Marsupiais
Cortesia de enciclopediabritanica
Linha de Wallace
Cortesia de wikipedia
(Continuação)
Mesmo áreas mais isoladas das florestas húmidas estão a sofrer os efeitos do aquecimento global.
«Em zonas da Amazónia situadas bastante longe de qualquer influência humana directa, a proporção de árvores que constitui o dossel da floresta está a mudar. Estimuladas pelo aumento dos níveis de CO2, as espécies de crescimento rápido estão a crescer mais, tirando espaço às plantas de crescimento lento. Isto diminui a biodiversidade da floresta húmida, já que as aves e animais que dependem da flora de crescimento lento para se alimentarem desaparecem, juntamente com os seus recursos.
Uma das mais importantes divisões naturais no nosso planeta é a «Linha de Wallace». A oeste situa-se a Ásia com os seus tigres e elefantes, enquanto que a este situa-se uma região, no centro da Austrália, conhecida como «Meganésia», a qual tem uma flora e fauna únicas, incluindo muitos «marsupiais».
O habitat mais rico da Meganésia são as florestas de carvalhos das montanhas da Nova Guiné. Durante a estação em que esta árvore dá frutos, o rico húmus do solo da floresta fica coberto com bolotas castanhas, grandes e brilhantes. Se apanharmos uma o mais provável é descobrirmos que foi mastigada, porque neste lugar como em mais nenhum existe um número incomparável de «gambas» e «ratos-gigantes», e estes animais adoram petiscar bolotas.
Gato marsupial
Cortesia de wikipedia
Gambá
Cortesia de g1globo
Em 1985, quando vi pela primeira vez estas incríveis florestas, no vale de Nong River a norte de Telefomin, perto do centro da ilha, as mesmas estendiam-se diante dos meus olhos ao longe, contrastando com o azul do horizonte, intocavelmente primitivas. Fui o primeiro mamalogista a trabalhar naquela área, um privilégio raro. Ali habitavam muitas espécies fora do comum, algumas das quais exclusivas daquela região e desconhecidas da ciência. Uma dessas criaturas era um «gamba» acinzentado do tamanho de um gato, com grandes olhos castanhos, pequenas garras e uma curta cauda, conhecido pelos habitantes de Telefol, que por vezes iam até ao vale para caçar, como «matanim». Falando com caçadores, fiquei a saber que este animal tem uma curiosa alimentação à base de folhas de figueira, fruta e raízes apodrecidas de certas árvores. A região de Nong não é propriamente o lugar mais acessível do mundo, por isso, em 2001, quando tive oportunidade de regressar, não hesitei. Podem imaginar como eu estava entusiasmado mas, mesmo antes de o helicóptero aterrar, o meu entusiasmo desabara. O vale inteiro, juntamente com os picos circundantes, tinha-se transformado numa vasta alameda de jazigos vegetais.
Telefomin
Cortesia de thewebsiteofeverything
Mais tarde, os meus velhos amigos de Telefol contaram-me que durante o segundo semestre de 1997 pouco ou nada chovera, apenas penosas geadas caíram agressivamente do céu sem nuvens, matando as árvores.
Por altura do Ano Novo, o que restava da floresta eram apenas bocados queimados e retorcidos, e o chão estava coberto de folhas mortas. Ao chegar, o fogo atravessou rapidamente o vale, subindo até aos picos circundantes. Ardeu durante meses, e mesmo um ano depois podia reacender-se a partir do musgo e da matéria vegetal morta enterrada em profundidade.
Estes acontecimentos tinham devastado a região, expulsando os animais selvagens dos seus esconderijos. A quantidade de mandíbulas de marsupiais como troféus, na posse -de caçadores, mostra que a catástrofe ambiental tinha permitido que os mais intocáveis refúgios ficassem acessíveis a humanos. Centenas de mandíbulas de criaturas maiores e mais raras, como cangurus das árvores, gambás e ratos gigantes, pendurados em lareiras, provam que até aos caçadores medíocres o êxito foi garantido.
Perguntei a mim mesmo se, penduradas entre aqueles troféus, estariam as mandíbulas do último «matanim» da Terra?
Seriam necessários anos de pesquisa até confirmar a presença ou ausência de um tão raro e esquivo animal. Mas depois do que vi em 2001 ao visitar a região, acredito que, se ele sobrevivesse, isso teria de ser considerado um milagre». In Tim Flannery, O Clima está nas Nossas Mãos, História do Aquecimento Global, Oficina do Livro-Estrela Polar, 2008, ISBN 978-972-8920-93-0.
Cortesia de Oficina do Livro/JDACT