Com a devida vénia ao Doutor José Carlos Gimenez
De Infanta Aragonesa a Rainha a Rainha de Portugal
«(…) Foi no contexto dessas
divergências contra a nobreza e o clero que a rainha Isabel e dom Dinis
haveriam de enfrentar seus primeiros anos como rainha e rei. Com o objectivo de
realizar um entendimento político com o papado, o monarca português promoveu
uma série de emendas à Corte com esse objectivo. Essa tentativa pode ser
percebida igualmente por meio de uma carta que dom Dinis enviou ao Papa Martinho
IV (1281-1285) solicitando que fossem suspensas as interdições que recaíam
sobre o reino de Portugal. Como já havia ocorrido com Inocêncio IV (1243-1254),
o papa Martinho IV (1281-1285) e seu sucessor, Honório IV (1285-1287)
notabilizaram-se pelas suas acções nos assuntos políticos de diversos reinos. O
primeiro ficou famoso pelos atritos com os Hohenstaufen da Alemanha na luta pela
posse da Sicília. O segundo e o terceiro apoiaram abertamente a França,
inclusive oferecendo a ela o reino da Sicília contra Aragão que naquela altura
também se apresentava como herdeiro da ilha devido ao casamento de Pedro III,
pai da Rainha Isabel com Constança, filha de Manfredo Hohenstaufen.
Ao Santíssimo Padre, & senhor Dõ Martinho pela prouidencia de Deos
Summo Pontifice da Santa Igreja de Roma, Dionysio pela graça de Deos Rey de
Portugal, & Algarue, beja os pés bemauenturados. Porque na terra tendes
plenariamente as vezes de aquelle que he paz nossa, fazendo de ambas as
repubicas de Céu, & terra huma, o medianeiro entre Deos, & homes
Christo Iesu: não duuidamos que tambem voz alegraes entranhauelmente nas cousas
que encaminhão â paz de Ierusalem a Santa Madre Igreja. Por esta causa determinamos
manifestar a alteza de vossa Santidade, que promulgando em tempo passado o
senhor Papa Gregorio Decimo de santa memoria, com conselho de seus irmãos, hua
ordenação, ou prouião contra nosso pay Dom Afonso (...) & sendo tem tenção daquele
Papa expressada na mesma prouisão, que nos comprehendesse ella tambem a nos.
Finalmente despois de morto o dito nosso pay, (...) considerando o estado dos
Reinos Sobreditos, & em particular por respeito da profunda destruição das
almas de seus naturaes, as quaes de longo tempo atras estão priuados da douçura
da graça dos Sacramentos…
A falta de boas relações com Roma
e com seus representantes locais provocava grande instabilidade política para
Portugal naquela época, pois a excomunhão seguida da interdição era uma arma
utilizada pelos Papas contra os poderes laicos. A excomunhão afastava os pecadores
da vida em comunhão, e o interdito recaía sobre os que possuíam poderes
políticos no momento da excomunhão e privava os territórios, que estavam sob
seus domínios, dos ofícios religiosos e administração dos sacramentos, entre
outros. Segundo Félix Lopes, quando Dinis se casou com a Infanta Isabel
de Aragão, no reino português, as igrejas mantinham suas portas fechadas e os
fiéis encontravam-se privados das bênçãos e dos actos solenes. Porém, a
interdição do Papa não impediu que o casamento fosse realizado com
magnificência pública e muitos festejos. Ainda segundo esse autor:
...fez-se bodas, grandes e ruidosas, com os
velhos ricos-homens trovadores e os moços trovadores, criados com o moço rei, à
compita nos jogos de armas e cantares, nas alegrias e folguedos. E os festejos
prolongaram-se em Trancoso por todo o mês de Julho. Depois a corte passou à
Guarda onde ainda demorava a 18 de Setembro.
Essas alianças matrimoniais
ganhavam ainda, significados políticos quando realizadas sob o amparo da Igreja
e o reconhecimento público dos súbditos dos reinos envolvidos. Muitas vezes,
elas iniciavam-se no privado, com longas negociações que envolviam os dois
lados interessados, representados pelos elementos mais ilustres dos dois reinos».
In
José Carlos Gimenez, A Rainha Isabel
nas Estratégias Políticas da Península Ibérica 1280-1336, Teses de
Doutoramento, UF do Paraná, Ciências Humanas, 2005.
Cortesia de UFParaná/CHumanas/JDACT
JDACT, José Carlos Gimenez, Caso de Estudo, Península Ibérica, Rainha Isabel,