terça-feira, 6 de setembro de 2011

Aurélio de Oliveira. Cartas de Etiópia. «He verdade que naquelles principios os nossos deram a isto algua occasiãm pollas violencias de que muitos uzavam fazendo menos cazo dos Abexins E chegando alguns a lhes tomar Suas próprias molheres»

Cortesia de livrariaai

NOTA: De acordo com o texto original

Informação de como viveram os portugueses e seus descendentes na Etiópia (1657)
Como viverão em Ethiopia os Portugueses que lá passaram e seus descendentes
«Pareceo-me necessario dar esta noticia porque os Historiadores que escrevem as couzas desta terra fallam nesta materia com muita variedade, da qual pode nascer confusam. E, primeiramente, he certissimo que nenhumas Companhias de gente Portugueza Entraram no imperio Abexim mays que os 400tos soldados que acompanharam a D. Christovam da Gama E libertaram aos Abexins do jugo mahometano quando Granha lhes tinha posto. Antes de D. Christovão E sua gente somente tinha entrado Affonso De Paiva e apoz Elle que la viveo E morreo desde o ano de 1491 em que entrou ate o de 1522 no qual achando la o Padre Francisco Alvares E entrou este Padre con D. Rodrigo de Lima Embaixador d'El Rej D. Manoel com doze ou treze homens que o acompanhavam e os quaes todos voltaram com Elle no anno de 26 tirando dous como o conta o Padre Francisco Alvares no seu livro. No anno de 1555 entrou o Padre Mestre Gonçalo Roiz com o irmão Fulgenceo Freire de nossa Companhia que logo voltarão no seguinte ano de 56 E no de 57 Entrou o Bispo que despois ficou Patriarcha, D. Andre de Ouviedo, E com elle seus sinco Companheiros de nossa Companhia E juntamente 7ou 8 Portuguezes que por Sirviço de Deus o quizeram accompanhar. Isto digo para que se saiba o pouco fundamento com que se Escreveo Em Valença que Entraram neste império humas companhias de Letrados legistas outras de Iudeos Portuguezes e as muitas patranhas que sobre isto se fingiram com pouco temor de Deos E menos respeito ao decoro devido à Naçam portugueza.

Cortesia de olavilnius

Os portuguezes que ficaram Em Ethiopia da Companhia de D. Christovam que seriam ate 170, Emquanto viveo o Emperador Gladios foram delle tratados E aposentados com muita liberalidade Em terras largas Em que lhes athirou suas comedias. E ahi viviam em abstança conforme a terra tendo quazi todos mulas, cavallos e muitos criados que os acompanhavam na paz e na guerra e assi conta Diogo do Couto na Decada 7ª a 56. Quando Entrou Em Ehtiopia o B.D. Andre de Oviedo, que então Era Bispo somente porque vivia na India o Patriarcha de D. ]oão Nunez Barreto a quem lhe succedeo na dignidade Patriarchal. Nesta Entrada digo que foy no anno de 1557. Todos Portuguezes o receberam e agazalharam no caminho e o acompanharam ate a Corte ou Arrayal do Emperador todos muito lustrozamente vestidos, Encavalgados E acompanhados de muitos criados.

Porem, como diz o mesmo Diogo do Couto E consta pello que attaz escrevemos, no tempo do Emperador Adamas Çagued foram os Portuguezes muito desfavorecidos E muitos delles persiguidos do mesmo Emperador E assi foram caindo Em mizerias e falta do necessario. Durou pouco Adamas Çagued. Entrou no Imperio Seu filho Malu Çagued que reinou 33 annos. Este tratou melhor aos Portuguezes, mas não tanto que chegasse a liberalidade que com elles uzou o Emperador Gladios. E o certo que he que os Abexins geralmente mostraram sempre muita pouca feiçam aos Portuguezes assi por serem Estrangeiros como por invejas que sempre tiveram a Seu Esforço.

Cortesia de expressodasilhassapocv

He verdade que naquelles principios os nossos deram a isto algua occasiãm pollas violencias de que muitos uzavam fazendo menos cazo dos Abexins E chegando alguns a lhes tomar Suas próprias molheres. Contudo a principal rezão da pouca vontade que lhes tinham foj sempre terem os nossos por Errados na Fee, julgando os seus erros por verdades E as nossas verdades por Erros E Heregias. O que lhes dava muito nos olhos Era verem que os nossos não se circuncidavam E comiam lebre e Coelho E assi os chamaram sempre incircumcisos E Hereges Nestorianos.

He costume de Ethiopia, como acima disse no primeiro livro, tirar o Emperador muitas vezes as terras aos Senhores Capitais E Soldados a que as tem dadas. Este Costume exerceram os Emperadores muitas vezes com os Portuguezes E seus filhos que 1á viviam de maneira que ordinariamente lhe davão pera sua comedia algumas terras fronteiras aos mais fortes inimigos do Império aonde nunca tivessem Em paz E andassem perpectuamente com a lança na mão. E assi as terras que lhes athiraram foram humas no Reino de Boaro, nos confins do Reino Adel, cujos mouros foram sempre os que maior guerra fizeram aos Abexins». In Aurélio de Oliveira, Cartas de Etiópia, Câmara Municipal de Vila Verde, edição Livraria AI, 1999, ISBN 972-571-446-6.

Cortesia da CM de Vila Verde/JDACT