«(…) No momento em que saiu do prédio de apartamentos em Georgetown, Guy Parker pressentiu que não estava nos seus dias. Quando Washington D.C. se apresentava quente e húmida, não havia em todo o mundo cidade mais sufocante, com efeito, ao entrar no beco, para se dirigir à garagem, já tinha o corpo inundado de transpiração. Havia manchas de suor das axilas até à cintura e a camisa colava-se à pele como uma vasta ligadura adesiva. Depois de abrir a porta do seu novo Ford, despiu o casaco de seersucker, aliviou a gravata de malha e instalou-se ao volante. Em seguida, dobrou o casaco, pousou-o no banco de trás e colocou o gravador em cima. Depois de ligar o motor e abandonar o beco, acelerou e seguiu, o mais rapidamente possível, em direcção ao Hotel Madison, onde devia comparecer para almoçar, às 13.30. Não queria chegar atrasado, porque o seu convidado era uma pessoa muito atarefada e lhe fazia um favor. com efeito, nas duas vezes anteriores que combinara almoçar com George Kilday, este cancelara o encontro no último momento, em virtude de uma reportagem urgente. Uma hora antes, Guy Parker telefonara-lhe para a redacção do Angeles Times em Washington e obtivera confirmação de que não faltaria. Assim, estava resolvido a ser pontual, por se tratar na verdade de um favor. O outro nada tinha a lucrar com a entrevista, ao passo que ele obteria inegáveis benefícios. Constava na cidade, pelo menos entre os membros do Quarto Estado, que Parker arrecadaria meio milhão de dólares do (nota: a Tecido indiano de linho, com riscas brancas e azuis) adiantamento do editor à Primeira Dama pela sua autobiografia (os outros quinhentos mil destinar-se-iam a obras de caridade). Kilday poderia ter todos os motivos para sentir inveja e revelar escasso espírito de cooperação, mas, ao invés, demonstrara que era uma pessoa atenciosa, um veterano que gostava de ver os escritores mais novos triunfar.
Parker alcançou o Madison cinco
minutos antes da hora estipulada e, pegando no gravador e casaco, confiou o
carro ao porteiro. Uma vez no átrio decorado com requinte, o ar condicionado
proporcionou-lhe alívio imediato e novas energias. Passou rapidamente diante da
Recepção sem se deter e dirigiu-se ao café despretensioso. Ao transpor a
entrada, viu uma empregada acompanhar Kilday a uma mesa e acercou-se com
prontidão, acenando cordialmente, gesto que o outro retribuiu. Não conhecia bem
Kilday, mas falara com ele umas seis vezes nos últimos dois anos e meio, quando
Parker fora um dos redactores dos discursos do Presidente, conquanto se limitassem,
a trocar breves impressões sobre política.
Por conseguinte, conhecia-o
pouco, pessoalmente, à parte o facto de ser um jornalista respeitado pelos
colegas pela persistência e rigor com que investigava os temas das reportagens.
Parker ignorava a existência de um elo entre Kilday e a Primeira-Dama, até ao
dia em que a própria Billie o mencionara, quando conversavam acerca do período
após a formatura dela em Vassar, com uma classificação distinta em jornalismo.
Antes da aposentação do pai, trabalhara na agência publicitária que se ocupava
da negociação das invenções do progenitor. Billie obtivera colocação numa firma
de relações públicas de Nova Iorque e, mais tarde, fora sua representante em Londres
durante uma curta temporada. A seguir, regressara a Los Angeles determinada a
escrever um romance, que rasgara quando ia a meio.
Pouco depois, conseguiu um lugar
no Los Anjeles Times?,
perguntara Parker. Não foi bem assim. Na realidade, tive o meu primeiro
emprego numa folha insignificante de Santa Mónica, por um salário que nem
merece a pena referir. No entanto, o dinheiro não interessava. De facto, não me
fazia falta. Em todo o caso, proporcionou-me acesso a muitos acontecimentos e
locais que, de contrário, não conheceria. Um dia, o editor incumbiu-me de uma
reportagem sobre um centro de reabilitação de drogados e, em vez de proceder em
obediência à rotina, entrevistando o director, acudiu-me uma ideia inspirada
por uma passagem que lera numa biografia de Nellie Bly. A que tentou bater o
recorde de Júlio Verne da volta ao mundo em oitenta dias?» In Irving Wallace, A Segunda Dama,
1980, Editora Livros do Brasil, Colecção Dois Mundos, 1983, ISBN 978-972-380-936-7.
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