Com a devida vénia ao Doutor Jorge Duque Fernandes
«Na revalorização crescente da contribuição das mulheres para o saber e para a sociedade; e no questionar das razões que levaram à sua quase exclusão do discurso historiográfico, continuava, porém, a impor-se a omissão dos historiadores sobre as escritoras portuguesas. Os números assim o confirmam: nos manuais de história da literatura portuguesa publicados até hoje a percentagem das autoras referidas, anteriores ao século XX, varia entre os 3% e os 5%. Assim se explicará que os investigadores que trabalham sobre a autoria feminina portuguesa não se debrucem sobre aquelas escritoras, mas antes sobre as da contemporaneidade, cronologicamente situadas depois de 1900.
Considera-se mesmo que as autoras
omissas na história da literatura portuguesa e, em consequência, a presença de
autores do sexo masculino fez com que esta última fosse considerada a autoria
literária por excelência. Isto explicará o desinteresse geral das instituições
e academias em dedicar-se a projectos que visem as escritoras anteriores ao
século XX. Vanda Anastácio aponta que: Tende-se a pensar que
o que não se vê não existe. Que o que não foi dito se apagou, afogado em silêncio. Mas as
mulheres estão muito presentes no discurso dos autores do passado, nomeadamente
sobre o cultivo das virtudes e sobre os perigos que o saber induziria no seu
sexo, suposto como propenso à fragilização daquelas.
As
mulheres, afinal, estão também noutros textos, manuscritos e impressos, que
jazem nas bibliotecas e arquivos, sem que, ao longo de séculos, a investigação sistemática
lhes revelasse os nomes e as obras, por géneros, nomeadamente as que escreveram
paratextos e reinvindicações de autoria, como a Senhora dona Filipa (1435-1497),
filha do Infante Pedro, Duque de Coimbra, e da Infanta dona. Isabel, condessa
de Urgel, autora do século XV, dona Leonor Noronha
(1488-1563), Luísa Sigeia (1522-1560), Públia Hortênsia Castro (1548-1595),
Soror Maria do Baptista (1570-1595), Soror Maria Mesquita Pimentel (†1639), dona Joana Josefa Meneses, condessa da Ericeira (1651-1709),
Teresa Margarida Silva Orta (1711-1792), Soror Benta do Céu (viva em 1766),
Rita Clara Freire Andrade (1758-d. 1791), Francisca Possolo Costa (1783-1838) e
dona Leonor Almeida Portugal Lorena Lencastre, marquesa de Alorna (1750-1839).
E as que escreveram sobre mística, como Soror Mariana da Purificação
(1623-1695), Soror Isabel do Menino Jesus (1673-1752), a autora que estudamos;
e Soror Mariana Josefa Joaquina de Jesus (†1783). E as que
foram autoras de regras de vida, de ditos, sentenças e máximas8, como a Senhora
dona Maria (1538-1577), filha do Infante Duarte e da Infanta dona Isabel, duques
de Guimarães, mulher de Alexandre Farnésio, duque de Parma e
Piacenza; dona Joana Gama (†1586) e Soror Maria do Céu (1658-1753). E as que
escreveram ficção narrativa, como Soror Madalena da Glória (n. 1672), Soror
Maria do Céu (1658-1753), Soror Joana Josefa dos Serafins (†1722),
Maria Clara Júnior (†1816) e, novamente, Francisca Possolo Costa.
E as que escreveram memórias biografias e autobiografias, como a referida Soror
Mariana da Purificação, Soror Antónia Margarida de Castelo Branco (1652-1717);
de novo, Soror Benta do Céu, e dona Mariana Bernarda Távora, condessa de
Atouguia (1722-d.1788). E as que escreveram prosa histórica, académica e de
circunstância, como dona Maria Micaela Prazeres (†1761) e dona Mariana
Vitória Atalaia Colaço Castelo Branco (†1783). E as que
produziram no género epistolográfico, como a rainha dona Catarina (1507-1578),
mulher de João III; a Infanta dona Maria (1521-1577), filha do rei Manuel I e da rainha
dona Leonor; de novo, Luísa Sigeia, a Senhora dona Maria,
duquesa de Parma; e dona Leonor Almeida Portugal Lorena Lencastre, marquesa de
Alorna; Soror Violante do Céu (1658-1753), dona Joana Vasconcelos Meneses (c.
1625-1653), dona Isabel Castro, condessa de Assumar (1665-1724), dona Leonor
Tomásia Távora, marquesa de Távora (1700-1759), Soror Maria Joana (1712-1724),
Soror Feliciana Maria Milão (1632 ou 1639-1705), dona Filipa Noronha († séc.
XVIII), rainha dona Mariana Vitória (1718-1781), mulher de José I; dona Teresa
Josefa Melo Breyner, condessa do Vimieiro (1739-d.1793); e dona Joana Isabel Lencastre
Forjaz (n. 1745)». In Jorge Duque Fernandes, Soror Isabel do Menino Jesus, Vida e Obra de
uma Escritora Mística 1673-1752, Tese para obtenção do grau de Doutor em
História, 2016, Universidade de Lisboa, Faculdade de Letras, Fundação para a
Ciência e Tecnologia, SFEH/BD/79496/2011.
Cortesia de FCT/CMM/BMP/JDACT
JDACT, Jorge Duque Fernandes, História, Religião, Literatura, Caso de Estudo,