A Inquisição medieval
«Vejamos
o que diz: Onde quer que os ocorra pregar, estais facultados, se os pecadores
persistem em defender a heresia apesar das advertências, a privá-los para
sempre de seus benefícios espirituais e proceder contra eles e todos os outros,
sem apelação, solicitando em caso necessário a ajuda das autoridades seculares
e vencendo sua oposição, se isto for necessário, por meio de censuras
eclesiásticas inapeláveis.
Vale lembrar que os dominicanos
eram chamados originalmente de Ordem dos Pregadores. Têm como objectivo pregar
a mensagem de Jesus e a conversão ao cristianismo. Essa ordem foi fundada em
Toulouse, na França, em 1216, por São Domingos de Gusmão, um sacerdote espanhol
originário da Caleruega. Os religiosos dessa ordem viviam em conventos próximos
a grandes cidades e realizavam votos de pobreza, obediência e castidade, o que
os tornava religiosos não monges. Não é à toa que Humberto Eco escolheu
Bernardo Gui, justamente um dominicano, para caracterizar seu inquisidor
impiedoso. Essa figura histórica foi o bispo de Lodève, na região do Languedoc,
e é considerado como um dos escritores mais produtivos da época.
A exemplo de muitos outros
inquisidores, inclusive do polémico Savonarola, foi poderoso, temido e
respeitado dentro e fora do ambiente eclesiástico por defender seus ideais com
ferocidade. Foi um dos que mais atacou os cátaros, presidindo julgamentos entre
1307 e 1323.
Outra
visão da Inquisição
Analisando os factos, é difícil
pensar que alguém se atreveria a defender a Inquisição (maldita). Mesmo assim, o
professor de filosofia Roman Konik, ligado à Faculdade de Filosofia da Universidade
de Wroclaw, na Polónia, e autor do livro Em Defesa da Santa Inquisição arrisca essa posição.
Seu livro despertou muito interesse, mas sofreu boicotes de livrarias, por
causa da má fama que a Inquisição (maldita) tem até hoje. Em entrevista
concedida à revista eletrónica Catolicismo
ele comentou sobre a obra de Umberto Eco: Na mente do homem de hoje, há uma
ideia comum que considera o inquisidor como um velho monge encapuzado com
inclinações sádicas, inflamado do desejo de autoridade. O melhor exemplo disso
é a figura de Bernard Gui, inquisidor de Toledo, descrito pelo conhecido
medievalista italiano Umberto Eco em seu livro O Nome da Rosa. Pior ainda é a imagem apresentada no
filme realizado com base em tal obra.
Bernard Gui, como figura
histórica real, foi inquisidor de Toledo e durante 16 anos exerceu esse cargo.
Julgou 913 pessoas, das quais apenas 42 ele entregou ao tribunal civil como
perigosos rebeldes (reincidentes, pedófilos, criminosos), o que não significava
absolutamente pena de morte para eles. Em muitos casos, Gui indicava tratar-se
de doença psíquica, suspeição de heresia, desistindo de interrogatórios.
Segundo a visão preconceituosa
dos protestantes, é certo que essas pessoas iriam para a fogueira, ao contrário
da verdade histórica. E importante registar que escritores protestantes, pouco
simpáticos à Inquisição (maldita), começaram a
escrever a história dela de maneira desfavorável, apresentando-a deformada.
Também nas expressões artísticas das épocas posteriores à medieval verificou-se
um reflexo dessa visão caricatural. Mas basta analisar o mundo artístico
medieval para observar quadros que apresentam São Domingos convertendo os
hereges, São Bernardo de Claraval discutindo com eles, ou então pinturas de
inquisidores mártires morrendo nas mãos de hereges, por exemplo, o martírio de
São Pedro de Verona, ou de São Pedro de Arbués, assassinado na catedral de
Zaragoza». In Sérgio Pereira Couto, Os Arquivos Secretos do Vaticano, Editora
Gutenberg, 2013, ISBN 978-856-538-385-1.
JDACT, Sérgio Pereira Couto, Vaticano, Religião, Conhecimento,