domingo, 3 de julho de 2011

Bocage. Sonetos: Período da Vida Militar. «Tua cândida mão, teu pé mimoso, tuas mil perfeições, crer que a ventura as guardas para mim, fora loucura; nem sou digno de ti, nem sou ditoso»

Cortesia de befelgueiras

O Colo de Marília
Mavorte, porque em pérfida cilada
o cruel moço alígero o ferira,
não faz caso da mãe, que chora e brada,
quer punir o traidor, que lhe fugira;

Na sinistra o pavez, na dextra a espada,
nos ígneos olhos fuzilante a ira,
Pula à negra carroça ensanguentada,
que Belona infernal coas fúrias tira:

Assim parte, assim voa; eis que vê posto
no colo de Marília o deus alado,
no colo aonde tem mimoso encosto:

Já Marte arroja as armas, e aplacado
diz, inclinando o formidável rosto:
«Valha-te, Amor, esse lugar sagrado!»
Bocage, «in período da vida militar»

Celebra as perfeições de Marília
Não, Marília, teu gesto vergonhoso,
a luz dos olhos teus, serena e pura,
teu riso, que enche as almas de ternura,
agora meigo, agora desdenhoso:

Tua cândida mão, teu pé mimoso,
tuas mil perfeições, crer que a ventura
as guardas para mim, fora loucura;
nem sou digno de ti, nem sou ditoso:

E que mortal enfim, que peito humano
merece os braços teus, ó ninfa amada?
Que Narciso? que herói? Que soberano?

Mas que lê minha mente iluminada!...
Céus!... Penetro o futuro!... Ah, não me engano;
de Jove para o toro estás guardada.
Bocage, «in período da vida militar»


Cortesia de Europa-América/JDACT