quinta-feira, 8 de setembro de 2011

O Papado e Portugal no primeiro século da História Portuguesa: Carl Erdmann. «Não sucedia assim em Coimbra. Aqui o bispo Paterno, entre 1080 o 1087, se não possuía toda a sua diocese que se encontrava ainda em parte ocupada pelos mouros, tinha conseguido sujeitar à sua jurisdição as sés de Viseu e Lamego. Mas é preciso lembrar que Coimbra, em virtude da dominação moura de sete decénios, tinha adquirido uma acentuada fisionomia muçulmana»

Cortesia de iauc

Introdução
«Toda a metade norte de Portugal até ao Mondego tornou assim à posso definitiva dos cristãos, enquanto o sul, depois duma incursão passageira por parte dos cristãos, permaneceu na posse dos mouros. É esta a situação militar que se conserva, até ao primeiro terço do século XII. Os filhos de Fernando dedicam-se com êxito à colonização cada vez mais intensa dos seus territórios. Cerca de 1070 ou 1071 Braga é elevada de novo a diocese como dez anos mais tarde o é também Coimbra. Eram especialmente difíceis as condições em que os dois únicos bispos de Portugal tinham de desempenhar a sua missão.

Das cinco cidades metropolitanas da igreja peninsular que existiam antes da invasão árabe, Tarragona, Toledo, Braga, Mérida e Sevilha, foi Braga a primeira que recebeu de novo um bispo. Durante séculos a igreja do Norte da Hispânia perece não ter sido unidade metropolitana. Mas não se tinha perdido a memória de que Braga possuía os primeiros direitos a ser metrópole por ter sido a cabeça da província eclesiástica da Galiza, cuja jurisdição abrangia todo o noroeste da península até o Douro o mais além.

Cortesia de almofhariz

Já dos primeiros anos do pontificado do bispo Pedro de Braga, entre 1070-1093, encontramos diplomas que falam duma «cathedra metropolitana». Mas não podemos falar dum reconhecimento de tal pretensão. A cidade, como a diocese, haviam sofrido tanto durante o longo tempo da guerra que só dificilmente a diocese podia manter-se. A recuperação dos bens e das paróquias pertencentes ao seu território só incompletamente pode ser efectuada pelo bispo. É verdade que a igreja de Lugo, à qual foi confiada a região de Braga «desolationis tempore», lhe tinha restituído os bens.
O bispo Vistrário de Lugo tinha até colaborado na reconstituição de Braga, e as reclamações do seu sucessor Amor ficaram sem efeito. Mas havia também outros bispados que tinham ganho nos séculos de desordem direitos em terras de Braga.

O bispo de Astorga tinha na sua posse as paróquias de Ledra, Aliste e Bragança, o bispo de Santiago do Compostela reclamava até metade da própria cidade de Braga com as igrejas de S. Vitor e S. Frutuoso, enquanto o bispo de Mondoñedo se julgava com direitos a Dume, às portas de Braga.
Teria sido fácil repudiar todas estas pretensões se Braga se tivesse podido apoiar no Estado. Mas o bispo Pedro, entronizado pelo rei Sancho, não era pessoa grata junto do sou irmão e sucessor Afonso VI. E assim vemos aquela diocese, que entre todas as da península tinha as mais altas pretensões e podia ter-lhes dado a unidade orgânica, pelo menos às do ocidente, condenada a um papel de segunda ordem.

 
Cortesia de uc

Não sucedia assim em Coimbra. Aqui o bispo Paterno, entre 1080 o 1087, se não possuía toda a sua diocese que se encontrava ainda em parte ocupada pelos mouros, tinha conseguido sujeitar à sua jurisdição as sés de Viseu e Lamego. Mas é preciso lembrar que Coimbra, em virtude da dominação moura de sete decénios, tinha adquirido uma acentuada fisionomia muçulmana. O elemento moçárabe, que teria dominado a princípio, era muito numeroso tanto na cidade como nos arredores.
O conde de Coimbra, Sisnando, ele próprio se intitulava do preferência alguazil ou cônsul, tinha vivido como cristão, sob o domínio árabe, o do serviço de Ibn Abad passara ao de Fernando o Magno o seus filhos. A mesma coisa sucedera com o próprio bispo Paterno, que sabemos haver governado antes a diocese de Tortosa, ao tempo em quo ainda esta cidade pertencia aos muçulmanos e que portanto é provável que fosse também moçárabe.
Por este tempo, vêm a Coimbra várias vezes bispos de outras dioceses, sem dúvida da mesma origem. Ora são conhecidas as profundas diferenças que separavam o cristianismo moçárabe do católico-romano. Por este motivo as relações desta sé fronteiriça com a igreja ocidental não podem ter sido muito íntimas». In Carl Erdmann, O Papado e Portugal no primeiro século da História Portuguesa, Universidade de Coimbra, Instituto Alemão da Universidade de Coimbra, Coimbra Editora, 1935.

Cortesia de Separata do Boletim do Instituto Alemão/Universidade de Coimbra/JDACT