segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

A Bela Poesia: Pero de Andrade Caminha. «Divino e repousado movimento, e muito mais qu'esta em minh'Alma escrito, me tem num puro amor todo desfeito»

Cortesia de ateneulivros

Soneto
Quando cuido senhora, quanto escrevo
Tudo em vossos fermosos olhos leo,
Neles, ante quem tudo é escuro e feo,
Aprendo, e vejo como amar-vos devo.

Vejo, que ò vosso amor todo me devo,
Mas não vos sei amar, e assi m'enleo
Que não sei se vos amo, ou se o receo,
E a julgar em mim isto náo m'atrevo.

Em vós cuido, em vós falo o dia e hora,
Mouro por ver-vos, ir-vos ver não ouso
Por não ver quanto mais devo do que amo.

Ò sol e à sombra o vosso nome chamo,
Fora destes cuidados não repouso,
S'isto é amor vós o julgai senhora.

Cortesia de shopcosis

Soneto
Rosto que a branca rosa tem vencida
E ante quem a vermelha é descorada,
Olhos, claras Estrelas, que espantada
Tem alma, aceso o peito, presa a vida.

Cabelos, puros raios, que abatida
Deixam da Manhã clara a luz dourada,
Divina fermosura, acompanhada
Da virtude a poucos concedida.

Palavras, cheias d'alto entendimento,
Raro riso, alto assento, casto peito,
Santos costumes, vivo e grave esprito.

Divino e repousado movimento,
E muito mais qu'esta em minh'Alma escrito,
Me tem num puro amor todo desfeito.


Cortesia da Fundação Calouste Gulbenkian/JDACT