédita (Carvalho, 2012, Anexo B:
1260-1267). No campo da retabulística merece referência o estudo colectivo
orientado por Irina Crina Anca Sandu (2012), com uma análise multidisciplinar
das técnicas e materiais utilizados no douramento do retábulo-mor e dos
retábulos laterais.
Permanecendo no terreno da
conservação e restauro, sublinhe-se o artigo de Carlos Costa (2017) sobre o
restauro da escultura com a imagem do padroeiro, São Domingos Gusmão. Para além
destes trabalhos, registe-se a ficha de inventário do património arquitectónico
do SIPA/IHRU com o número IPA.00006781, da autoria de Paula Figueiredo, e o
inventário dos bens móveis realizado pela Comissão Diocesana para os Bens
Culturais da Igreja, da Diocese de Santarém, elaborado por Eva Raquel Neves. Embora
apoiado nos estudos destes pesquisadores, o presente livro resulta, sobretudo,
de um estudo aturado de novas fontes de informação, em alguns casos virgens de
aproveitamento e ricas de informação histórica e artística, e da investigação
pessoal.
Embora
os primeiros registos de ocupação humana no território que hoje é conhecido
como Vale de Figueira, no concelho de Santarém, nos reportem a períodos recuados
do Paleolítico, do Calcolítico, da Idade do Bronze, da Idade do Ferro e da
época Romana, que se localizam especialmente no campo arqueológico de Chões de
Alpompé, é somente nos começos do século XIV que vamos encontrar referências
explícitas a um pequeno povoado no lugar de Vale de Figueira, no termo de
Santarém. Nascido provavelmente à sombra das numerosas quintas e casais que
vieram a existir neste espaço, propriedades das elites urbanas, continuará a
crescer ao longo do tempo, quando em 1527 assume estatuto de aldeia, com número
populacional ascendendo a mais de duas centenas de habitantes. É possível que
os frades dominicanos, residindo em Santarém, onde fundaram convento no século
XIII, tenham incrementado a vida religiosa neste lugar, razão pela qual se
ergueu ermida, dedicada ao Patriarca São Domingos, no local onde hoje se situa
a igreja paroquial. Na recolha que pudemos apurar, a mais antiga referência a
esta ermida, e seu orago, remonta ao ano de 1537, numa Mercê de João III aos
mordomos de São Domingos do termo de Santarém de uma ração (ANTT, Núcleo Antigo
887)». In Tiago Moita, A Igreja de São Domingos de Vale de Figueira, Santarém,
2019, Design Gráfico e Paginação, David Matos Branco, Depósito Legal 453685/19.
Cortesia de DGePaginação/DavidMBranco/JDACT
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