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A
Mulher que Amou Jesus
«(…) Primeiramente, esses métodos
eram utilizados com sardinhas, o peixe que constituía a base alimentar de toda
a região. As sardinhas eram pequenas e fáceis de ser tratadas: os peixes
maiores, que não podiam ser preservados, deviam ser consumidos rapidamente. Mas
as sardinhas eram susceptíveis de serem tratadas e eram enviadas, preservadas,
para Roma, onde se dizia que eram consideradas um prato requintado, servido, inclusive,
à mesa do imperador. Certa vez, Natã recebera uma encomenda da casa do
imperador Augusto, e guardara o pedido escrito, como lembrança. Cerca de 15
empregados encarregavam-se do trabalho pesado, desde a disposição dos barris
até ao processo de salgar e, depois, colocar o peixe em frascos. Nos meses mais
quentes, o cheiro era bastante forte dentro do armazém; só aguentava trabalhar
ali quem tivesse um estômago forte. Hoje, estava relativamente fresco e o
vento, que entrava pelas portas abertas, levava o cheiro em direcção ao lago.
Maria viera caminhando devagar,
pelas ruas, adiando o encontro o máximo que podia. Passou por várias pessoas
que conhecia, e fez questão de parar e conversar com cada uma delas enquanto
pensava: pelo menos, não terei que sair daqui e perder de vista todas estas
pessoas que conheci a vida inteira, todas estas mulheres. Pelo menos, sou grata
por isso. E Joel não era um pastor, ou um caixeiro-viajante ou um contador da
casa real, profissões que implicariam uma mudança brusca no seu modo de vida. O
trabalho de pastor de ovelhas, além de ser duro, fedia e, com todo o respeito
pelo rei David, não era um modo de vida muito atraente. O trabalho do caixeiro
exigia ficar constantemente barganhando preços para conseguir algum lucro nas
mercadorias compradas, assim como exigia viajar o tempo todo. Quanto a
trabalhar na casa do rei, Herodes Antipas, e embora este fosse mais humano que
seu pai, o rei Herodes, cruel e imprevisível, sua proximidade e seus vínculos
com Roma incomodavam os judeus que ali serviam. Dizia-se que, dependendo da
pessoa a quem ele queria agradar, poderia ser um judeu ou um pagão. Era ele, no
entanto, o único intermediário entre os galileus e o poder romano.
Não dava para adiar mais. Maria
estava em frente à grande casa de pedra onde ficava o comércio de peixe da
família. Endireitou os ombros. Entrando e saindo pela porta principal,
trabalhadores que ela conhecia desde criança empurravam barris e carroças, mas
ela nem olhava para eles. Tinha de ir lá dentro; tinha de falar com ele. Entrou.
Estava escuro e demorou um pouco para os seus olhos se acostumarem. Formas
pouco nítidas, que se moviam, foram-se transformando em homens. Silvanus estava
em pé, junto a um monte de sal que tinha sido descarregado num dos cantos do
galpão. Tinha um bloco na mão e discutia números com outro homem. Outros homens
moíam o sal grosso.
E então Maria viu Joel, junto a
uma fileira de ânforas de barro que seriam enchidas com o molho usado pela
família, receita que ficara famosa, para a preservação do peixe. Havia dois
tipos desse molho: um para os pagãos e outro estritamente kosher. Muita gente fazia esse
molho, mas o de Magdala era tido como excelente e sua qualidade tornara famosa
a família de Maria. Lá está ele, pensou Maria. Eu o ficarei procurando pelo
resto de minha vida, no armazém, na rua, em casa. Ele é..., atraente. Alto e
esbelto. E parece, mas, antes que pudesse continuar com as suas elucubrações,
Joel a viu. Seu rosto iluminou-se e correu para ela. Obrigado por ter vindo,
disse, aproximando-se. Ela só acenou com a cabeça, pois, de repente, sentiu que
não conseguia falar. Limitou-se a ficar olhando para ele, sem avaliar aquela
pessoa, o que sempre fazia em outras situações. Também um pouco atrapalhado,
ele parou na sua frente. Sei que isso é difícil, disse. Embora nos tenhamos
encontrado por várias vezes... Não demos atenção um ao outro, disse Maria,
terminando a frase para ele. Eu dei, disse ele. Ah. Vamos lá para fora, disse
Joel. Com um gesto, apontou as movimentadas idas e vindas no armazém, assim
como a atenção que prestavam alguns dos outros, que poderiam estar suspeitando.
Por um instante, Maria hesitou, pois desejava a protecção das outras pessoas presentes.
Depois, seguiu-o». In Margaret George, A Paixão de Maria Madalena, 2002, Saída de Emergência,
Edições Fio de Navalha, 2005, ISBN 972-883-911-1.
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