Colégio das Artes, Coimbra
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«A sede natural da tragédia portuguesa, e ao mesmo tempo o seu ermo, era naquele tempo a Universidade. No Colégio Real de Coimbra, depois «das Artes», tinham sido representadas as primeiras tragédias em latim, que conheceram uma época áurea após a chegada a Coimbra de Jorge Buchanan, em 1547, proveniente de Bordéus. Este escocês vinha ensinar retórica e depositava grandes esperanças na representação pública das suas adaptações de Eurípides, um Alceste e uma Medeia, e sobretudo na das suas tragédias originais, o Jephthes e o Baptistes, já levadas à cena em Bordéus, como recorda Montaigne nos Éssais, se bem que só mais tarde impressas:
- a primeira em Paris (1554),
- a segunda em Londres (1577).
A lição do Jephthes sobretudo, aquele seu vestir de formas clássicas uma matéria bíblica, devia ser exemplar para literatos portugueses que estavam a absorver por todos os poros a essência da tragédia clássica. Os viajantes de regresso de Itália traziam os ecos da Sofonisba, de Trissino, e da Rosmunda, de Rucellai: João Barreira, o famoso editor de Lisboa, alternava a edição de autos da escola vicentina com outras da Fedra, do Hipólito, do Hercales Furens. E sob o impulso de André de Gouveia, que tinha sido reitor do Colégio de Guienne, em Bordéus, antes de vir orientar o Colégio de Coimbra, inaugurara-se nesta cidade a nova era do teatro humanístico. Além dos textos de Buchanan, foram seguramente representados dramas de Muretus e de Diogo de Teive, humanista português destinado a compartilhar com o escocês acusações de heterodoxia e de calvinismo e a consequente sentença da «maldita, jdact» Inquisição.
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A obra dramática de Teive também tinha raízes bíblicas, de um seu Golias, levado à cena em 1550, no mosteiro de Santa Cruz, em presença de D. João III, as crónicas retêm nomeadamente a excelência dos coros, mas já se movia no clima próprio da tragicomédia a que os jesuítas hão-de dar dentro em pouco a mais vistosa forma espectacular; género que o próprio Teive ilustrará ainda com outra peça, o Johannes Princeps, comemorativa da morte do príncipe D. João.
Confinado na Universidade e refreado pelo pedantismo académico, este teatro, que continuará por todo o século XVII e ao qual voltaremos adiante, tinha por força de resultar desagradável ao grande público: as roupagens latinas e a pesada ideologia não contribuíam de resto para o popularizar. Contudo, não se lhe pode negar um mérito: o de ter acostumado o luso paladar à tragédia clássica, suscitando uma obra-prima como a Castro». In Luciana Stegagno-Picchio, Teatro Clássico de Quinhentos, Fundação Calouste Gulbenkian, 2003, ISBN 1645-5169.
NOTA: Diogo de Teive. Humanista português do Renascimento, nascido em Braga nos princípios do século XVI. Foi um dos primeiros portugueses a receber uma bolsa de estudo para estudar em Paris. Leccionou na Universidade de Paris, no Colégio de Guiena, do qual André de Gouveia era reitor, e na Universidade de Coimbra. A convite de D. João III, fez parte do corpo docente do Colégio das Artes. Foi preso pela Inquisição em 1550, acusado de heterodoxia religiosa. Libertado ao fim de um ano, regressou ao Colégio das Artes, vindo a tornar-se seu director. Escreveu tragédias e diversos ensaios de interpretação histórica e filosófica, sempre em latim. In Infopédia.
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