O Interesse pelo Norte de África
«(…) A conquista das cidades e as incursões nos campos e aldeias eram aproveitadas para recolher o produto do saque de tudo o que tinha valor: alfaias, gado, cereais. Cada um dos contendores procurava fazer cativos, a fim de obter o dinheiro dos resgates. As praças serviam de base a uma importante actividade de corso feita ao serviço do rei ou dos nobres. Barcos pesqueiros ocupavam-se na exploração dos ricos bancos da orla marítima marroquina. Os períodos de paz eram aproveitados para as trocas comerciais com os diferentes produtos do país, os importados do Sudão, como o ouro e os escravos, ou as especiarias do Oriente. A indústria de tecidos, em particular os destinados ao vestuário e utilizados também para a cobertura durante a noite, assumiu uma importância decisiva depois da instalação dos portugueses em Arguim (cerca de 1448) e na Mina (depois de 1481) porque os Negros estavam habituados a utilizá-los. Ficaram célebres os lambéis como referiu Duarte Pacheco Pereira no Esmeraldo: uma roupa feita como mantas do Alentejo, que tem uma banda vermelha e outra verde e outra azul e utra branca, as quais bandas são de largura de dois e três dedos (...) E esta é a principal mercadoria por que se em Axem resgata o dito ouro, além de outras de menos valia que também praticamos. A obtenção de cereais em Marrocos foi muito aleatória porque estava dependente das colheitas, que nem sempre eram abundantes, e da situação de guerra ou de paz com as diferentes praças. Em 1414, um ano antes da conquista de Ceuta, os Portugueses venderam trigo no reino de Fez. Durante a maior parte do século XV assistimos ao abastecimento das praças lusitanas a partir da Europa. A paz de 1471, o protectorado na região de Azamor, Safim e Meça e o período dos mouros de pazes trouxeram tributos em cereais e outros produtos, além do incremento das compras e do comércio em geral. A reacção xarifina comprometeu quase definitivamente essa época promissora. Os diferentes estratos sociais tinham vantagens económicas com a colonização das praças da África do Norte. A exploração das terras era fonte de rendimentos. Afonso V procedeu a generosas doações no território que lhe pertencia nos termos da paz de Os cargos militares e civis eram asperamente disputados. Os reis favoreciam com moradias, comendas e outras benesses os que se dispunham a servir em África. Os burgueses interessavam-se pelos contratos de abastecimento das diferentes praças, associando-se, se necessário, a comerciantes estrangeiros. Devemos insistir neste aspecto: o interesse pela África do Norte não se restringia à Coroa, aos grandes nobres ou à alta burguesia. Grande número de particulares, pequenos comerciantes, pescadores e artesãos mantinham relações privilegiadas com Marrocos. Eram homens comprometidos com o abastecimento em víveres, armas, materiais de construção e outros produtos necessários à vida naquelas fronteiras e ao provimento das armadas que ali se dirigiam. Os pescadores algarvios habituaram-se a frequentar os ricos mares das costas marroquinas. O contrabando de todo o género de mercadorias, incluindo as proibidas, como as armas florescia nos portos portugueses, em especial do Algarve. Procuravam obter produtos diversos, como as especiarias, que, embora em quantidades diminutas, afluíam aos mercados norte-africanos. Este comércio fomentava o gosto pelos produtos exóticos que se desenvolvia em Portugal e em toda a Europa». In António Dias Farinha, Os Portugueses em Marrocos, Instituto Camões, Colecção Lazúli, IAG, Artes Gráficas, ISBN 972-566-206-7.
JDACT, D. João I, Ceuta, António Dias Farinha, Marrocos,